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Estado de Minas REFLEXÃO

Kintsugi: a arte de valorizar o velho

Conhecida como 'emenda de ouro', a técnica japonesa conserta o que está quebrado ressaltando suas imperfeições por meio do pó do ouro misturado à laca


18/02/2023 10:00 - atualizado 27/05/2023 23:04
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Tigela de cerâmica preta remendada com ouro derretido
(foto: Pixabay)

Há meses, fui movida pela dor de um paciente:  “Estou me sentindo um caco”.
 
Começamos a refletir sobre sua vida ao longo de seus 70 e poucos anos e me lembrei do KINTSUGI , “emenda de ouro”,  a arte japonesa de consertar o que está quebrado ressaltando suas imperfeições por meio do pó do ouro misturado à laca.
 
Segundo a lenda, essa arte se originou no Japão, no século XV, quando o xogum (mais alto título militar concedido pelo Imperador, com grande poder político) Ashikaga Yoshimasa enviou à China uma tigela de cerâmica quebrada, utilizada na cerimônia do chá, para ser restaurada. A tigela voltou com horrorosos grampos de metal desagradando o xogum. Ele então, recorreu aos artesãos japoneses para que fizessem um trabalho esteticamente mais agradável. O resultado foi a criação da técnica do Kintsugi, que é “arte de restaurar e valorizar a história”, (em japonês, colagem com ouro). 
 
Desta forma, os japoneses nos ensinam a valorizar nossas histórias. Assim como os objetos, também somos quebrados, colados, remendados, ganhamos cicatrizes e marcas ao longo da vida. 
 
Porém, ao invés de escondê-las, devemos percebê-las como alicerces para as novas marcas que o tempo e a vida nos trarão. 
 
Nossas marcas traduzem nossa vivência, experiência e sabedoria adquiridas através de nossos quilômetros rodados, das alegrias, tristezas, ganhos e perdas. 
 
Cada ruga, cada cabelo branco, cada cicatriz carrega um pedaço de nossa história de vida.
 
Somos seres humanos, possuímos nossa fragilidade física, mas também psíquica. Somos passíveis de erros e acertos, quando os problemas nos atingem nos sentimos fragmentados, assim como o cliente que me motivou para este artigo: “um caco”.
 
A fragilidade do momento, não raro, nos impele a esconder nossas marcas, nossas fraquezas, nossos erros, nossas dores e nossas cicatrizes.
 
Neste momento, é necessário reconhecer e honrar nossa história de vida, compreender que todos  nós temos nossa potencialidade e nossos limites. Há força em nossa limitação. Aceitar nossos medos e fragilidades nos concede conhecimento interno e liberdade para lidar com elas.
 
Aprender a valorizar o que se rompe em nós traz paz.
 
Aceitemos as nossas imperfeições, gostemos de nós como somos: quebrados, remendados, colados e transformados em seres únicos, insubstituíveis, em constante  mudança.
 
Abracemos nossos defeitos, sem culpa e sem medo. Faz parte da natureza humana: errar, falhar e ter imperfeições. Como diria Santo Agostinho: “ A nossa perfeição consiste em saber que não somos perfeitos.”
 
Nenhuma pessoa pode ser totalmente livre de falhas, assim como não pode ser somente composta por elas.
 
Valorizemos a nossa beleza que nasce através dos cacos, que quando colados nos tornam seres únicos e especiais.
 
Ninguém viveu uma vida igual à sua, nem à minha , nem à de ninguém.  
 
Somos seres individuais em constante estado de mudança. Estamos em construção até o momento de partir, transformar e reiniciar o ciclo da vida! 

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