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Estado de Minas SECA SEM FIM

Estiagem prejudica travessia de balsas e deixa municípios ilhados em Minas

Com o volume de água muito abaixo do normal na bacia do São Francisco, meio de transporte não pode ser usado e causa desabastecimento


postado em 26/07/2014 06:00 / atualizado em 26/07/2014 11:11

Em Morada Nova de Minas, com a cheia, percurso dura até 60 minutos. Agora, o tempo no barco não passa de 15 minutos(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Em Morada Nova de Minas, com a cheia, percurso dura até 60 minutos. Agora, o tempo no barco não passa de 15 minutos (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Morada Nova de Minas, Três Marias, São Francisco e Januária – A insuficiência de chuvas no leito do Rio São Francisco nas últimas duas estações das águas reduziu de forma tão considerável o volume de alguns trechos da bacia que ficou impossível a travessia de balsas, deixando “ilhados” moradores ou aumentando a duração do percurso consideravalmente. Neste mês, o nível da água no ponto de travessia na MG-402 (estrada de São Francisco a Pintópolis) baixou tanto que o serviço de balsa ficou suspenso durante 16 dias. As consequências: por conta da falta de transporte, o comércio de Pintópolis enfrentou o desabastecimento e chegou até a faltar gás de cozinha na cidade. Até o vapor Benjamin Guimarães, em Pirapora, teve que reduzir parte do percurso devido aos obstáculos no rio.

                             Assista ao vídeo dos efeitos da seca em Pirapora e Morada Nova de Minas



Ambulâncias, que deveriam levar doentes a cidades mais estruturadas, ficaram impedidas de rodar. “Houve até casos de pessoas que morreram porque não puderam ser transportadas a tempo de conseguir atendimento”, afirma o prefeito de São Francisco, Luiz Rocha Neto.

Depois da dragagem, executada pela Prefeitura de São Francisco, a travessia de balsa foi retomada, mas somente para carros pequenos. “A dragagem foi um paliativo que encontramos, pois a necessidade da balsa é muito grande, com um fluxo de 1,5 mil pessoas por dia”, afirma Rocha Neto. “Mas sabemos que a solução não é definitiva, pois o nível do rio está abaixando demais e o assoreamento também preocupa”, completa.

O supervisor de Transporte Fluvial da Prefeitura de São Francisco, João Lourenço de Oliveira, ressalta que o serviço da balsa está vinculado ao movimento de 50% da economia do município. “Os prejuízos durante os 16 dias em que a balsa ficou parada foram irreversíveis. Uma parte do município ficou completamente isolada”, afirma.

Moradores de localidades rurais de São Francisco, que dependem da travessia de balsa, se dizem assustados com a diminuição do volume do Velho Chico e, além de lamentar os transtornos enfrentados para a travessia de balsa, reclamam dos prejuízos provocados pela estiagem. “A seca deste ano foi muito brava. Até as plantações de milho, feijão e abóbora nas vazantes foram perdidas. Nunca vi o rio seco desse jeito”, declara o pequeno produtor Ailton Pereira de Almeida.

O produtor Osmane Mendonça Diamantino disse que passou apuros durante a suspensão da travessia de balsa. Ele tem uma fazenda em Pintópolis, onde cria 1,2 mil cabeças de gado. “Como a balsa parou, faltaram ração e sal para o gado”, relata ele, que teme que, com a redução do nível da água, a travessia da balsa seja interrompida de novo. Durante o período em que o meio de transporte ficou parado, faltaram gás de cozinha, pão e leite. A solução foi comprar mercadorias em Brasília, o que elevou os preços dos produtos, por conta do desabastecimento e do aumento do custo do frete.

Passeio no vapor Benjamin Guimarães agora dura menos por causa da estiagem na região de Pirapora(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Passeio no vapor Benjamin Guimarães agora dura menos por causa da estiagem na região de Pirapora (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Sem vazão
Construído em 1913, o histórico vapor Benjamim Guimarães, único movido a vapor de lenha em atividade no mundo, é outra vítima da seca que afeta o Rio São Francisco e seus afluentes. A redução da vazão da represa de Três Marias tem reduzido drasticamente o curso do rio. Com isso, pedras e bancos de areia impedem o trajeto normal do barco em Pirapora. Com o rio cheio, o vapor percorre 19 quilômetros rio afora, enquanto nas condições atuais são somente 12 quilômetros. Os marinheiros são obrigados a guiá-lo em marcha lenta para que os turistas possam aproveitar a viagem, mas mesmo assim a duração do passeio foi reduzida de três para duas horas e quinze minutos, obrigando a prefeitura a diminuir o valor do bilhete para R$ 30.

