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Estado de Minas ENTREVISTA

Lincoln Portela: invasão a prédios dos Poderes foi 'festival de equívocos'

Vice-presidente da Câmara, mineiro vê 'total ilusão' por parte de vândalos que tomaram edifícios públicos e crê que a direita precisa 'aprender com equívocos'


17/01/2023 06:00 - atualizado 17/01/2023 00:05

O deputado federal mineiro Lincoln Portela
Integrante da Mesa Diretora da Câmara, Lincoln Portela crê que Legislativo pode cooperar com o Judiciário nas investigações sobre atos em Brasília (foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados )
Vice-presidente da Câmara dos Deputados, o parlamentar mineiro Lincoln Portela (PL) diz que a invasão dos prédios dos três Poderes da República foi fruto de um "festival de equívocos". Ele garante que a maioria dos bolsonaristas não foi a Brasília (DF) com a intenção de tomar o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e a sede do Supremo Tribunal Federal (STF). Para o deputado, um dos erros de militantes à direita ocorreu quando uma recomendação dada pelo então vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos), em 31 de dezembro, acabou ignorada.

"(Mourão) quando era presidente, pois (Jair) Bolsonaro viajou, disse "voltem às suas casas". Ele foi considerado, pela maior parte da direita, um "traíra". Um general, que sabe o que acontece nas Forças Armadas, estaria equivocado?", afirma, em entrevista exclusiva ao Estado de Minas.

Crítico dos atos de vandalismo vistos na capital federal, Portela crê que os radicais foram tomados por uma "total ilusão" ao acreditar que a invasão dos prédios públicos poderia culminar no fim do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O deputado aponta, ainda, lacunas na direita brasileira, como a ausência de um "comando central" e a "inexperiência".

Apesar da atual conjuntura, o vice-presidente da Câmara aponta a existência de "legado" positivo deixado pelo correligionário Bolsonaro. "A direita veio para ficar e vai aprender com seus equívocos. Por certo, vai aprender a saber em quais líderes confiar".

Como o senhor recebeu o ataque que culminou na invasão aos prédios dos Três Poderes, na semana passada?
Foi um festival de equívocos, que acabou passando por diversos atores, que fizeram o seu trabalho da maneira que entendiam que seria o melhor. Nem sempre o que é melhor para 'A', é melhor para 'B'. Não acredito que as pessoas chamadas para Brasília tenham sido chamadas para invadir a Praça dos Três Poderes. Vários que ali estavam sentiam-se na obrigação de continuar nas portas dos comandos do Exército e, dessa forma, seguir seu protesto - que, diga-se de passagem, ainda não havia tido os problemas que aconteceram. No problema em Brasília, parece-me que houve alguma coisa suspeita, também, de outros participantes. Se a pessoa vai a um determinado lugar para invadir, quebrar ou destruir, não leva crianças de quatro anos. Haviam pessoas de 60, 70 ou 80 anos, avôs e avós. Eles não vão levar os pequenos para participar de uma quebradeira dessas. É um sentimento que tenho.

O senhor pensa, então, que uma pequena minoria insuflou os demais a tomar os prédios?
Houve várias pessoas ligadas, direta ou indiretamente, ao movimento, que insuflaram para que acontecesse. Não se brinca com um grupo estabelecido no Brasil há 100 anos - vamos nos lembrar de 1935 e de Luiz Carlos Prestes (Intentona Comunista). Um grupo que esteve no poder, na guerrilha, sofreram atentados - e também fizeram. (Há) um uma direita inexperiente, sem um comando central, com várias pessoas dando opiniões e avaliações.

Como essas pessoas iriam invadir, depredar e fazer um ato terrorista - não podemos negar isso - contra os Três Poderes? Coloco uma certa inocência e inexperiência (da direita), contra grupos que são extremamente experientes e amadurecidos nessa área e que, pelo que percebi, sabendo do movimento que ali estava, deixa acontecer até certo limite. Não acredito que pensavam que fosse acontecer aquilo (o quebra-quebra generalizado). Mas (pensaram): "vamos ver até onde esse pessoal vai".

Percebemos a falta de policiamento ostensivo e que, às vezes, a segurança pública acompanhava. Há gravações com pessoas da segurança dizendo "entrem" na hora da chegada à Câmara. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) havia dito, dois dias antes, sobre o perigo disso acontecer. Seria interessante para quem? Para o grupo da direita ou para o grupo da esquerda? Houve uma série de nuances que precisam ser avaliadas com muita calma. Não estou afirmando conivência ou conspiração. Foi lastimável. É claro que quem tem experiência no poder sabe aproveitar muito bem isso para continuar com o trabalho.

