Pioneiro do Bushcraft no Brasil, Giuliano Toniolo diz que natureza traz benefícios mentais, Rômulo Martins quer aproveitar o BushDay para treinar habilidades de sobrevivência -  (crédito: FOTOS: Arquivo Pessoal)

Pioneiro do Bushcraft no Brasil, Giuliano Toniolo diz que natureza traz benefícios mentais. Rômulo Martins quer aproveitar o BushDay para treinar habilidades de sobrevivência

crédito: FOTOS: Arquivo Pessoal

Um movimento que ganha adeptos – impulsionado pelos programas e reality shows de imersão aventureira em ambiente natural – visa treinar formas para sobreviver e praticar técnicas primitivas. Agora, há uma corrente de incentivo nacional a esse tipo de atividades ao ar livre.

 

À frente de uma fogueira, seja em campings estruturados ou nas redes penduradas entre árvores, o conceito reúne mateiros, primitivistas, escaladores e trilheiros brasileiros, que vão compartilhar experiências, técnicas e histórias no primeiro BushDay Brasil ou “Dia do Mato”, que ocorre entre hoje e domingo. Grupos de mineiros de várias partes do estado aderiram e já preparam suas barracas, redes e facões.

 

A iniciativa procura incentivar as ações no mato, na praia, na montanha ou no campo como forma de popularizar o gosto do brasileiro pelas atividades no meio natural. A participação é livre, bastando cada pessoa ou grupo de aventureiros postar fotos, vídeos ou mensagens pelas redes sociais marcando a hashtag #bushdaybr. Depois, é só interagir, conhecer gente nova e abordagens diferentes das diversas atividades.

A concepção do BushDay Brasil veio de uma das atividades ao ar livre que tende a ser um elo das várias formas de integração com a natureza e que cresce a cada dia no país. É o chamado “bushcraft” no termo inglês ou “a arte do mato” em tradução livre. Trata-se de uma releitura contemporânea das atividades mateiras, desde a antiguidade, e que veio para o Brasil inicialmente pelo ouro-pretano Giuliano Toniolo, uma das mais renomadas personalidades da sobrevivência e do Bushcraft internacionais, além de instrutor da Escola Metre do Mato.

 

Os praticantes procuram sempre substituir equipamentos modernos - sem necessariamente deixar de os levar - por técnicas e instrumentos primitivos. Assim, o projeto do dia pode ser acender uma fogueira friccionando paus com arco e broca, ou mesmo amarrar bambus para confeccionar mesas usando amarras e cipós. Erguer abrigos com folhagens e detritos e lascar pedras para fazer facas e machados (ao estilo pré-histórico) também consta no “repertório”.

 

“Bushcraft é o conhecimento e o entendimento do mundo natural. É aquilo que indígenas, ribeirinhos e povos do campo têm sobre as plantas e os animais e de como utilizar esses recursos", define Toniolo. Para o especialista, a modalidade representa uma arte e um esporte que extrapolam a sobrevivência em ambientes hostis a partir dos recursos locais. “O Bushcraft pode ser usado para construção de abrigos e obtenção de fogo, mas permite que a pessoa prospere no meio ambiente. Com o conhecimento dos recursos naturais e poucas ferramentas, a pessoa pode obter o que precisa para viver e prosperar”, afirma o pioneiro da arte mateira.

 

No caso do BushDay Brasil, a ideia veio após a pandemia do coronavírus, em 2020, como uma solução para manter o contato – ainda que virtual – entre os praticantes que vinham de todo o Brasil para o Encontro Nacional de Grupos de Bushcraft (ENGB) e ficaram impossibilitados. “Nós da administração pensamos em como manter o evento diante dessas adversidades. Nasceu a ideia de centralizar a divulgação e articulação nacional, e estimular que os grupos se reunissem sob a mesma bandeira, cada um em suas bases ou locais de evento próprio”.

 

Em 2021, o evento voltou a ocorrer com um local fixo, mas o gosto de “reunir o país no mato” permaneceu. Nasceu, então, o BushDay Brasil, “um final de semana em que todos estarão no mato”, comemora Angelo dos Santos, um dos organizadores das atividades e administradores do Grupo Guerreiros Bushcraft, do Rio de Janeiro. Na página www.bushday.com.br, dá para ver a grande adesão de gente de vários estados brasileiros, bem como de Minas Gerais, que conta com adeptos em Paracatu (Região Noroeste do estado), Camacho (Centro-Oeste), na Região da Mantiqueira (Zona da Mata) e muitos outros.

 

“Após a pandemia, percebemos um significativo aumento da procura por atividades no meio outdoor, principalmente trilhas, travessias, ciclismo, ciclo turismo e campings. Entretanto, cada um sob sua bandeira local. O BushDay Brasil busca ir além: incentivá-los, também, a unir todas as práticas pelo Brasil inteiro”, afirma Angelo.

 

O Bushcraft é uma prática que traz benefícios para a mente e para a saúde no entendimento do pioneiro Giuliano Toniolo, que tem na região de Lagoa Santa e Jaboticatubas, na Grande BH, algumas de suas bases para o treinamento de sobrevivência até mesmo para candidatos ao reality show Largados e Pelados, por meio da sua Escola Metre do Mato.

