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Estado de Minas Padecendo

E se seu filho for gay?

'A mãe escreveu a carta a Freud com a intenção de que seu filho fosse 'curado' pelo psicanalista'


28/05/2023 04:00 - atualizado 28/05/2023 09:31
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Peça textos cruéis demais
Peça 'Textos cruéis demais', adaptação para o teatro, dirigida pelo diretor e roteirista Carlos Jardim (foto: Carlos Costa/Divulgação)


Toda vez que defendo os direitos LGBTQIAPN+, aparece alguém para me fazer essa pergunta: “E se seu filho for gay?”. Todo pai e toda mãe deveriam se fazer essa pergunta, mas a maioria prefere não pensar nessa questão e considerar que seu filho é heterossexual. Numa sociedade heteronormativa, fomos ensinados de que tudo que for diferente da heterossexualidade é anormal e deve ser reprimido.

Certa vez, Freud, o pai da psicanálise, recebeu uma carta de uma mãe de um jovem homossexual. A mãe escreveu a carta a Freud com a intenção de que seu filho fosse “curado” pelo psicanalista. A resposta de Freud, embora tenha sido escrita há quase 90 anos, é válida para os nossos dias:

19 de abril de 1935

“Minha querida senhora,

Lendo a sua carta, deduzo que seu filho é homossexual. Chamou fortemente a minha atenção o fato de a senhora não mencionar este termo na informação acerca dele que me enviou. Poderia lhe perguntar por que razão? Não tenho dúvidas que a homossexualidade não representa uma vantagem, no entanto, também não existem motivos para se envergonhar dela, já que isso não supõe vício nem degradação alguma.

Não pode ser qualificada como uma doença e nós a consideramos como uma variante da função sexual, produto de certa interrupção no desenvolvimento sexual. Muitos homens de grande respeito da Antiguidade e da atualidade foram homossexuais, e entre eles, alguns dos personagens de maior destaque na história - como Platão, Miguel Ângelo, Leonardo da Vinci etc. É uma grande injustiça e uma crueldade perseguir a homossexualidade como se esta fosse um delito. Caso não acredite na minha palavra, sugiro-lhe a leitura dos livros de Havelock Ellis.
 

Ao me perguntar se eu posso lhe oferecer a minha ajuda, imagino que isso seja uma tentativa de indagar acerca da minha posição em relação à abolição da homossexualidade, visando substituí-la por uma heterossexualidade normal. A minha resposta é que, em termos gerais, nada parecido podemos prometer. Em certos casos conseguimos desenvolver rudimentos das tendências heterossexuais presentes em todo homossexual, embora na maioria dos casos não seja possível. 

A questão fundamenta-se, principalmente, na qualidade e idade do sujeito, sem possibilidade de determinar o resultado do tratamento. A análise pode fazer outra coisa pelo seu filho. Se ele estiver experimentando descontentamento por causa de milhares de conflitos e inibição em relação à sua vida social, a análise poderá lhe proporcionar tranquilidade, paz psíquica e plena eficiência, independentemente de continuar sendo homossexual ou de mudar sua condição.”

Sigmund Freud

Em 1945, Freud explicou àquela mãe que não existe cura gay, mas só em 1990 a homossexualidade deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Infelizmente, em 2023 ainda vemos muitas pessoas com discursos preconceituosos e despreparadas para lidar com a diversidade e para aceitar a sexualidade alheia.

Quantas pessoas você conhece que passaram uma vida “no armário”? Quanto sofrimento isso causou? Quantos gays passaram a vida vendo beijos hetero e, ainda assim, queriam beijar alguém do mesmo sexo?

E os meninos que, no início da adolescência, eram e ainda são levados a iniciar uma vida sexual com prostitutas para provar sua masculinidade? Isso é melhor que beijar uma pessoa querida? É melhor ser forçado a usar o corpo de uma mulher para provar alguma coisa para alguém? É melhor que ir contra sua natureza?

As pessoas têm direito de descobrir o que elas são com o apoio e a orientação dos pais, sem forçar a barra para A ou Z. Mães amam seus filhos como eles são e não como elas gostariam que eles fossem. Se não quer ter filhos diferentes do que você idealizou, melhor não ter filhos.

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