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Estado de Minas ARTIGO

Rampa dos invisíveis

Quando Aline passou a faixa no pescoço do Lula, foi ajudada pela mão invisível de dona Lindu e percebeu que a Marisa lhe ajeitava, carinhosamente, o colarinho


05/01/2023 12:33

Lula
(foto: Tânia Rego/Agência Brasil )
Hoje recebemos a iluminada visita do meu invisível amigo Cláudio Renato. Não nos conhecemos pessoalmente. Mas, é como fossemos amigos há décadas.

Virtualmente, nosso primeiro contato aconteceu no dia 27 de agosto de 2020. De lá pra cá, “jogamos  Ping-Pong”  em várias áreas, na literatura em especial.

Além de informações jornalísticas e científicas, compartilhamos crônicas, poesias e devaneios filosóficos.

Algumas vezes nos falamos pelo telefone. Geralmente para socorro jornalístico de última hora. Normal! Claudio é um dos fantásticos invisíveis por trás das câmeras.

Combinamos encontros enogastronômicos pós-pandêmicos, os quais ainda não aconteceram. Afinal, a pandemia não acabou.

Nesse segundo dia do ano, impactados pela cerimônia de posse presidencial e a sensação de alívio por nos livrarmos do fedor de enxofre que impregnava o ambiente, recebi logo pela manhã o texto do Cláudio, o qual compartilho com vocês.

Obra de quem vê, muito além de enxergar. Olhar que percebe por meio do símbolo, história e essência. Coisa de gente madura com poeira nos ombros.

Cena mágica onde os visíveis e invisíveis se materializaram em poder e abraçam sonhos do passado e futuro. Vê-la e descrevê-la com tamanha sensibilidade é arte pura e cristalina.

Obrigado, mediúnico amigo.

“Rampa dos invisíveis"

Por Cláudio Renato Passavante 

Uma catadora de papel, um jovem com paralisia cerebral, um metalúrgico, um estudante preto de dez anos, um professor, uma cadela e o Cacique Raoni subiram a rampa do Planalto com o presidente Lula e Janja.

Aline, a catadora, vestiu-se com a roupa de domingo, a que ela tem de melhor, para colocar a faixa presidencial no torso do maior líder popular do século.

No fim da cerimônia, com pérolas de lágrimas no olhar, Aline disse que ali estavam representados os invisíveis.

Quase ninguém viu quando Aleijadinho chegou, braços entrelaçados com os de Oscar Niemeyer e Carlos Drummond de Andrade, admirados do mar vermelho, o oceano pacífico das gentes.

O almirante João Cândido e o marechal Rondon perfilaram diante dos Dragões da Independência. Continências devidas.

Abraçados a Raoni estavam Sepé Tiaraju, Chico Mendes, Bruno Pereira e Darcy Ribeiro, que, embriagado de felicidade e êxtase, gritava; "Assim, eu morro!".

Grande Otelo e Joãozinho Trinta caíam numa gostosa gargalhada!

Noel Rosa, Pixinguinha, Ismael Silva, Cartola, Ary Barroso e Dorival Caymmi, em uníssono, proclamavam o que a baiana tem...

Carmen Miranda, por sororidade, preferiu seguir Janja, ao lado de Chiquinha Gonzaga, Clementina de Jesus, Gal Costa. Ruth de Souza e Leila Diniz.  Cantavam “Coqueiro Verde”, do Erasmo Carlos, na maior animação,

Pelé, Garrincha, Vinicius e Aldir Blanc, com a fantasia do Cacique, tentavam romper o mau-humor de Graciliano Ramos, que só riu quando Jorge Amado lhe fez cócegas na barriga.

Brizola, Jango e Getúlio preferiram cavaquear perto do Lula, que percebeu a presença dos profetas Gilberto Freyre e Nelson Rodrigues e lhes soprou nos ouvidos: "Vocês são foda!".

Quando Aline passou a faixa no pescoço do Lula, foi ajudada pela mão invisível de dona Lindu e percebeu que a Marisa lhe ajeitava, carinhosamente, o colarinho.

Olhou para baixo, viu um menino lourinho de sete anos, sorridente e orgulhoso, dizer:

- Parabéns, meu avô!”.

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