Brasília – O fraco crescimento da atividade nos dois primeiros anos da administração de Dilma Rousseff — 2,7% em 2011, e entre 1,2% e 1,8% em 2012 — esquentou um debate nada promissor para o Brasil, que ostenta hoje o sexto Produto Interno Bruto (PIB) do mundo: a possibilidade de ser ultrapassado pelo México como maior economia da América Latina nos próximos 10 anos. Ainda que a discussão, alimentada pelo banco japonês Nomura seja vista com desdém pelo Palácio do Planalto e pelo Ministério da Fazenda, o fato de o país não estar reagindo aos estímulos dados pelo governo, devido à grande desconfiança de empresários e consumidores, acendeu o sinal de alerta em Brasília.
Em relatório encaminhado a clientes, o Nomura assinala: “Caso a nossa previsão se torne realidade, essa seria uma história de sucesso latino-americana de um país com políticas neoliberais e forte produção de manufaturados superando um exportador de matérias-primas de abordagem mais estatizante”. Pelas projeções do banco, a liderança do Brasil, conquistada em 2005, será superada se a economia crescer, em média, 2,75% ao ano (piso das estimativas da instituição) e o México cravar expansão anual de 4,75% até 2022. Atualmente, o PIB brasileiroé de US$ 2,4 trilhões e o mexicano, de US$ 1,1 trilhão.
“Com certeza, não há a menor possibilidade de sermos superados pelos mexicanos. Somos muito maiores e estamos prontos para voltar a crescer acima de 4% ao ano”, diz um assessor do Planalto. “De qualquer forma não podemos descuidar. Tanto que estamos dando um choque de modernidade na economia. Já anunciamos um pacote de concessões de estradas e ferrovias à iniciativa privada, vamos divulgar nesta semana, provavelmente, a redução dos custos da energia e logo virá um programa para portos e aeroportos. Tudo para ampliar os investimentos, hoje nosso principal problema”, acrescenta.
Na avaliação de economista, somente o fato de o governo Dilma ter despertado para a necessidade de se privatizar setores estratégicos, com a missão de desobstruir gargalos históricos, afasta qualquer risco de a economia mexicana se tornar maior do que a brasileira. Ressaltam ainda que 2011 e este ano são períodos de ajustes à criseinternacional, mas o país reúne condições para avançar mais. “O Nomura está extrapolado o que está vendo hoje, que é o México crescendo mais que o Brasil. É um exagero, porque a economia brasileira é mais dinâmica que isso”, diz a economista Silvia Matos, coordenadora do boletim macroeconômico do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Força da China Dados estatísticos mostram que o México já esteve muito à frente do Brasil. Em 2002, o PIB daquele país medido em dólares chegou a ser 37% superior ao brasileiro. Boa parte dessa diferença pode ser explicada por uma palavra de apenas cinco letras: Nafta. O Tratado Norte-Americano de Livre Comércio, na sigla em inglês, criou um bloco econômico fortíssimo, tendo como países membros os Estados Unidos, o Canadá e o México. A principal bandeira do acordo foi reduzir barreiras comerciais entre as nações, o que, de certa forma, favoreceu bastante a indústriamexicana. O tripé mão de obra barata, proximidade com os EUA e baixa carga tributária fez do México o parceiro ideal para os norte-americanos. Os mexicanos têm ainda se seu favor saídas para exportações tanto pelo Oceano Atlântico quanto pelo Pacífico, atendendo as costas Leste e Oeste dos Estados Unidos. “Ainda hoje, algo como 90% das exportações deles são para os EUA”, frisa o professor Fernando Ribeiro, do Insper.
Mesmo sem reunir essas características logísticas, o Brasil vem conseguindo, nos últimos anos, aumentar a participação de seus produtos nos mercados internacionais. Se o México teve como principal parceiro os Estados Unidos, os brasileiros se valeram da crescente demanda chinesa por commodities agrícolas e minerais. Ao estabelecer uma vantajosa ponte de comércio com a Ásia, onde está a maior parte da população mundial, o Brasil consolidou-se como um dos mais importantes fornecedores globais de matérias-primas.
Para o economista Marcio Sette Fortes, professor de relações internacionais do Ibmec, é justamente por causa dessa dependência do mercado de commodities que o Nomura questiona a liderança do Brasil como maior economia da América Latina. “Nós temos uma pauta de exportações que remete à República Velha (1889 – 1930). É ferro, soja e matérias-primas em geral. É claro que não é nada prejudicial, mas é preciso que o país diversifique mais a sua pauta de exportações”, avalia.
Infraestrutura está entre os gargalos
Outra debilidade brasileira é a falta de uma infraestrutura condizente com as dimensões do país, afirma Marcio Sette Fortes, do Ibmec. “A carência de infraestrutura do Brasil não é de hoje, mas só agora o governo parece dar atenção a isso”, acrescenta. Ele cita a parceria do setor privado na área de portos, que ajudou a reduzir parte dos gargalos logísticos, e pondera que “ainda falta muito a ser feito”. Sobretudo no que refere ao aumento da taxa de investimentos, que, no México se situa em 22% do PIB e, no Brasil, a média dos últimos anos tem sido de 17,5%.
Os investimentos, porém, só tenderão a deslanchar no país quando problemas estruturais como alta carga tributária, guerra fiscal, Previdência Social e elevado custo trabalhista forem atacados. “Hoje, o nosso sistema tributário é um inibidor”, diz o economista-chefe do Banco J. Safra, Carlos Kawall. No México, a carga de impostos alcança 10% do PIB, no Brasil, corresponder a 34%.
Por outro lado, aforça de trabalho mexicana, na casa de 49 milhões de pessoas, é ainda em sua maioria informal, ao passo que os 105 milhões de brasileiros que estão no mercado de trabalho possuem mais acesso a benefícios previdenciários. “O Brasil tem algo como 33% do PIB e da população da América Latina, enquanto que o México tem 28% das riquezas e 24% da força de trabalho. São economias muito desiguais”, compara Fernando Ribeiro.
O economista Rodolfo Oliveira, da consultoria Tendências, lembra que tanto para o Brasil quanto para México, o que poderá decidir a liderança econômica da América Latina será uma riqueza que vem da terra. Hoje, cerca de 30% das receitas do México são provenientes da exportação de petróleo, mas a produção local está caindo, diferentemente do Brasil, que já começa a extrair as imensas jazidas do pré-sal. “Se o México não conseguir aumentar a produção de petróleo, é bem provável que, já na próxima década, se torne importador”, assinala.
Violência Segurança ou a falta dela é hoje um estigma que macula a imagem do México perante o mundo inteiro. Nos últimos seis anos, cerca de 50 mil pessoas morreram em confrontos armados provocados pela guerra do Estado contra grupos do narcotráfico. O saldo sangrento afeta não só a população, como também os negócios. “Rastros de sequestros, insegurança urbana, terrorismo. Isso tudo afasta investimentos”, pondera Sette Fortes.
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Brasil pode ser ultrapassado pelo México como maior economia da América Latina
Analistas debatem a possibilidade de o Brasil ficar para trás em 10 anos, caso o crescimento brasileiro continue pequeno
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