Página policial da edição do Estado de Minas de novembro 
de 1932 -  (crédito: Estado de Minas)

Página policial da edição do Estado de Minas de novembro de 1932

crédito: Estado de Minas

Uma inusitada quadrilha que utilizava estilingues para fazer peripécias pelo Bairro da Serra mobilizou investigadores da Delegacia de Furtos de Belo Horizonte durante dois meses, no longínquo ano de 1932. Os alvos dos bodoques eram galinhas, canários e patos, que desapareciam dos quintais sem deixar rastros.


Em 28 de novembro daquele ano, a “organização criminosa” foi, enfim, desbaratada. Os membros eram nada menos que 14 crianças, que roubavam as aves para vendê-las e, com o dinheiro, alugavam patins e compravam cigarros, doces e ingressos de cinema.

 


Os crimes não ficavam circunscritos só ao Bairro da Serra, mas iam até o Parque Municipal, onde patos também desapareciam misteriosamente.


A história estampou a página policial da edição do Estado de Minas no dia seguinte à detenção dos menores, com o autoexplicativo título: "Os galinheiros do Bairro Serra estavam ficando despovoados... a polícia descobriu uma quadrilha de crianças especializadas em furto de aves".


A reportagem trazia a história dos dois investigadores, agentes 116 e 167, encarregados do trabalho pelo delegado Gilberto da Silva Porto – que, hoje, dá nome a rua no Bairro Gameleira, Região Oeste, e também à medalha concedida aos melhores alunos do curso de formação da Polícia Civil de Minas.

 


Delator entregou os comparsas

 

Foram dois meses em vão, e as queixas das vítimas só cresciam. Até que o célebre delegado deu um ultimato aos investigadores: “ou vocês descobrem os ladrões de galinha ou, caso contrário, serão suspensos por 15 dias. Isto não pode ficar assim..”, conta a reportagem.


Eis que, na manhã daquela segunda-feira, os agentes deram de cara com um garoto, já crescido, de “boa aparência”, descendo a Rua Cláudio Manoel com um pato debaixo dos braços. Os policiais o questionaram sobre a origem da ave. O suspeito tergiversou, disse que levava o pato para casa, que queria vendê-lo para comprar remédio para mãe, enferma.


Sem acreditar naquela história, os investigadores endureceram o interrogatório e acabaram tirando a confissão do menino, que entregou mais cinco “comparsas”, todos detidos – os outros nove escaparam –, além de indicar o paradeiro de alguns animais.


Foram recuperados, entre outros, um canário-belga, com gaiola, vendido a um dono de um botequim na Rua Piauí; quatro frangos em uma “casa de família” da Serra; um pato na casa de uma senhora na Rua Monte Alegre – era “boa freguesa, diziam os meninos; e uma grande chapa de fogão. Fotos da apreensão estamparam as páginas do EM.

 

 

Um dos meninos descreveu o modus operandi da quadrilha: “Todos nós temos estilingue e a nossa pontaria é segura. Era só aparecer uma galinha, ou coisa que o valha, em ponto de tiro, e a queda era certa. O bicho não grita, começa a bater asa e a gente, com um pouco de água na sua cabeça, dá-lhe novamente alento e raramente morre um”, afirmava ele.


Depois disso, as aves eram levadas a um quintal de um dos garotos. “Dávamos milho à vontade e, quando engordavam, eram vendidos”, completava ele, que foi levado com os outros quatro ao juizado de menores, “que, certamente, tomará as necessárias providências sobre o assunto”, finalizava a reportagem.