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Estado de Minas

Bancos reforçam caixa contra o calote

Prevendo nova alta na inadimplência para os próximos meses, bancos aumentam provisões para R$ 135,2 bilhões, sobretudo visando empréstimos sem quitação por três meses ou mais


postado em 15/08/2014 06:00 / atualizado em 15/08/2014 07:41

Brasília – Os bancos estão cada vez mais rigorosos na hora de conceder crédito, e não é para menos. Com o brasileiro atolado em dívidas e já com o orçamento doméstico estrangulado pela escalada da inflação, o temor é de que o consumidor, mais cedo ou mais tarde, não consiga pagar suas dívidas. Para se precaver de prejuízos no futuro, as instituições financeiras estão aumentando as provisões contra perdas. Apenas em junho deste ano, esse colchão utilizado para momentos de incerteza chegou a R$ 135,2 bilhões, o maior valor já declarado pelas instituições ao Banco Central (BC) desde julho de 1993.


Mais de metade desse montante é destinado a cobrir possíveis perdas com clientes que estão em atraso de suas obrigações há pelo menos três meses. Levantamento feito pelo Estado de Minas com números recentes da autoridade monetária mostra que, apenas em junho, os bancos separaram R$ 107 bilhões em provisões para esse tipo de crédito.

Em situação ainda mais delicada estão os empréstimos classificados com a letra H. Nessas operações, os bancos dão o crédito como perdido, já que a chance de reaver pelo menos parte do dinheiro emprestado é considerada irrelevante. Não por outro motivo as instituições financeiras separam R$ 72 bilhões para conter possíveis calotes apenas nessas linha. “O que os bancos estão fazendo é tirar o pé do acelerador e colocar no freio”, disse Luis Santacreu, analista de bancos da agência de risco Austin Rating.

“Os bancos, hoje, estão atentos a esse cenário de risco. Eles têm um monitoramento da inadimplência, para evitar um possível calote no futuro. Então, caso começar a piorar a inadimplência, ele tem a provisão protegendo”, disse o analista. “O cenário de hoje não é dos melhores para dar crédito no país”, assinalou.

Parte desse pessimismo se deve ao maior risco de calotes num futuro próximo, em função dos juros altos, da inflação em disparada e da piora da economia, que poderá resultar em quadro de aumento do desemprego já a partir de 2015. “Nos últimos meses, a gente observou uma elevação importante na taxa de juros no crédito. Como existe uma correlação entre taxas de juros e inadimplência, é natural que os bancos estejam mais rigorosos agora, porque sabem que os próximos meses podem ser ainda piores do que os tempos atuais”, observou a economista Mariane Hanson, da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Hoje, a inadimplência ainda encontra-se comportada, em 6,49% das carteiras. Mas, no mercado financeiro, a aposta é que o nível de calotes volte a subir nos próximos meses, sem, no entanto, o descontrole visto nos anos recentes.

JUROS Se os atrasos não têm subido, não se pode dizer o mesmo dos juros. As taxas cobradas das famílias atingiram, em junho, o maior patamar desde 2012, segundo dados do Banco Central. Em média, os encargos cobrados das famílias chegaram a 43% ao ano. Uma fatura pesada, mas que é ainda leve se comparada à de quem recorreu a linhas emergenciais, como o cheque especial. Nessa operação, a taxa média cobrada dos clientes chegou a 171,5% ao ano. Em apenas um ano, ao passo que a taxa básica de juros da economia (Selic) subiu 3,75 pontos percentuais, os juros do cheque especial avançaram 10 vezes mais: 34,7 pontos.

Ao mesmo tempo, a inflação ao consumidor seguiu em disparada, engolindo a renda das famílias. Nos últimos 12 meses, até julho, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o parâmetro oficial do custo de vida no país, avançou 6,5%, alcançando o teto da meta de inflação perseguida pelo governo, de 4,5% ao ano, com tolerância de dois pontos para baixo e para cima. Para piorar, o brasileiro, que já está pagando mais caro para tomar empréstimos, já não tem mais espaço para se endividar. Até março, de acordo com dados mais recentes do BC, o comprometimento de renda das famílias chegou a 45,73% — há apenas cinco anos, em 2009, essa parcela era 10 pontos menor, de 35,41% da renda.

Não por outro motivo, diz a economista da CNC, os bancos botaram o pé no freio. “As instituições financeiras como um todo trabalham hoje olhando sempre para o futuro. Por isso, estão aumentando as provisões e reduzindo as linhas de crédito com maior risco, que podem vir a dar problemas caso a situação econômica piore ainda mais”, avaliou.

 

Crédito fica cada vez mais difícil

 

Brasília – O medo do calote está tão grande que os bancos estão barrando até mesmo empréstimos a quem não tem histórico de mau pagador. É o caso do o secretário Raphael Emanuel Tavares, 32 anos, que teve o pedido para fazer um cartão de crédito de loja negado em duas ocasiões recentemente. “Tive meu registro barrado em duas lojas em menos de um mês. Mas não me informam muita coisa. Dizem apenas que meu CPF (Cadastro de Pessoa Física) não atingiu o limite necessário de scoring (pontuação)”, reclamou.

O Sistema Scoring, utilizado pela maioria das entidades do setor financeiro como espécie de ranqueamento de análise de crédito, está cada vez mais rigoroso. Sem transparência, a ferramenta gera constrangimento para diversos consumidores, mesmo aqueles que nem sequer estão inadimplentes. Rafael garante que a renda mensal de R$ 1 mil não está comprometida com débitos em atraso. Mesmo assim, não conseguiu liberação para comprar com a tarjeta eletrônica. “Nunca tive cartão de crédito, nem peguei empréstimo. Sempre fiz pagamentos em débito e dinheiro”, disse.

Esse receio pode ser explicado pelo aumento da incerteza com a economia, dizem os especialistas, mas também se deve, em grande parte, ao pessimismo do setor privado com relação ao futuro. A rigor, os bancos têm de se precaver contra possíveis perdas até mesmo em empréstimos considerados com baixíssimo risco de calotes, classificados como AA. Nessas operações, em que os clientes praticamente não atrasam as faturas, as provisões avançaram 63% desde 2009. Em valores, porém, elas ainda são baixas. Em junho, chegaram a R$ 200 milhões, o equivalente a apenas 0,2% das provisões totais.

Mas é nas operações mais arriscadas, com atrasos entre 151 e 180 dias, que as provisões mais aumentaram desde então. Desde 2009, o volume de dinheiro guardado pelos bancos para se precaver de possíveis calotes nesse tipo de operação, classificada com a letra G, avançou 84%. (Colaborou Rodolfo Costa)


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