Nas blue zones, a longevidade  uma realidade palpável, com uma concentração notável de idosos saudáveis e até mesmo centenários

Nas blue zones, a longevidade uma realidade palpável, com uma concentração notável de idosos saudáveis e até mesmo centenários

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A população está envelhecendo. No mundo, a idade média é de 73,4 anos e a expectativa de vida do brasileiro, que era de 45,5 anos em 1940, atingiu 76,2 anos este ano, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). E deve alcançar 88,2 anos até 2100.

Em algumas regiões do planeta, as pessoas vivem mais do que as médias globais - são as chamadas blue zones. Estão na Grécia (Icária), no Japão (Okinawa), Itália (Nuoro), na Costa Rica (Nicoya) e Loma Linda, nos Estados Unidos.

Lá, a longevidade é uma realidade palpável, com uma concentração notável de idosos saudáveis e até mesmo centenários. Isso tem sido objeto de estudo de pesquisadores com o intuito de desvendar os segredos para viver mais e melhor.

Os segredos revelados

As pesquisas nas blue zones revelaram nove princípios essenciais, conhecidos como os power 9, que desempenham um papel fundamental na longevidade.

Manter-se em movimento

Nas blue zones, não é necessário frequentar academias ou correr maratonas. O segredo está na atividade física diária, seja caminhando, cuidando do jardim ou realizando tarefas comuns.

Segundo Daniel Oliveira, ortopedista especializado em coluna vertebral e diretor do Núcleo de Ortopedia e Traumatologia de Belo Horizonte (NOT), incorporar movimento em atividades diárias ajuda a manter a mobilidade das articulações e músculos.

Leia: Como comer tarde ou dormir pouco pode afetar sua saúde

"Isso é essencial para realizar tarefas básicas ao longo da vida, como subir escadas, levantar objetos e se locomover." Ele explica que, mesmo atividades simples, como caminhar, podem melhorar a saúde cardiovascular, ajudar a manter a circulação sanguínea, contribuir para queimar calorias e trazer benefícios significativos.

"Isso auxilia na redução do estresse, melhora o humor, reduz a ansiedade, previne doenças crônicas e permite que participemos mais plenamente das atividades que gostamos, mantendo a independência à medida que envelhecemos."

Daniel atenta que, além de integrar movimento no cotidiano, vale investir em alguns exercícios, especialmente em atividades de resistência para ajudar a fortalecer os ossos, reduzir o risco de osteoporose e fraturas, e manter a flexibilidade e mobilidade das articulações, minimizando o risco de quedas e lesões.

Coma menos

Em Okinawa, no Japão, eles praticam o "Hara hachi bu", que significa parar de comer quando estão 80% satisfeitos. Essa prática, de acordo com eles, ajuda a evitar excessos e contribui para manter um peso saudável.

De acordo com a nutricionista especialista em bioquímica celular, oxidologia/nutrição anti-aging e sócia-fundadora da Soloh Clínica de Nutrição, Patrícia Lara, esse, porém, é um costume local e não há evidências científicas de que interromper uma refeição ao alcançar 80% de saciedade irá prolongar a vida.

Segundo Patrícia Lara, o que ocorre é que esse princípio de comer menos está alinhado a estudos relacionando a restrição calórica à longevidade. A nutricionista ressalta que um estudo publicado na Revista Nature, dos anos 2004, já mostrou que, quanto menos se come, mais a mitocôndria vai ter tempo para se regenerar, a célula vai ter tempo de fazer autorregeneração e mais lentamente os telômeros vão se desgastar, então, se envelhece de forma mais lenta.

"A restrição calórica já era um entendimento muito antigo como prática para longevidade. Os pesquisadores estão aprendendo sobre a base molecular do envelhecimento, e encontrando pistas sobre como tratar doenças no processo. Coma menos, viva mais."

Escolhas alimentares sábias

dieta mediterrânea é comum nas blue zones. Patrícia esclarece que sua base são alimentos disponíveis em países que fazem fronteira com o Mar Mediterrâneo, incluindo uma abundância de alimentos como frutas, vegetais, grãos integrais, nozes e leguminosas, que são minimamente processados, sazonalmente frescos e cultivados localmente; azeite de oliva como a principal fonte de gordura; queijo e iogurte, consumidos diariamente em quantidades baixas a moderadas; peixe e aves, em quantidades baixas a moderadas algumas vezes por semana; carne vermelha, com pouca frequência e em pequenas quantidades; frutas frescas para sobremesa, com doces contendo açúcares adicionados ou mel comidos apenas algumas vezes por semana e vinho em quantidades baixas a moderadas, geralmente com as refeições.

