Brasília – O Brasil que a presidente Dilma Rousseff herdou de si própria no seu segundo mandato tem uma face bem mais adversa do que ela encontrou quando tomou posse pela primeira vez, em 2010. No plano interno, estagnação do Produto Interno Bruto (PIB), inflação acima de 6,5% ao ano e descalabro fiscal preocupam. No externo, a perturbação vem da crescente possibilidade de uma nova fase de austeridade monetária mundial, com reflexos negativos para os mercados emergentes.
Logo nos primeiros meses de sua segunda gestão, Dilma terá de contornar uma crise que se prenuncia para meados do ano, quando os Estados Unidos devem iniciar um ciclo de aperto nos juros. Será o fim de um longo ciclo de medidas adotadas pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) com o objetivo de tirar a principal economia do planeta do atoleiro, onde está desde 2008.
Os EUA despejaram US$ 4 trilhões nos mercados financeiros apenas entre 2009 e 2014. Agora, em meio à retomada do crescimento econômico interno, o governo norte-americano prepara a reversão das medidas de estímulo. “A temporada de dinheiro farto chegou ao fim”, sublinha o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini. Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio da corretora Treviso, alerta que a alta dos juros nos EUA provocará escassez de dólares ao redor do mundo. “A história mostra que, mesmo em momentos de grande nervosismo nos mercados, países que apresentam bom quadro de solidez nas contas públicas e externas conseguem, de algum modo, sair sem grandes machucados dos períodos de turbulências. Mas os mercados são impiedosos com países que apresentam maior debilidade dos fundamentos econômicos”, ilustra.
É por isso que a nova equipe econômica de Dilma tem de estar em alerta, observa a economista-chefe da Rosenberg Associados, Thaís Marzola Zara. A relação entre os ingressos e saídas de recursos pela balança comercial, pelas remessas de lucros e dividendos de multinacionais e pelas viagens internacionais aponta uma piora perigosa do déficit nas transações correntes. Até o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o rombo anual mal superava os US$ 24,5 bilhões. No governo Dilma, esse déficit mais do que dobrou, para uma média de US$ 68,2 bi ao ano. E o quadro pode piorar.
Desde 2011, essa conta só cresce. Ao fim de 2014, o buraco estimado é de US$ 85 bi — pior resultado desde 1967. Como proporção do PIB, o rombo já encosta nos 4%. Os números chamam a atenção para uma maior vulnerabilidade do país a choques externos e deixam claro a piora no quadro de financiamentos externos.
As estatísticas mostram, no entanto, que só países que enfrentam graves crises externas costumam ostentar déficit tão elevado nas transações correntes. E, mesmo que esse rombo venha a reduzir nos próximos anos, ainda será insuficiente para trazer tranquilidade aos investidores internacionais. De 2015 a 2018, o rombo como proporção do PIB deverá encolher de 4% para 3,2%. Isso tudo num momento em que a perspectiva de queda no fluxo de recursos estrangeiros torna mais difícil equacionar a conta. A situação é tão delicada que, em relatório recente, o Fed apontou o Brasil como o segundo emergente mais suscetível a uma eventual alta de juros dos EUA.
Ainda que o país volte a crescer este ano, a estimativa é de um resultado pífio. Na melhor das hipóteses, o país conseguirá superávit de US$ 5 bi – um quarto do de 2010. Nos anos seguintes, o resultado pode subir para US$ 15 bi, de 2016 a 2018 – ainda assim, é metade dos US$ 29,8 bi obtidos em 2011.
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Contas externas do país estão na corda bamba
Início de ciclo de alta dos juros norte-americanos traz temores, entre eles o da fuga dos investidores do país
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