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Estado de Minas DELTA DO PARNAÍBA

Rota das Emoções: um mundo de prazeres deságua no Delta do Parnaíba

No encontro com o Atlântico, o Rio Parnaíba esgueira-se placidamente no grandioso santuário ecológico que cobre 2.700km2 no Nordeste


postado em 04/02/2020 04:00 / atualizado em 05/02/2020 17:30

Quando se chega ao delta, o visitante se depara com cores vibrantes. O amarelo das dunas contrasta com o azul-escuro das águas calmas do Rio Parnaíba(foto: Bertha Maakaroun/em/d. a press)
Quando se chega ao delta, o visitante se depara com cores vibrantes. O amarelo das dunas contrasta com o azul-escuro das águas calmas do Rio Parnaíba (foto: Bertha Maakaroun/em/d. a press)


A ocupação e conquista se deu do sertão para o litoral. Daí a foca que, numa das pontas do mapa do país, se desenha contorcida. Corpo longo e focinho estreito, como que afundado numa imensidão de água doce que corta suavemente florestas de dunas transparentes, manguezais, igarapés, entremeados por mais de sete dezenas de ilhas – quando não cobertas por matas e manguezais; de areias douradas – refúgios de garças, macacos-pregos, guaribas, jacarés, capivaras, celeiros de caranguejos e dos ninhais dos vermelhos guarás.
 
Tanta água que brota do ponto mais alto do Piauí, na Chapada Mangabeiras, Parque Nacional das Nascentes do Parnaíba, rasgando o estado por 1.485 quilômetros, gesta pelo caminho de caatinga, agrestes, mata densa e cocais filhos afluentes como o Poti, o Gurgueia, Canindé, Uruçuí-Preto, Longá e das Balsas, além de uma imaginária fronteira com o Maranhão. É o Rio Parnaíba, nos dizeres tupi-guarani “rio de águas barrentas” ou “grande braço do mar”.
 
Praia de Barra Grande, paraíso tropical no Norte do Piauí(foto: Bertha Maakaroun/em/d. a press)
Praia de Barra Grande, paraíso tropical no Norte do Piauí (foto: Bertha Maakaroun/em/d. a press)
Imponente, já ao final de seu curso, esgueira-se o Rio Parnaíba placidamente no grandioso santuário ecológico que cobre 2.700km2. Antes de desaparecer por completo engolido na imensidão marinha, esse rio, que no Piauí marca a transição entre a caatinga do semiárido e as terras úmidas e florestas equatoriais do Norte amazônico, bifurca-se à foz formando os braços do Igaraçu e do Santa Rosa, que por seu turno se multiplicam em igarapés e canais. Abre-se em mão espalmada, alcançando o oceano entre dedos esticados pelas barras de Tutoia, do Caju, do Igaraçu, das Canárias e da Melancieira.
 
Entre a baixa e alta marés, o Parnaíba e o Atlântico medem força. Desafiam-se. No vaivém do combate violento, as águas se tornam salobras. Até que, por fim, sem condições de resistência, o sertão é tragado, perde-se no mar. Nas palavras do poeta piauiense Torquato Neto (1944-1972): “Adeus/ Vou pra não voltar/E onde quer que eu vá/Sei que vou sozinho/Tão sozinho amor/Nem é bom pensar/Que eu não volto mais/Desse meu caminho”.
 
Eis o Delta do Parnaíba, o único em mar aberto das Américas, entre os três maiores do mundo em extensão e beleza natural, rivalizando-se com o Nilo, no Egito, e o Mekong, no Vietnã. Está a meio caminho dos Lençóis Maranhenses e a Praia de Jericoacoara, no Ceará, referência daquela que se convencionou chamar Rota das Emoções, roteiro que integra os três exuberantes destinos no trajeto que une o menor litoral do Brasil – os 66 quilômetros que abrem o Atlântico ao Piauí, um dia cedidos pelo Ceará – , aos outros dois estados nordestinos.
 
As tonalidades das paisagens cênicas que emergem neste santuário mesclam-se entre o dourado de dunas, o verde de matas e manguezais, o céu azul, o colorido vermelho dos guarás – que diariamente persistem em revoadas ao pôr do sol até a Ilha do Caju, em inspirador soneto de harmonia. Tal orquestração da natureza sensibilizou o desbravador Nicolau de Rezende, a quem é atribuído o “descobrimento” do Piauí, que, em 1571, teria registrado: “As águas são labirintos entre florestas intocadas e a vida acompanha o pulsar incessante das marés”. Nicolau de Rezende e seus companheiros de expedição sobreviveram a um naufrágio no Delta do Parnaíba, salvos e acolhidos pelos índios tremembés, habitantes naturais do território, exímios nadadores, chamados por tal motivo de “peixes racionais”. Viveram pacificamente com eles por pelo menos uma quinzena de anos, período em que, absorvido pelo cenário, o desbravador se interrogou: “Este paraíso resistirá aos futuros desbravadores?”.
 
Sim, o paraíso, que chegou a ser alcançado por manchas de óleo ao fim do ano passado, resiste. Com a força não mais das tribos originais, dizimadas no violento processo de ocupação e colonização do território. Mas no espírito preconizado pela figura icônica de Mandu Ladino, o índio Arani, que em 1712 comandou um espetacular “exército de libertação” – reunindo tremembés, aranis, potis, cariris e carteús, entre outras tribos até então inimigas do Piauí, Ceará e Maranhão – em rebelião contra o massacre das forças colonizadoras. 
 
Manu Landino caiu em 1717, durante violento cerco ao Porto das Barcas, em Teresina. Sobrevive, contudo, não apenas na praça que leva o seu nome, em Parnaíba, mas nas ações dos moradores e ribeirinhos que protegem e lutam pela preservação do Delta do Parnaíba.


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