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Estado de Minas INFRAESTRUTURA

Gastos mais altos com energia levam indústrias a investir no Paraguai e EUA


postado em 19/05/2014 06:00 / atualizado em 19/05/2014 07:48

Tributação menor e sobras da hidrelétrica de Itaipu são as vantagens oferecidas pelo governo paraguaio (foto: (Rickey Rogrs/ Reuters- 11/11/09 )
Tributação menor e sobras da hidrelétrica de Itaipu são as vantagens oferecidas pelo governo paraguaio (foto: (Rickey Rogrs/ Reuters- 11/11/09 )
Brasília –A participação dos produtos industriais importados nas prateleiras do comércio brasileiro alcançou, no primeiro trimestre deste ano, um novo recorde de 22,5% do total. Apesar do avanço da concorrência de fora, sobretudo a asiática, o maior desafio para as fábricas instaladas em território nacional está no ambiente doméstico, representado pela disparada dos custos para produzir no país, com destaque para a eletricidade. O mais novo choque para a indústria, que sofre com a perda constante de competitividade, já está levando empresas a transferir suas linhas de produção para o exterior, para fugir do alto preço do megawatt/hora (MWh), enquanto grandes indústrias autogeradoras do insumo preferem produzir menos e priorizar o ganho proveniente da venda de energia no mercado à vista.


Na linha de frente na disputa pelas indústrias brasileiras está o Paraguai. Sócio do Brasil na maior usina da América Latina, a hidrelétrica de Itaipu, o país vizinho só usa 5% do que é gerado por ela. Os outros 45% a que tem direito são vendidos para o próprio Brasil suprir a crescente demanda. Com o gargalo do setor elétrico se agravando, o Paraguai está atraindo indústrias nacionais apenas com o apelo da energia da usina binacional como moeda de troca.

Na avaliação de Walter Fróes, da CMU Comercializadora de Energia, se o Paraguai se organizar, vai roubar muitas indústrias brasileiras. "Um cliente meu já levou seu parque industrial para o país vizinho. Lá ele paga US$ 36 o MWh (cerca de R$ 80), e tem apenas 12% de Imposto de Valor Agregado (IVA). No Brasil, hoje, o MWh está em R$ 822,83 no mercado livre e os encargos passam de 40%", sublinha Fróes. Esse cenário, estima o analista, vai se agravar. "Outro país que está atraindo indústrias de todo o mundo, inclusive brasileiras, é os Estados Unidos por conta da disponibilidade de gás de xisto na Pensilvânia.

Para Rafael Herzberg, sócio da consultoria Interact Energia, a indústria está num impasse, não reconhecido pelo governo. "As empresas estão cogitando se transferir para o Paraguai por causa da crise de energia no Brasil, que o governo não reconhece. Da minha carteira de clientes, um foi para o México e outro para o Leste Europeu", revela. Os industriais fecharam duas unidades completas de produção no país por conta do alto custo de produzir no Brasil. Ambas mantiveram aqui apenas centros de distribuição. "O pior é que não existe percepção dos órgãos públicos para buscar uma solução para essa distorção. O governo prefere ignorar o problema e está afugentando a indústria. Os empresários passaram a considerar ambientes de negócios menos arriscados do que o Brasil", avalia.

Vocação nova? Enquanto a maioria das empresas está com dificuldades de produzir no país e muitas já pensam em fugir do território nacional, as grandes indústrias autogeradoras estão trocando sua vocação. "O mercado siderúrgico, por exemplo, está muito ruim. Vale mais a pena vender energia. Mas é uma distorção completa", analisa Fróes, da CMU, referindo-se aos R$ 75 milhões a mais que a Usiminas embolsou no início do ano ao optar por vender energia.

A siderúgica informou no seu balanço do primeiro trimestre os ganhos ampliados com a venda de energia. A empresa, contudo, nega que tenha reduzido produção. O vice-presidente de Tecnologia e Qualidade, Rômel de Souza, explica que a demanda da Usiminas por energia é de 400 MW médios. "A perspectiva de comercializar energia, depende do mercado. Enquanto for atrativo gerarmos mais, vamos continuar. Quando não compensar, vamos reduzir a produção das nossas térmicas", diz.

