Na separação, homens se ofendem e se sentem afrontados como machos
Coisas terríveis têm lugar na nossa sociedade por causa de separações. Muitos matam suas ex, provando assim seu poder, orgulho e desespero
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Perdas e separações são difíceis. Mesmo que necessárias e compreensíveis. Tão difícil que as pessoas precisam de um tempo de luto para se recompor. Toda separação envolve afetos. Ser dispensado, despedido, rejeitado, abandonado. Cada um processa a seu modo. Toda perda tem consequências e reações singulares. O afeto nos afeta.
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Para homens e mulheres, mesmo que consensual, uma separação tem consequências e resta a cada um a tarefa de elaborar, remoer, pensar e repensar, até que “a coisa” vai se diluindo. Temos o instante de olhar, tempo para compreender e o momento de concluir nossos processos.
Mas a questão afetiva, o machismo, a dificuldade da mulher de perder um homem (falo) para chamar de seu, e por motivos inumeráveis, muitas separações têm desfechos muito infelizes. Desastrosos mesmo. Da melancolia ao furor, uma ampla gama de emoções que, levadas à forma mais radical, são muito prejudiciais.
Na melancolia, o tempo do luto se torna infinito e o adoecimento é perene, porque não se pode suportar o vazio, a perda de si mesmo no outro. No caso do ódio, a briga eterna, é um modo de se manter ligado, não se separar.
Nem todos, de fato, e por questões estruturais, têm condições psíquicas e recursos para lidar com as castrações e contrariedades que a vida nos impõe. Isto é: podem reagir mal e não saberem administrar crises – e são possíveis chegar a extremos como surtos e violência. E não são incomuns. Altos índices de feminicídio e brigas infinitas envolvendo crianças, nas quais ninguém é poupado.
Seguir adiante, apesar das perdas e danos, é difícil tanto quanto necessário. Quantos filhos perdem seus pais cedo? Quantos perdem seus cônjuges? Acidentes e morte por causa orgânica acontecem. O amor é uma contingência, acontece ou não, também não é eterno, também morre.
A única coisa que ninguém pode fazer é obrigar o outro a desejar. Apesar disso, continuamos vivos. Em que pesem nossos motivos pretéritos, nossa infância, rejeições, maus-tratos e até excesso de satisfação, todo tipo de excesso representa omissão na educação em nos fazer compreender limites.
Acontecem comportamentos passionais diante do vazio insuportável, causando reações, as mais diversas, das incontroláveis às impotências em que a pessoa é lançada por uma decisão do outro. Porém, falta aceitar a vida como ela é, não temos tudo que queremos. Lidar com limites é básico. Só que nem todos foram apresentados às regras da cultura e submetidos a elas, quer queiramos ou não.
Seguimos conosco, só não podemos nos perder de nós próprios. Coisas terríveis têm lugar na nossa sociedade por causa de separações. Homens se ofendem, caem desvirilizados e afrontados como machos, perseguem e matam suas ex, provando assim seu poder, orgulho e desespero. Uma tentativa vã, e trágica, já que separações fazem parte da vida.
Os tempos mudaram, as mulheres conquistaram direito ao desejo e à liberdade, e não em dor – e jamais retornarão à posição submissa de onde vieram e contra a qual travaram suas batalhas. A entrada da mulher no mercado de trabalho, o advento da pílula anticoncepcional, conferindo liberdade sexual, da qual sempre gozaram os homens, sem as consequências indesejáveis de uma gravidez.
O ódio, a mágoa e a dificuldade com as perdas nos fazem acusar o outro, culpar o outro, talvez, com intuito de facilitar nosso lado, nossos erros e falhas. Brigar e ter raiva dói menos do que a tristeza e o luto. A briga é ativa, a dor é passiva. A contenda é um modo de prolongar, ficar ligado pelo avesso. Isso demonstra que o “amoródio” coexistem.
O avesso do amor é a indiferença. Melhor seria lembrar que, em algum momento, vimos algo de amável no outro. O amor engana. A paixão cega. Encantados, nos projetamos no outro para amá-lo. O cotidiano nos desmente! Um amor que tem chance se torna parceria, suporta faltas, falhas e é menos idealizado.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.
