O sul de Madagascar é definitivamente o lugar mais carente de todo tipo de recursos que eu já conheci. Já visitei países nas Américas do Sul, Central e do Norte, Europa, Oceania e alguns na África onde estão alguns dos mais pobres do mundo. Mas agora todas as minhas expectativas foram superadas.
A cada noite, quando me deito, me pergunto como o ser humano pode viver desse jeito em pleno século 21. A falta de água judia de todas as formas, inclusive criando hábitos difíceis de serem mudados. A Fraternidade Sem Fronteiras, depois de várias tentativas frustradas, em agosto do ano passado, enfim conseguiu abrir um poço artesiano de 120 metros de profundidade no meio da vila onde moram 100 famílias.
O acesso à torneira é livre para buscar água para o banho, limpeza da casa, lavagem das roupas, para beber. Está sendo uma grande transformação social e de hábitos. E isso não é fácil. Falta roupa, o que leva as pessoas a usarem a mesma até que os farrapos já não lhes sirvam mais.
Males físicos evitáveis através de atenção básica à saúde são muito frequentes, como diarreias e outras infecções decorrentes da fome e da falta de higiene. Em algumas comunidades, o índice de desnutrição infantil ultrapassa 30%. Problemas respiratórios e doenças de pele também são questões contra as quais pouco se consegue avançar por aqui.
Décadas sem escovar os dentes e sem banho sequer semanal são hábitos difíceis de serem mudados e incorporados, mas aos poucos vai-se conscientizando. Um nativo confessou temer se acostumar com a água e até o prato de comida diário e de repente se ver sem nada disso de novo. Então prefere comer pouco e se lavar com parcimônia.
Tempestades de areia e ventos fortes soterram algumas casas e envergam árvores grandes. Cobrem tudo de poeira dificultando muito a manutenção da limpeza. Nas escolas públicas faltam vagas para a maioria das crianças.
Cobra-se das famílias uma taxa anual insuficiente para cobrir as necessidades básicas do ensino. Quadro negro na parede, nem sempre há carteiras, anota-se tudo em pequenas lousas individuais que precisam ser apagadas quando preenchidas. E lá se vai o conhecimento na falta de cadernos, lápis, livros. Não há para casa, não há refeitório ou cantina, não há merenda, não há banheiro. Há fé e esperança.