De acordo com Patrícia, estudos epidemiológicos continuam confirmando que essa dieta melhora a saúde e oferece proteção contra o câncer. "O primeiro passo na carcinogênese, e possivelmente em uma série de outras doenças degenerativas, como doenças cardíacas ou demência degenerativa, provavelmente envolve danos ao DNA e outras macromoléculas. Espécies reativas de oxigênio - ou seja, radicais livres, como ânion superóxido, peróxido de hidrogênio e radical hidroxila - são geralmente consideradas uma das principais causas de danos às macromoléculas. Nesse sentido, a dieta mediterrânea mostra-se extremamente interessante, já que é rica em antioxidantes, que ajudam a combater o estresse oxidativo e a inflamação crônica."

Nas blue zones, os idosos são respeitados e valorizados. A intergeracionalidade promove o entendimento de que envelhecer é algo a ser celebrado. A geriatra da empresa especializada em home care, Saúde no Lar, Simone de Paula Pessoa Lima, acredita que o fato de a população estar envelhecendo é algo que, por si só, torna-se relevante.

"Os idosos acumulam ao longo dos anos uma riqueza de experiência e sabedoria. Suas vivências proporcionam uma visão valiosa sobre a vida, seus desafios e como superá-los. Continuam contribuindo ativamente para a sociedade, seja através do trabalho voluntariado ou compartilhando suas habilidades e conhecimentos."

Esse respeito fortalece laços familiares e ensina às gerações mais jovens a importância da empatia e da compaixão e, segundo a geriatra, ajuda a combater estereotipos negativos e preconceitos relacionados à idade.

"A valorização do público mais 60 contribui para seu bem-estar emocional, aumentando sua autoestima e nos faz refletir sobre nosso próprio envelhecimento e como gostaríamos de ser tratados quando chegarmos a essa fase da vida. Cria-se uma cultura de respeito mútuo e cuidado."

Manter vínculos sociais

Priorizar as relações familiares e de amizade é fundamental para uma vida longa e saudável. Simone ressalta que isso oferece apoio essencial em tempos de estresse, tristeza e dificuldades, fazendo com que as pessoas tenham em quem confiar e com quem compartilhar sentimentos, contribuindo para a saúde mental, além de ajudar a reduzir a exaustão. "Esse senso de pertencimento e identidade nos dá uma sensação de valor pessoal e nos incentiva a interagir com outras pessoas, proporcionando mais alegria e momentos felizes em comunidade."

Reduzir o estresse

Evitar o estresse é crucial, pois ele pode levar a doenças crônicas. Práticas como meditação e momentos de relaxamento são comuns nessas regiões. "Esse é um princípio fundamental para o envelhecimento saudável e é respaldado por evidências científicas."

Ele é um fator de risco conhecido para várias doenças crônicas, como as cardíacas, hipertensão, diabetes, depressão e até mesmo demência. À medida que envelhecemos, nosso corpo enfrenta mudanças naturais que podem torná-lo mais suscetível a essas condições de saúde. Portanto, minimizar esse esgotamento é essencial para promover a qualidade de vida na terceira idade. E a meditação e momentos de relaxamento são estratégias eficazes para isso.

Espiritualidade

A fé desempenha um papel importante na longevidade. Acredita-se que pode acrescentar anos à vida, tanto é que essa relação tem sido objeto de estudo e debate. "Há evidências que sugerem que a espiritualidade, de fato, pode desempenhar um papel na longevidade e no bem-estar geral, por ajudar a reduzir o desânimo, oferecer uma rede de apoio social sólida para compartilhar preocupações e alegrias, proporcionar significado à vida e mais disposição."

Viver em comunidade

Estar cercado pela "tribo certa" pode motivar comportamentos saudáveis e promover o cuidado mútuo.

Ter um senso de propósito

O "ikigai" japonês, que significa "razão para acordar de manhã", é um elemento essencial nas blue zones. Ter um propósito de vida pode adicionar anos à sua jornada. Essa ideia tem ganhado reconhecimento crescente e faz com que as pessoas desejem cuidar mais da saúde por quererem estar bem para cumprir seus objetivos. Isso pode ajudar a lidar com o esgotamento de maneira mais eficaz. E fornece um escudo contra problemas como depressão e ansiedade. O foco em objetivos e metas pessoais pode aumentar a resiliência emocional.

Segundo a médica, essa busca por propósito envolve a aprendizagem contínua e a resolução de questões, o que estimula a atividade cognitiva, além de fazer com que se formem redes sociais de apoio entre idosos. "Sem dúvida, é um vislumbre inspirador de como viver mais e melhor. O ideal é que possamos incorporar esses princípios em nossa vida, aproximando-nos do segredo da longevidade e do envelhecimento saudável", aponta Simone.