'Le taxi, le cinema et moi', do diretor Salam Zampaligré, relembra a vida e a trajetória de Ousmane Sembène, cineasta de Burkina Faso

'Le taxi, le cinema et moi', do diretor Salam Zampaligré, relembra a vida e a trajetória de Ousmane Sembène, cineasta de Burkina Faso

Semana de Cinema Negro/divulgação

Um amplo panorama, com mais de 70 filmes, debates, oficinas e imersões formativas, compõe a 3ª Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte, que começa neste sábado (9/9) e segue até o próximo dia 17, com sessões presenciais no Cine Humberto Mauro e no Cine Santa Tereza. Parte da programação estará disponível na plataforma Cine Humberto Mauro Mais.

O público terá a oportunidade de conhecer filmes realizados por autores negros brasileiros, africanos e da diáspora caribenha. O painel em cartaz se divide em mostras nacional e internacional. No que tange à produção brasileira, que tem curadoria de Cecília Godoi e Rayanne Layssa, são destaques a homenagem à produtora audiovisual mineira Ponta de Anzol e a exibição do filme “Diálogos com Ruth de Souza”, da cineasta Juliana Vicente.

'Hienas', filme do senegalês Djibril Diop Mambéty, será exibido em BH

'Hienas', filme do senegalês Djibril Diop Mambéty, será exibido em BH

Semana de Cinema Negro/divulgação

Diálogos com o público

Um dos principais objetivos da seleção internacional é mostrar como diversos realizadores no continente africano construíram formas de utilizar o cinema para criar diálogos com a população. Com curadoria de Janaína Oliveira, Vanessa Santos e Gabriel Martins, a mostra internacional traz 27 filmes divididos em quatro programas: “Cinemas africanos contam suas histórias”, “50 anos de 'Touki Bouki'”, “Os cinemas do Caribe hoje” e “Cinema negro e experimental”. Todas as atividades são gratuitas.

A mostra de filmes brasileiros “Cine-escrituras pretas” é outro destaque desta terceira edição. Composta por 27 filmes – muitos deles inéditos na capital mineira –, ela recebeu, por meio de chamamento público, inscrições de realizadores de todas as regiões do Brasil.

Um dos critérios de seleção, comenta Rayanne Layssa, foi o desejo de contemplar a produção de outras regionalidades, fugindo um pouco do eixo Rio-São Paulo e buscando cidades com outras experiências de cinema.

“Recebemos filmes de todos os lugares, claro que principalmente do eixo Rio-São Paulo, por uma questão mesmo de circulação de editais, de possibilidades, mas lançamos nosso olhar para outros lugares, no intuito de trazer o cinema negro que se faz no Nordeste ou no Norte”, diz.

Ela chama a atenção para “Diálogos com Ruth de Souza”, de Juliana Vicente, por se tratar de projeto em que a diretora negra filmou a atriz negra, encontro geracional que classifica como muito importante. “Chega a ser grandioso a gente poder ver esta realizadora negra com pesquisa tão vasta e esta atriz que tem tanto a dizer, tanto a ensinar. É um encontro de gerações que diz muito deste momento que o cinema negro está vivendo”, destaca.
 
Filme de Juliana Vicente destaca a importância a atriz Ruth de Souza no Brasil

Filme de Juliana Vicente destaca a importância a atriz Ruth de Souza no Brasil

Semana de Cinema Negro/divulgação
 

Minas Gerais tem destaque

A curadora aponta  a importância e a tradição do cinema produzido em Minas Gerais em âmbito nacional. A sessão em homenagem à produtora Ponta de Anzol cumpre o objetivo de mostrar que há novos realizadores do estado criando imaginários.

“Ter a sessão dedicada à Ponta de Anzol é importante para Minas se ver no cinema, porque é um estado que tem cinema negro potente e bonito”, afirma.
 
Integrada por Bruno Greco, Higor Gomes, Jacson Dias e Maick Hannder, a Ponta de Anzol está completando cinco anos de trajetória. Serão exibidos os cinco filmes da produtora, entre eles a estreia de “Ramal”, de Higor Gomes, premiado como melhor curta-metragem no festival Olhar de Cinema, em Curitiba. Os curtas da Ponta de Anzol passaram por mais de 100 festivais nacionais e internacionais.

Rayanne Layssa destaca o aumento do número de filmes de ficção nacionais. “Estamos vindo de um período em que foram produzidos muitos documentários. Ficamos felizes em ver as pessoas criando imaginários, o que aponta para processos políticos de editais que permitem a realizadores produzir ficção, o que é mais caro”, diz.

Na mostra internacional, a 3ª Semana de Cinema Negro celebra os 50 anos do clássico “Touki Bouki”, primeiro longa do Djiril Diop Mambéty, que em 1973 fez parte da seleção oficial do Festival de Cannes e recebeu o prêmio da crítica.
 
