CINEMA

‘A queda do céu’ apresenta o mundo na visão yanomami

Documentário em longa-metragem inspirado no livro homônimo chega aos cinemas depois de estrear em Cannes e ser selecionado para quase 80 festivais

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Obra referencial da etnografia contemporânea, “A queda do céu – Palavras de um xamã yanomami” (Companhia das Letras), de Davi Kopenawa e Bruce Albert, só chegou ao Brasil em 2015, cinco anos após sua publicação original, em francês. Resultado de duas décadas de amizade entre o líder yanomami e o antropólogo francês, o calhamaço de mais de 700 páginas traz a interlocução entre dois universos dissonantes – o indígena e o branco.

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“É um livro inadaptável”, afirma a atriz, diretora teatral e ativista ambiental Gabriela Carneiro da Cunha, que estreia na direção de documentário ao lado de Eryk Rocha com “A queda do céu”. Em cartaz no UNA Cine Belas Artes, o filme chega ao circuito comercial depois de rodar festivais mundo afora (foi selecionado para aproximadamente 80 eventos do gênero), a partir de Cannes, em 2024.


Assim como o livro, o filme só foi realizado após uma relação próxima entre os diretores e Kopenawa. “O livro arrebata não só por tudo que ele traz da cosmologia yanomami, mas principalmente no terceiro movimento dele, que também se chama ‘A queda do céu’, em que Davi faz essa contra-antropologia do mundo branco, do mundo não indígena. Foi ali que sentimos um desejo imenso de fazer um filme que, como o Davi pede no livro, pudesse levar as palavras dele para longe, para que os brancos pudessem ouvir”, comenta Gabriela.


Os dois diretores se aproximaram dele e da comunidade de Watoriki, dentro da Terra Indígena Yanomami no Amazonas, em 2017. O que se vê na tela foi rodado em 2021, durante uma temporada de um mês, em que a equipe (cinco pessoas) acompanhou o ritual sagrado Reahu (um ritual funerário).


Versões do roteiro

“Fizemos durante anos diferentes versões do roteiro, a partir do livro. No meio do processo, o sogro do Davi, o grande xamã (Lourival Yanomâmi), que passou toda a mitologia da queda do céu (que seria o colapso do planeta), faleceu. Então ele e várias lideranças da comunidade nos convidaram para registrar essa grande festa”, conta Rocha.


O ritual durou aproximadamente duas semanas. O que determina a duração de um Reahu é a comida, em especial a banana. Enquanto houve bananas, a festa ocorreu.


É preciso entender que, para os yanomami, o sonho é tão importante quanto a vida desperta. Na mitologia desse povo, os sonhos são experiências enviadas pelos espíritos xapiri. É por meio deles que nascem as narrativas com as quais eles explicam o mundo – o que os não indígenas chamam de mitos. E o ritual Reahu acontece sempre à noite. Tendo isso em conta, o filme trabalha a dualidade dia e noite.


“Quando eles sonham, estão entrando em contato com o mundo espiritual. Mas não há um limite entre o mundo cotidiano e o espiritual, entre o mundo do dia e o da noite. A partir disso, resolvemos utilizar (a dualidade) como um aspecto da linguagem do filme”, diz Gabriela.


Eryk completa: “Tivemos que nos desprender dos roteiros que fizemos, pois o verdadeiro roteiro, o verdadeiro cinema aconteceu in loco a partir da experiência radical e da imersão na festa. Foi a partir dos rituais na festa e nas conversas diárias com Davi que o filme foi ganhando vida.”

 


“Floresta poliglota”

O som é essencial para o longa – em muitas cenas, por exemplo, o espectador é guiado pelo som (dos rituais, do vento, da chuva, dos animais), e não pelas imagens. Um dos textos de “A queda do céu” trata da “floresta poliglota”. “O que te guia na floresta é muito mais o som do que a imagem, porque ela é fechada, mata densa muitas vezes. O que guia o caçador yanomami é o som dos animais, e isto foi muito inspirador para a gente”, continua Eryk.


O som direto do longa, assinado por Marcos Lopes, foi captado de forma circular, a exemplo da maloca onde vivem os indígenas. É o som também que guia o espectador para o que acontece no mundo dos brancos. Toda comunicação externa é realizada via rádio, e muitos momentos do filme mostram o diálogo das lideranças com outros povos. As ameaças, vindas principalmente do garimpo, são constantemente avisadas.


“Através do que a gente não vê, mas do que ouve, mostramos a dimensão dos invasores que são umas das ameaças daquela comunidade, sobretudo pelo garimpo ilegal. Então o rádio teve um papel narrativo importante no filme”, afirma Eryk. Gabriela comenta: “O rádio acaba mostrando como a luta é uma coisa cotidiana”.


“A QUEDA DO CÉU”
(Brasil, 2024, 110min.) Direção: Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha. O filme está em cartaz no UNA Cine Belas Artes (Sala 2, 18h30).

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