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Estado de Minas ANNA MARINA

Novo estudo investiga o mecanismo que determina as nossas lembranças

O conteúdo de uma memória pode mudar cada vez que a trazemos de volta à mente, afirma o neurologista Gabriel Novaes de Rezende Batistella


03/08/2021 04:00 - atualizado 03/08/2021 08:08

(foto: Pixabay)
(foto: Pixabay)


Em noites de insônia, que não são raras, gosto de relembrar um pouco do meu passado, começando ainda menina, quando pulava da cama bem cedo para correr para os pés de jabuticaba. Lembro-me de coisas boas e ruins, das procissões vestida de anjo, com asa e tudo. Vou passando o tempo até chegar à Rua Piauí, onde pulávamos amarelinha na esquina, chego ao alto da Afonso Pena, onde soltava papagaio com um primo, até bater na Contorno, onde frequentava um campo de futebol com os primos. Ficava no canteiro em frente ao local onde hoje há um hotel. E as matinês dominicais no Cinema Avenida? Aqui e ali, vou reconstruindo meu passado – mas muitos detalhes das viagens internacionais se perdem na memória.

Por que será que nos lembramos de um acontecimento, mas detalhes dele fogem à mente? Quais informações são retidas na memória e quais delas se perdem? Um novo estudo, publicado em maio no periódico científico “Nature Communications”, demonstra que nossas memórias se tornam menos vibrantes e detalhadas com o tempo, apenas a essência central eventualmente se preserva.

Esse trabalho pode ter implicações em várias áreas, incluindo a natureza das memórias no transtorno de estresse pós-traumático, depoimentos de testemunhas oculares e até mesmo em práticas de estudo para exames.

“Embora as memórias não sejam cópias de carbono exatas do passado – a lembrança é um processo altamente reconstrutivo –, especialistas sugeriram que o conteúdo de uma memória pode mudar cada vez que a trazemos de volta à mente”, explica Gabriel Novaes de Rezende Batistella, médico neurologista, membro da Society for Neuro-Oncology Latin America. No entanto, até agora foi difícil medir como nossas memórias diferem das experiências originais e como elas se transformam ao longo do tempo.

Nesse estudo, pesquisadores desenvolveram uma tarefa computadorizada simples, medindo a rapidez com que as pessoas recuperam certas características das memórias visuais. Os participantes aprenderam pares de uma palavra-imagem e foram solicitados a se lembrar de diferentes elementos dessa imagem acompanhados pela palavra. Por exemplo, foram solicitados a indicar rapidamente se a imagem era colorida ou em escala de cinza (detalhe perceptivo), ou se mostrava um objeto animado ou inanimado (elemento semântico).

“Os testes ocorreram imediatamente depois do aprendizado e também após um atraso de dois dias. Os padrões de tempo de reação mostraram que os participantes eram mais rápidos em se lembrar de elementos semânticos significativos do que dos perceptuais superficiais” explica o médico.

“Muitas teorias afirmam que, com o tempo e à medida que as pessoas recontam suas histórias, elas tendem a esquecer detalhes superficiais, mas retêm o conteúdo semântico significativo de um evento. Relembre o último jantar com seu amigo: você sabe exatamente o que comeu, mas não consegue se lembrar da decoração da mesa”, comenta o neurologista.

Especialistas ligam esse fenômeno ao elemento semântico. “O padrão para a lembrança de elementos semânticos significativos demonstrados no estudo indica que as memórias são tendenciosas para o conteúdo significativo em primeiro lugar. Queremos que elas retenham as informações que provavelmente serão úteis no futuro, quando encontrarmos situações semelhantes”, informa o médico.

O “preconceito” em relação ao conteúdo da memória semântica se torna mais forte com o passar do tempo e com a lembrança repetida. Dois dias depois, quando os participantes voltaram ao laboratório, demoraram muito para responder às perguntas perceptivo-detalhadas, mas mostraram memória relativamente preservada do conteúdo semântico das imagens.

No entanto, a mudança de memórias ricas em detalhes para aquelas baseadas em conceitos foi muito menos pronunciada no grupo de indivíduos que visualizou as imagens repetidamente.

“O estudo fornece uma ferramenta para estudar mudanças desadaptativas, por exemplo, no transtorno de estresse pós-traumático, em que os pacientes sofrem de memórias intrusivas e traumáticas e tendem a generalizar excessivamente essas experiências para novas situações. As descobertas são altamente relevantes para a compreensão de como as memórias de testemunhas oculares podem ser influenciadas por entrevistas frequentes e por elas relembrarem repetidamente o mesmo evento”, explica Gabriel Batistella.

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