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Estado de Minas COLUNA

A difícil luta de combate à alienação e à manipulação

Trocando em miúdos, a superficialidade das opiniões permite que as decisões convirjam cada vez mais para a média; e, no caso do Brasil, a média é baixa


06/06/2023 07:00
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Arthur Lira
A Câmara dos Deputados, presidida por Arthur Lira, aprovou o marco temporal na semana passada (foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)
Escrevo sempre com um misto de “síndrome da impostora” e narradora de verdades relativas. Caminho entre a noção de que pouco sei mediante vasta e profunda produção científica sobre temas que ouso tratar e a ideia clara de que busco algum nível de reflexão e entendimento, especialmente sobre temas afeitos ao desenvolvimento econômico, social e humano. Na semana passada, o marco temporal e o resultado da atividade econômica, no Brasil, reforçaram minha percepção de que a mídia pouco reflete e informa sobre questões tão sérias.

Na Câmara dos deputados, aprovou-se o marco temporal, incluído no Projeto de Lei 490, limitando as áreas indígenas ocupadas ou disputadas, em 05 de outubro de 1988 - data em que foi promulgada a Constituição Brasileira. Isso significa, para além de ignorar a expulsão sofrida por muitos povos indígenas de suas terras, abrir a porteira para passar a boiada da ilegalidade que vem destruindo vidas, avançando no desmatamento ilegal e nas ameaças ambientais. Caberá ao Supremo Tribunal Federal frear essa atrocidade.

Ainda na mesma semana, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil do primeiro trimestre de 2023. O que parece ser um bom resultado é, a bem da verdade, a inércia de uma economia que só vai avançar se, de fato, houver políticas econômicas estruturadoras. Inegável que, no governo anterior, os incentivos foram praticamente voltados para o setor agropecuário que passou de uma participação histórica de 6% do PIB, até 2019, para quase 12%. 

Em sentido oposto, vem a construção civil, caindo expressivamente desde o início da operação Lava Jato e agora respondendo por cerca de 3% do PIB. O setor da construção é forte indicativo da capacidade mais estrutural da atividade econômica, mas pouco diz sobre as estratégias de política econômica do país. Em uma década, o setor de informação e comunicação manteve-se inalterado, enquanto o grupo de atividades da administração pública, da saúde e da educação passaram a cair desde a pandemia - tudo convergindo para total ausência de mudança na estrutura econômica e social. 

Para fechar, a indústria continua dando sinais de estagnação. Juros elevados, baixo nível de investimento do setor privado e contínuos discursos protecionistas por parte de governos e empresários ainda criam desastrosas “barreiras à entrada” e o país segue com custo elevado e tecnologia cara e, muitas vezes, atrasada. Para piorar, temos uma “justificada” política de juros elevados. Essa, então, cai como uma luva para os economistas que recusam qualquer teoria não clássica – lugar de fala do atual presidente do Banco Central do Brasil.

Na sexta-feira (2/6), a especialista em direito e economia Antara Haldar publicou artigo na plataforma Project Syndicate sobre a resistência dos economistas em incluírem aspectos da teoria comportamental – aquela que inclui fatores psicológicos, para além de análises econométricas, na compreensão do funcionamento das instituições – ao arcabouço tradicional. 

A bem da verdade, a teoria comportamental busca agregar à teoria do consumidor (e da firma) aspectos de irracionalidade no processo decisório que expliquem o desvio dos resultados esperados pelo modelo racional clássico. No entanto, na área da macroeconomia, em que o campo das discussões econômicas abarca PIB, inflação, metas fiscais, taxa de juros, comércio internacional etc., a teoria comportamental ainda passa ao largo das discussões e análises.  

O que a maioria dos formadores de opinião tem reforçado, mesmo que evidências apontem em direção contrária, foi bem sintetizado por Haldar: como dito por Keynes, “antecipar o que a opinião média espera que seja a opinião média” está repleto de erros e incertezas. Haldar, que também inclui em seu currículo extensa colaboração ao Nobel de Economia Joseph Stiglitz, faz coro ao grupo de mais outros três economistas também laureados que reconhecem as exceções ao paradigma neoclássico predominante. 

Ler artigos em plataformas que “ignoram a opinião média”, há muito que me traz misto de esperança e desânimo. Esperança, por um lado, por poder acompanhar avanços científicos das ciências sociais aplicadas, em que pese a interseção cada vez maior de diferentes áreas do conhecimento, em especial o direito, a psicologia e a economia. Desânimo, por outro lado, por ver que o preconceito, o estigma, a luta de forças/poder e a vaidade são capazes de se sobrepor ao objetivo incansável de melhorias no desenvolvimento econômico, social e humano. 

Trocando em miúdos, a superficialidade das opiniões faz com que as decisões convirjam cada vez mais para a média; e, no caso do Brasil, a média é baixa! Nessa baixa média, celebramos o setor agropecuário como o negócio do Brasil. E o marco temporal torna-se a cereja do bolo, para muitos, ou a tempestade perfeita para poucos.  

A palavra é dos instrumentos mais poderosos nas relações interpessoais, seja ela dita, seja escrita. No desafio da escrita, deparo-me com cruzamentos improváveis de acontecimentos, estudos e ideias que, muitas das vezes, ouso juntar para elaborar o mínimo de reflexão. Foi com esse intuito que misturei a ausência da teoria comportamental aos resultados político e econômico mais marcantes da semana passada, no Brasil. Na coluna de hoje, meu otimismo com os avanços sociais e econômicos do País não passa do primeiro parágrafo.

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