Como o senhor avalia as imagens divulgadas pelo "Fantástico", da TV Globo, que mostram o enfrentamento da polícia legislativa sem reforço da PM ou de outras forças?
Percebemos falhas em várias áreas da segurança. Segundo informações, a Abin já havia previsto (chance de invasão). Por que não houve preparo? Em 2013, na tentativa de invasão à Câmara, André Vargas (então deputado do PT-PR) e eu seguramos uma multidão que queria invadir. O Itamaraty foi invadido e quebrado. A Polícia Penal invadiu o Ministério da Justiça. Entrei lá à época com um senador para retirar o pessoal. Henrique Eduardo Alves (MDB-RN) era o presidente da Câmara quando indígenas invadiram o plenário (em 2013). Fui lá conter. Fiquei como coordenador do Grupo de Terras Indígenas. O STF foi vítima disso por um movimento acostumado a invadir terras. Não havia, e não há, por parte dos Poderes, uma experiência nesse sentido. É lamentável o que aconteceu. Discordo plenamente daquilo. O caminho nunca foi por aí.

Foi uma total ilusão das pessoas. "Tomamos o poder". O poder não é tomado dessa maneira. Você não pode comparar 2023 com 1964, onde houve porta-aviões, apoio de governadores, da principal emissora de televisão e da maior religião da época, com a "Marcha da Família". O governo da época estava um tanto quanto desencontrado. Não se pode comparar. Há uma esquerda experiente, que sabe conduzir esse momento. A direita vai aprender. Bolsonaro deixou legado de uma direita com amor à pátria. Quais são os líderes desses movimentos? Como esses movimentos estão nas escolas, como, por exemplo, (são) o gramscismo e Paulo Freire? Quais são as referências? Não temos. A direita veio para ficar e vai aprender com seus equívocos. Por certo, vai aprender a saber em quais líderes confiar. Houve uma série de equívocos.

(Em 31 de dezembro), o vice-presidente (Hamilton Mourão), quando era presidente e Bolsonaro viajou, disse: "voltem às suas casas". Ele foi considerado, pela maior parte da direita, um "traíra". Um general, que sabe o que acontece nas Forças Armadas, estaria equivocado? Seria ele, de fato, um "traíra"? (utiliza entonação de ironia). Generais de 55 ou 60 anos estariam a fim de fazer um movimento revolucionário de tomada de poder em pleno 2023? O Brasil estaria preparado? Queriam, isso, de fato? Vão aprender. Todos estamos aprendendo. Foi extremamente lamentável, um ato de terrorismo.

(Houve) infiltrados. A direita não sabe quem é infiltrado. Todo mundo que chega lá com uma bandeira é gente boa. Muitas pessoas que estavam lá, com bandeiras e máscaras, não eram da direita.

A crença do senhor sobre a existência de infiltrados anula os erros da direita que citou ao longo desta entrevista?
Quem sou eu para dizer de onde são esses infiltrados, mas eles estavam lá, sim. Eles se infiltram. Seria uma forma de desmoralizar um movimento equivocado. (Haviam) extremados da direita e infiltrados da direita. Espero que a polícia os encontre.

Como o Legislativo pode atuar para ajudar o Judiciário no apontamento dos culpados pelo vandalismo?
O Legislativo deve fiscalizar, sim, os atos de vandalismo e cooperar com a Justiça para que as pessoas que fizeram o vandalismo sejam punidas. E, também, cooperar com a Justiça para que os inocentes, que não têm ficha criminal e não quebraram (sejam inocentados). Havia uma massa dizendo para não quebrar. Serão identificados como pessoas que não queriam a quebradeira? Independentemente de serem inocentes e puros de coração, não deveriam ter invadido, diga-se de passagem. A invasão dos radicais resultou em questionamentos e críticas direcionados ao campo político que orbita em torno de Bolsonaro.

O "Fantástico" mostrou um homem com a camisa estampando o ex-presidente quebrando um famoso relógio entregue por Luís XIV. O que fazer para que esse grupo se aglutine e consiga atuar sob bases estáveis?
Primeiro, entender que não basta dizer "sou bolsonarista". O Brasil precisa estabelecer uma direita que dialogue e converse no campo das ideias. É um processo de maturação. Não será da noite para o dia. A direita vai começar a entender que há determinados caminhos, que podem ser tomados para que ela se mantenha e cresça, sem necessidade de confronto. O homem que apareceu quebrando o relógio estava desmascarado. Até agora, não vi a identificação. Não sei se é um extremado, um aloprado, ou se tinha muita noção do que estava fazendo e não era ligado a nenhum grupo de direita. Para isso, o Legislativo pode cooperar com o Judiciário. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pode contribuir na situação dos encarcerados. Há pessoas que estavam no acampamento, não participaram (da invasão), mas foram detidas. Temos de separar o joio do trigo.


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