Nada é o que parece na ótima série ‘Verdade oculta’
Ethan Hawke vive dono de sebo metido a investigador dos podres da cidade. Produção do Disney+ é neo-noir com referência a David Lynch
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É uma pena que muitas das produções para adultos do Disney+, sob o selo Hulu, cheguem sem alarde à plataforma. Há muita coisa boa escondida. Uma das grandes surpresas do fim de ano é a minissérie “Verdade oculta”, capitaneada por um adorável (por vezes insuportável) narcisista interpretado por Ethan Hawke.
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Série criada por Sterlin Harjo (da ótima “Reservation dogs”, outra pérola da mesma plataforma), traz Hawke, também produtor-executivo, como Lee Raybon. Em Tulsa, Oklahoma, ele é um jornalista freelancer autoproclamado “historiador da verdade”.
Vivendo em cima de um sebo que comanda sem o menor tino para os negócios, é obcecado por desmascarar a corrupção local – o que envolve também uma luta contra o domínio branco sobre a população negra e indígena.
É um neo-noir caótico, por vezes muito engraçado, que tem início com o aparente suicídio de Dale Washberg (Tim Blake Nelson), membro da elite local. O tiro que lhe tirou a vida veio pouco depois de Raybon publicar uma matéria associando o passado da família Washberg a supremacistas brancos.
Dale é irmão de Donald Washberg (Kyle MacLachlan), este, sim, o todo-poderoso de Tulsa, candidato ao governo do estado. O irmão morto, elo mais fraco da história, era apontado como gay.
Caso com o cunhado
Sua viúva, Betty Jo (Jeanne Tripplehorn), vive um caso tórrido com o cunhado. Em sua carta de despedida, espalhada em antigos romances policiais, Dale afirma que nada é o que parece – e que o leitor da missiva não pode confiar em ninguém, nem mesmo em Betty Jo.
Lee rapidamente tem acesso a essa primeira carta e apronta uma confusão para conseguir toda a biblioteca do morto, pois assim poderá averiguar o caso. Leva sucessivas surras, de capangas grandões e estúpidos. Só que, antes de decifrar a vida dos outros, tem que resolver a própria.
Ele é uma boa pessoa, mas isto não quer dizer que seja correto em tudo. Está devendo a pensão de sua ex-mulher, Samantha (Kaniehtiio Horn), que o trata com uma paciência incomum. Adora a filha adolescente Francis (Ryan Kiera Armstrong), mas está longe de dar segurança ela.
Passa seus dias correndo de um lado para outro, pilotando uma van branca imunda. Mas Lee não coloca o pé no freio. É imprudente até o último fio de cabelo (sempre ensebado e escondido em um chapéu de caubói).
Há uma influência grande dos irmãos Cohen, bem como de David Lynch (a presença de Kyle MacLachlan, ator preferido do criador de “Twin Peaks”, não é gratuita). A trama é acompanhada pelo melhor da música americana, do soul, country e jazz (J.J. Cale, Willie Nelson, Leon Russell e Chet Baker).
Ainda que a história se passe nos tempos atuais, todos os elementos vêm dos policiais clássicos. São homens durões, mulheres dissimuladas e muita gente ruim envolvida em uma trama sobre assassinatos, traições e romances sórdidos.
Ethan Hawke, há muito longe da imagem de babyface que carregou no início da carreira, na virada dos anos 1980 para os 1990, está cada vez melhor na meia-idade. Ele consegue ser engraçado e patético às vezes, e seu Lee Raybon, misto de repórter, detetive particular e maluco, é um dos grandes personagens da fase mais recente do ator.
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“VERDADE OCULTA”
• A minissérie, em oito episódios, está disponível no Disney+.