O presidente da Usiminas, Julián Eguren, reconhece que a empresa não pretende fazer mais investimentos além dos projetos normais de manutenção. Mas esclarece que a empresa não pode perder espaço no mercado, apostando apenas na venda de energia. "Temos relacionamentos de longo prazo com clientes. E temos que mantê-los. A venda de energia é oportuna, mas não vamos trocar nossa vocação", assegura.

A maior cimenteira do país, do grupo Votorantim, também correu para o atrativo mercado de energia. O excedente da empresa é suficiente para que ela figure seguidamente nos leilões promovidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). No último pregão, a companhia vendeu 327 MW, 16% de toda a oferta disponível. A venda renderá ao grupo R$ 4,4 bilhões nos próximos cinco anos. A assessoria da empresa não informa se a produção foi reduzida ou não. Em nota, diz apenas: "A Votorantim Energia é responsável pela gestão de energia para as empresas do Grupo Votorantim e terceiros. Como parte desse processo, sempre que houver excedente, essa energia é oferecida ao sistema interligado, incluindo os períodos de paradas técnicas para manutenção das diversas operações industriais".

Excedentes são usados para reforço de caixa

Entre as linhas de produção e a geração de energia, o professor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP) Ildo Sauer, destaca os ganhos da autogeração do insumo de um fábrica de alumínio. Para produzir uma tonelada do metal, a empresa consome 14,8 MWh. No mercado de curto prazo, esse volume de energia vale R$ 12 mil ou US$ 5,4 mil. Uma tonelada de alumínio vale US$ 2,5 mil no mercado mundial. Ou seja, vender energia vale mais do que o dobro. "O absurdo não é a tonelada do alumínio estar U$ 2,5 mil no mercado mundial, mas sim a energia estar precificada em R$ 822,83 o megawatt/hora (MWh), quando o custo na hidrelétrica é de R$ 100 a R$ 120", compara. Para ele, não é ético que uma energia que custe R$ 100 seja vendida por oito vezes mais. "As empresas, quando lucram, embolsam, quando têm prejuízo, o governo tem que ajudar", lamenta.

Rafael Herzberg, da Interact Energia, considera que as empresas que têm energia estão aproveitando uma situação episódica para fazer caixa. "Mas as outras estão numa situação muito delicada, porque poucas indústrias podem se dar ao luxo de pagar energia cara para produzir. O setor industrial já perdeu muita margem e competitividade. Eu vejo o mercado corporativo com muita preocupação", analisa. Para ele, a falta de sinalização clara do governo atrapalha o processo decisório das empresas. "Não existe lógica, existe muita arbitrariedade. Isso não só afasta investidores como empurra nossa indústria para fora do país. Outra tendência que tenho notado é pessoa jurídica que queria vir montar fábricas no Brasil agora licenciam uma empresa local para não tomar o risco Brasil. Isso é ruim para a economia", destaca.

O presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, diz que o país vive um paradoxo, com múltiplas condições de gerar energia, mas com um gargalo na ponta. Além do preço alto da energia, quando falta chuva e as termelétricas são acionadas produzindo ao ritmo pleno, o que acontece ininterruptamente desde 2012, os encargos na conta de luz chegam a 40%. "É um movimento natural de quem tinha excedente e o coloca no mercado. Dado o cenário atual, faz sentido do ponto de vista econômico", pondera.

Raul Velloso, especialista em contas públicas e autor do livro Energia Elétrica a Caminho do Estrangulamento, explica que a crise do setor é de oferta. Ele lembra que foi construído um sistema de térmicas para emergências para ser usado por pouco tempo porque é caro. Só que desde 2012 elas são acionadas em tempo integral. "Isso reflete no fato de que a oferta não está se ajustando à demanda. Esse descompasso é resultado da escolha do governo pela modicidade tarifária, ou seja, a menor tarifa", . A ênfase nesse modelo, na opinião de Velloso, desestimula a oferta.

"A iniciativa privada fica sem interesse de investir em projetos para gerar mais energia, enquanto as empresas públicas enfrentam dificuldades de conseguir financiamento e não respondem na velocidade necessária para suprir a falta de oferta. O outro problema é que quem está no mercado tem que vender a energia muito abaixo do custo", resume. (SK)


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