 

“O Bushcraft se desenvolve no Brasil por meio de trabalhos como o meu nas redes sociais, que inspiram as pessoas a buscar mais esse entendimento do mundo natural. Com isso, está ocorrendo uma revalorização dos conhecimentos rurais e tradicionais, principalmente por que está no meio urbano. O Bushcraft é uma excelente forma de se promover essa reconexão. Eventos como o BushDay Brasil estimulam a pessoa a estar em contato com a natureza e isso já é um grande ganho”, considera Toniolo.

 

“Hoje em dia existe uma síndrome do déficit de natureza, o que traz problemas de desenvolvimento, problemas fisiológicos e psicológicos em crianças e adultos", afirma Toniolo. "Quando as pessoas se aproximam mais da natureza, elas conhecem, gostam e defendem mais o meio ambiente. Você só preserva aquilo que conhece”, salienta o especialista.


Bandeiras de Minas Gerais vão se destacar nas matas

Branca, tremulando com o triângulo vermelho ao centro e o ideal de liberdade dos Inconfidentes, a bandeira de Minas Gerais estará em vários cantos do país ajudando a ecoar a iniciativa do BushDay Brasil de levar todos para o mato. Sozinhos, com os amigos ou em grupos organizados, os mineiros vão às trilhas - do cerrado à mata atlântica e caatinga - buscar a proximidade com a natureza.

 

Criado em 2013, o grupo Mateiros do Cerrado desbrava a região Centro-Oeste de Minas e muitos integrantes vão acampar em base primitiva com fogueira, abrigo suspenso e rede no BushDay Brasil. Um dos fundadores, Luciano Cândido, de 47 anos, do município de Camacho, afirma que nem sempre planeja bem onde vai acampar, usando de seu olhar e experiência para encontrar o melhor abrigo.

 

“Nunca fiz um roteiro exato do que fazer no mato, em geral eu saio e vou. Caso eu vá acampar, eu levo o necessário para os dias que ficarei. Caso eu saia somente para uma trilha, em geral levo água, uma lâmina e um meio de produzir fogo”, conta.

 

O mateiro conta que desde pequeno tinha contato com a natureza, levado pelo pai e o tio que eram caçadores de subsistência das épocas passadas. “Quando comecei a compreender o significado do Bushcraft, as coisas começaram a mudar na perspectiva que eu via o mato. Passei a fazer parte dele. Tirar o que for necessário sem causar danos; ou seja, realmente respeitar a natureza. O simples fato de ver um animal ou planta diferente no mato gera uma grande satisfação para mim. É uma conexão que vai além das habilidades que alguém possui no mato, é uma forma de amor à natureza”, define Cândido.

 

O mateiro do Centro-Oeste afirma que o BushDay Brasil é uma forma de incentivar a prática, mas também de fazer com que as pessoas que não conhecem absorvam essa essência e a compreendam. “Mesmo no interior, há superstições e lendas caminhando juntas. Para muitos, é uma insanidade a pessoa deixar o conforto da sua casa e passar a noite com chuva ou frio no mato. A questão de levar isso para dentro da sociedade é um sonho complexo. Os dispositivos modernos forçam todos a irem contra isso, infelizmente. Mas eu não tenho dúvidas de que o contato com a natureza molda a visão do ser humano e agrega benefícios para ele e com quem se vive”, afirma Cândido.

 

Nos planaltos de Paracatu, na Região Noroeste, outro mateiro mineiro enxerga no BushDay Brasil uma forma de difundir a cultura de contemplação e imersão no meio ambiente. Seja sozinho ou com amigos, o autônomo Rômulo Martins de Oliveira, de 43 anos, sempre gostou de ir para o mato, pratica as artes do mato há 5 anos e está criando o próprio grupo de Bushcraft que vai se chamar Carcaça do Cerrado.

 

“Sempre gostei dessa área da sobrevivência e com o tempo comecei a praticar o bushcraft, inspirado no Giuliano Toniolo da Escola Mestre do Mato, no Costa Bushcraft, nos Guerreiros Bushcraft, no Bushcraft Brasília, IDE Bushcraft, que são pioneiros e referências para mim. O que mais me atraiu, foi essa arte de aprender a aproveitar os meios que a natureza me oferece para sobreviver. Melhorou minha convivência com as pessoas e o respeito com o ecossistema”, afirma Rômulo.

 

Os idealizadores do movimento também já têm a sua base para o encontro na data de comunhão mateira. “Nós do Guerreiros Bushcraft fazemos um grande acampamento recheado de atividades no Dia do Mato. O local escolhido é Santo Aleixo, no município de Magé, no Rio de Janeiro, onde ocorreu por três vezes o ENGB. É um lugar de beleza exuberante e rica da Mata Atlântica, cachoeiras paradisíacas de águas cristalinas e muita confraternização", afirma Angelo dos Santos.

 

Para participar do evento com os Guerreiros Bushcraft, basta adquirir seu ingresso em: https://www.zig.tickets/eventos

 

Se você é mineiro ou de outro estado e quer encontrar grupos de bushcraft que vão acampar, procure contato pelas redes sociais das equipes ou no site do BushDay Brasil: www.bushday.com.br