Jornal Estado de Minas

IMUNIZAÇÃO

COVID-19: vacina feita a partir do tabaco apresenta resultados positivos

 

Desenvolvida com a ajuda de propriedades do tabaco selvagem, uma nova vacina contra a COVID-19 mostrou resultados positivos nos primeiros testes clínicos. O imunizante CoVLP provocou uma resposta imune robusta ao ser avaliado em um grupo de 180 voluntários de idades distintas.



Os resultados foram publicados ontem, na revista especializada "Nature Medicine", e, caso se mantenham nas próximas etapas de análise, o novo fármaco poderá ser usado como mais uma ferramenta no combate à pandemia.

 

“Várias vacinas contra a COVID-19 já foram aprovadas, mas nenhuma pode ser produzida em quantidades suficientes para atender à necessidade global com a rapidez de que precisamos. Por isso, diferentes opções serão necessárias para cobrir essa ampla população”, enfatizam os autores do estudo científico, que foi liderado por Brian Ward, pesquisador da Universidade McGill, no Canadá, e membro da empresa farmacêutica Medicago.

 

Segundo os criadores, um dos diferenciais da CoVLP é o fato de ela ser feita com base em uma tecnologia totalmente nova e que facilita a produção em larga escala. O imunizante utiliza um pedaço genético do novo coronavírus, a proteína spike, que é responsável pela replicação do patógeno no organismo humano.



Esse fragmento do Sars-CoV-2 é misturado a substâncias da planta Nicotiana benthamiana — rica em nicotina e em outros alcaloides, substâncias que não são agressivas ao organismo humano.

 

Compostos do tabaco selvagem envolvem o fragmento do coronavírus em uma camada de lipídios, o que faz com que ele possa ser incorporado à vacina facilmente. “Eliminamos a necessidade de criar todo o vírus em laboratório, silenciá-lo e, depois, ainda ter que desenvolver um envelope para poder usá-lo no imunizante (…) A CoVLP utiliza uma estratégia muito inteligente, que dispensa uma série de etapas feitas na produção tradicional de vacinas”, afirmam os criadores.

 

Nos testes iniciais, a fórmula foi aplicada em um grupo de 180 pessoas, com idade entre 18 e 55 anos, entre 13 de julho e 9 de agosto de 2020. A administração da segunda dose se deu em um intervalo de 21 dias — sozinha ou com um adjuvante — o AS03 ou o CpG1018 —, escolhido de forma aleatória.

“Um adjuvante é uma substância usada para aumentar a potência de uma vacina. Usamos dois para observar se um poderia se sair melhor que o outro”, explicam.

 

No 42º dia da pesquisa, observou-se que, sem um adjuvante, a CoVLP induz uma resposta imune modesta. No entanto, a presença de qualquer um dos potenciadores escolhidos aumenta significativamente a ativação do sistema de defesa do corpo. “Os participantes que receberam a CoVLP com o AS03 produziram anticorpos neutralizantes em nível 10 vezes maior do que aqueles observados em pacientes em recuperação da COVID-19. Isso nos surpreendeu”, enfatizam.





 

Testes no Brasil

 

A combinação mais promissora será melhor explorada nas próximas etapas do estudo, mas os cientistas já consideram os resultados atuais animadores. “As avaliações de fase dois e três começaram a ser planejadas. Nelas, vamos manter a participação de voluntários canadenses e incluir indivíduos do Reino Unido, do Brasil e dos Estados Unidos. Também queremos ter a participação de outros países da América Latina e da Europa”, planejam.

 

Cláudia França Cavalcanti Valente, membro do Departamento Científico de Imunização da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), avalia que os dados vistos no estudo canadense são bastante positivos e ressalta que a tecnologia usada pelos cientistas é promissora.

“É uma estratégia muito interessante, pois eles conseguem embalar esse vírus, que é usado para despertar a resposta imune, de forma muito inteligente. É algo semelhante ao que é feito nas vacinas de RNA mensageiro, em que uma camada de lipídios também é utilizada para embalar o patógeno, mas com outra técnica. Isso faz com que muitas etapas de produção da vacina sejam dispensadas, aumentando, assim, a velocidade nesse processo. É uma boa vantagem”, detalha.





 

Para a médica brasileira, o uso dos adjuvantes também foi uma aposta inteligente da equipe de cientistas. “Esse AS03 mostrou-se muito promissor ao ser usado no desenvolvimento de vacinas contra o HPV. Ele parece ser bem mais potente do que outros elementos usados com esse mesmo objetivo, como o alumínio”, justifica. “Assim como os autores do estudo disseram, temos muitas novas fórmulas sendo estudadas, e isso é muito positivo, pois é difícil conseguir imunizar uma quantidade tão grande de pessoas com poucas opções. Precisamos de todas as vacinas que se mostrem eficazes. A fim de comparação, hoje, não teríamos como imunizar todo o mundo contra a gripe porque não temos vacinas suficientes.”

 

Apostas diversas
 

Os pesquisadores canadenses que desenvolvem a vacina contra COVID-19 também usaram a Nicotiana benthamiana para auxiliar na produção de uma vacina para gripe. A ideia surgiu após ela ter sido usada na produção de um medicamento contra o ebola em 2014.

Nesse caso, a intenção era fazer com que a planta conseguisse produzir apenas a camada externa do vírus da influenza. O material foi usado como base para a fórmula de um imunizante que foi testado em 23 mil pessoas, com resultados animadores.





 

Os dados foram publicados em outubro, na revista especializada "The Lancet", e a pesquisa ainda está em andamento. O tabaco selvagem é encontrado na Austrália e tem como características as folhas redondas e de tamanho médio. Para se desenvolver bem, precisa estar em ambientes mais úmidos.

Essa planta tem sido bastante usada na área científica, em experimentos feitos com patógenos distintos, por não ser afetada por eles, e também na área de cosméticos, para o desenvolvimento de produtos de origem natural, menos agressivos ao meio ambiente.

 


Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil

  • Oxford/Astrazeneca

Produzida pelo grupo britânico AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, a vacina recebeu registro definitivo para uso no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No país ela é produzida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).





  • CoronaVac/Butantan

Em 17 de janeiro, a vacina desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan no Brasil, recebeu a liberação de uso emergencial pela Anvisa.

  • Janssen

A Anvisa aprovou por unanimidade o uso emergencial no Brasil da vacina da Janssen, subsidiária da Johnson & Johnson, contra a COVID-19. Trata-se do único no mercado que garante a proteção em uma só dose, o que pode acelerar a imunização. A Santa Casa de Belo Horizonte participou dos testes na fase 3 da vacina da Janssen.

  • Pfizer

A vacina da Pfizer foi rejeitada pelo Ministério da Saúde em 2020 e ironizada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas foi a primeira a receber autorização para uso amplo pela Anvisa, em 23/02.





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Como funciona o 'passaporte de vacinação'?

 

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