O presidente da Empresa Municipal de Turismo de Pirapora, Anselmo Rocha, afirma que o número de visitantes caiu significativamente, influenciado também pelas notícias publicadas nas redes sociais que diziam que o vapor não estava operando. “O assoreamento grande do rio impede que ele faça a manobra para retornar no antigo local”, explica o secretário. Mas não descarta o risco de o barco interromper suas atividades temporariamente. “Se não chover e a vazão diminuir, com certeza, uma hora não vai ter condição de ele navegar mais”, afirma.

A chuva que caiu ontem em Belo Horizonte e outras regiões do estado não chegou às localidades visitadas pela reportagem. Houve apenas um chuvisco muito fraco em alguns municípios do Norte de Minas, como Montes Claros.

Trajeto que foi interrompido entre São Francisco e Pintópolis: nem mesmo ambulâncias conseguiram passar(foto: Vagner Tolendato/TV Alterosa)
Trajeto que foi interrompido entre São Francisco e Pintópolis: nem mesmo ambulâncias conseguiram passar (foto: Vagner Tolendato/TV Alterosa)

Bancos de areia no caminho

A redução do volume do São Francisco é agravada pelo assoreamento, que faz surgirem imensos bancos de areia bem no meio do rio. Em Chapada Gaúcha, nem a dragagem permitiu que veículos de carga cruzassem o leito. A solução: empresários e pequenos agricultores se mobilizaram para reformar 130 quilômetros da estrada de terra que liga a cidade a Januária, permitindo a continuidade do escoamento da produção agrícola.

A dragagem do Rio São Francisco permitiu a travessia da balsa com veículos pequenos, no entanto, como o nível do rio está muito baixo não foi possível a travessia de veículos de cargas, impedindo o escoamento de sementes de capim, soja e outras culturas agrícolas produzidas na região de Chapada Gaúcha e Arinos. Um mutirão em conjunto com prefeituras da região se inicia terça-feira para melhorar a travessia de uma estrada de terra.

Sem a balsa, a ideia dos produtores é percorrer os 130 quilômetros de terra até Bonito de Minas, completando outros 40 quilômetros (de asfalto) até chegar em Januária. Nesta última, fica localizada uma ponte na BR-135, que liga o município a Montes Claros.

O prefeito de Bonito de Minas, José Reis, que preside o Consórcio intermunicipal Norte-Mineiro de Desenvolvimento Regional dos Vales do Carinhanha, Cochá, Peruaçu, Japoré e São Francisco (Cimvales), explica que a recuperação da estrada é uma maneira de impedir os sérios prejuízos para a região com a suspensão da travessia de veículos de carga na balsa. “Vamos reformar a estrada por conta própria, às duras penas. Mas, se não puder escoar a produção, a região vai viver uma situação de calamidade”, diz Reis, lembrando que Chapada Gaúcha é responsável por metade das sementes de capim produzidas no estado.

Na região, o plantio de semente de pastagens ocupa em torno de 25 mil hectares. As plantações de milho e soja abrangem outros 15 mil hectares. Os números são revelados pelo produtor Paulo Aime, gerente de uma empresa de semente de capim. “Com a paralisação da balsa em São Francisco, os produtores tiveram prejuízos e estamos sendo obrigados a reformar a estrada para a escoar a produção. Mas também existem perdas na área social e na saúde. As ambulâncias ficaram impedidas de levar pacientes para fazer consultas, hemodiálise e outros tipos de tratamento em outras cidades localizadas do outro lado do Rio São Francisco”, conta.

Na parte baixa do rio, em Morada Nova de Minas, a principal ligação da cidade é feita por balsa. Com a represa de Três Marias cheia, a travessia dura entre 40 e 60 minutos. Atualmente, em 15 minutos carros, caminhões e ônibus estão em terra firme. A maior rapidez, no entanto, esconde um risco futuro: a continuidade da seca nos próximos meses pode fazer com que a balsa encalhe. Hoje, já é preciso habilidade do barqueiro para driblar bancos de areia, galhos e outros obstáculos pelo caminho. Em caso de impedimento do trajeto, a distância em relação a cidades próximas fica praticamente inviável, além de alterar toda a logística do transporte do pescado produzido na região, que, hoje, é totalmente dependente da BR-040. (LR e PRF)


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