'Dancing the stumble', de Wally Fall, representa a Martinica no programa 'Os cinemas do Caribe hoje'

'Dancing the stumble', de Wally Fall, representa a Martinica no programa 'Os cinemas do Caribe hoje'

Semana de Cinema Negro/divulgação
 

Diáspora caribenha

Os programas também apresentam filmes da diáspora caribenha, além de um conjunto que conta a história do cinema no continente africano e um painel inédito do cinema negro e experimental da diretora estadunidense Crystal Z Campbell.
 
Janaína Oliveira explica que os quatro programas da mostra seguem diretrizes estabelecidas desde a primeira edição da Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte. Uma delas é a de formação de público, para que as pessoas entendam que há sólida tradição cinematográfica no continente africano há 70 anos, mas também existe uma produção contemporânea pulsante.

“Na primeira edição da Semana, fizemos uma sessão dedicada ao festival mais importante do continente, o Fespaco, que tem mais de 50 anos. Na segunda, propusemos um deslocamento para mostrar a produção mais ao Leste da África, de países como Etiópia, Somália e Sudão. Percebendo esses processos, quisemos, agora, falar dos documentários e dos filmes que abordam o próprio cinema africano, incluindo produções de making of, para que as pessoas possam perceber como se faz esse cinema”, diz.

Ela destaca obras incluídas no programa “Cinemas africanos contam suas histórias”, que estabelece diálogos entre filmes clássicos, históricos e produções contemporâneas, como “O cemitério do cinema”, de Thierno Souleymane Diallo.

“A obra de Diallo traz uma reflexão tenaz e crítica sobre os cânones da história africana de seus filmes e também da emergência de outras culturas fílmicas, como em 'Coconut head generation', de Alain Kassanda, que, ao acompanhar a situação dos estudantes universitários em Ibadan, na Nigéria, testemunha também o surgimento de uma nova cinefilia”, ressalta.

Making of

A curadora informa que o programa traz obras que contam as trajetórias da produção de filmes no continente seja através de seus bastidores, como no making of do icônico filme “Ceddo” (1977), do cineasta Ousmane Sembène, feito por Paulin Vieyra – outro pioneiro do cinema do Senegal –, ou nos documentários de Ferihd Boughedir (“Camera d'Afrique”), Manthia Diawara Ngugi Wã Thiongo (“Making of african cinema”) e Balufu Bacupa Kanynda (“10 mil anos de cinema”).

Janaína enfatiza que a Semana de Cinema Negro tem a dimensão das diásporas, o que justifica o programa “Os cinemas do Caribe hoje”. “Dancing the stumble”, segundo longa-metragem do cineasta e curador martinicano Wally Fall, inédito no Brasil, aborda a questão da saúde mental em seu país, tendo como baliza a obra de Frantz Fanon. Ela destaca também os curtas-metragens.

“A questão do cinema negro experimental é outro projeto que venho desenvolvendo para expandir a perspectiva do público, então estamos trazendo para Belo Horizonte a cineasta Crystal Z Campbell, que tem um trabalho baseado na questão da memória de eventos traumáticos. É a primeira vez que ela terá uma retrospectiva na América do Sul”, diz.

A curadora pontua que as sessões com obras de Crystal, dentro do programa “Cinema negro e experimental”, serão seguidas de conversas com a realizadora.
 
 Diretora americana Crystal Campbel

Diretora americana Crystal Campbel vem a BH a convite da Semana de Cinema Negro

Headshot Studio
 
 
Dentro da perspectiva histórica da Semana, “50 anos de 'Touki Bouki'” aproveita o cinquentenário do primeiro longa de Djiril Diop Mambéty para promover uma pequena retrospectiva de sua produção.

Além das obras do diretor senegalês, o programa inclui o documentário “O príncipe de Colobane”, de Laurence Gavron, inédito no Brasil, e o making of que o próprio Mambéty fez de “Yabaa”, filme de seu amigo Idrissa Ouedraogo, de Burkina Faso, em 1989.

“Depois de 'Touki Bouki', a carreira dele teve um hiato de mais de 20 anos. Mambéty volta para o cinema justamente com esse making of. Além dessas obras, temos os filmes 'Hienas', 'A pequena vendedora de sol' e 'O franco' no programa dedicado a ele”, diz a curadora.

A 3ª Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte, em parceria com o Fórum Itinerante de Cinema Negro, realiza também a roda de conversas “Políticas do olhar: diálogos sobre curadoria e descolonização”, com a participação de curadores de cinema da África e das diásporas.

3ª SEMANA DE CINEMA NEGRO DE BH

Deste sábado (9/9) até dia 17, com sessões presenciais no Cine Humberto Mauro do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro) e Cine Santa Tereza (Rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza). Entrada franca. A programação on-line está disponível em https://www.cinehumbertomauromais.com. A programação completa pode ser conferida em www.linktr.ee/SCNBH