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Estado de Minas Entrevista/Jarbas Soares Júnior

'Não estamos fechados ao diálogo', diz PGR de Minas

Procurador-geral de Minas busca consenso para preservar atuação do Ministério Público


18/10/2021 04:00 - atualizado 18/10/2021 07:03

Jarbas Soares Júnior, procurador-geral de Justiça de MG
(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press - 29/11/13)

A Câmara dos Deputados votará em plenário amanhã, Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 5/21, que muda a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). A proposta é alvo de protesto por parte de promotores e procuradores, que consideram que o texto enfraquece o MP e fere a independência funcional de seus membros, com sérios prejuízos às investigações.

Em meio a essa polêmica, o procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior, tem sobressaído como principal interlocutor entre o Ministério Público e a Presidência da Câmara no sentido de buscar de um consenso entre as partes para a votação da matéria.

Também ex-integrante do Conselho Nacional do Ministério Público, Soares Júnior faz coro com as entidades representativas dos membros do MP ao rejeitar o texto da PEC 5/21, por considerar que a proposta representa a interferência administrativa na atuação dos promotores e procuradores. “Um órgão administrativo interferir na atividade do Ministério Público é algo inconstitucional e um contrassenso”, afirma o procurador-geral de Justiça de Minas Gerais. “A PEC 5/21 traz mecanismos muito nocivos à independência do Ministério Público”, considera.

Ele anuncia que, hoje, ás 9 horas, todos os procuradores-gerais de justiça dos estados brasileiros terão um encontro em Brasília para discutir a proposta em tramitação na Câmara. No final do dia,  os procuradores-gerais terão um encontro com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com o objetivo de aprimorar a proposta final a ser votada amanhã.

Em entrevista ao ESTADO DE MINAS, Jarbas Soares Júnior afirma que os representantes do MP estão totalmente dispostos a busca de um entendimento com a presidência da Câmara em torno de possíveis adequações ao texto da PEC/21 antes da proposta ser votada em plenário. “Não estamos fechados ao diálogo”, garante Soares Júnior. “Para nós, o  mais importante é que as ações do Ministério Público não sejam politizadas. Não haja interferência na autonomia da instituição”, assegura.

Lembrando que as “instituições precisam de paz para trabalhar”, o chefe do MP de Minas Gerais salienta que nas conversas, já houve avanços na comparação entre a proposta original do primeiro relator da matéria, o deputado Paulo Magalhães (PSD-BA) e o texto que está sendo discutido no plenário da Câmara. Veja a entrevista abaixo.


A PEC 05/21, em tramitação na Câmara dos Deputados,  propõe mudanças na composição e no funcionamento do Conselho Nacional do Ministério Público. Na condição de procurador-geral de Justiça de Minas Gerais e também ex-integrante do CNMP, como o senhor avalia esta proposta?

O Conselho Nacional do Ministério Público foi criado por meio da Emenda Constitucional 45, junto com o Conselho Nacional de Justiça, na época do governo do (ex) presidente Lula. E o (ex) presidente (Lula) dizia que abriria a “caixa-preta” do Poder Judiciário. O Ministério Publico não foi contra a criação do CNMP. O conselho veio e deu status constitucional maior ao equiparar basicamente as carreiras da magistratura com as do Ministério Público. E nós achamos que quanto maior transparência e controle dos atos do Ministério Público, melhor. No decorrer desses anos, o CNMP teve um papel importante porque o Ministério Público se adequou melhor – com paradigmas nacionais, às normas de controle do Ministério Público, às questões orçamentárias e administrativas. Na parte disciplinar, os ministérios públicos já têm a sua legislação. No entanto,  o CNMP passou a ter um poder de avocação de procedimentos nas corregedorias locais. Com o passar dos anos isso mostra que o conselho funciona e que também as corregedorias locais funcionam. Obvio que os órgãos de controle interno e externo não, obrigatoriamente, têm que condenar promotores e procuradores. A mesma justiça que se pede aos cidadãos, aos políticos e administradores também tem que ser aplicada aos promotores de justiça. O que o Congresso está fazendo – aliás, não é o Congresso, mas a Câmara dos Deputados, conduzida perlo presidente Arthur Lira? Quer rever o funcionamento do conselho. Ótimo para aperfeiçoar.  Não para piorar. Só que a proposta (PEC 5/21)   traz mecanismos muito nocivos à independência do Ministério Público.

Porque o senhor diz que a PEC traz mecanismos nocivos à independência do Ministério Público?

Digo isso porque a sugestão da proposta original interfere em ações funcionais – obrigatórias – do Ministério Público: um órgão administrativo passa a ter um poder que só o Poder Judiciário pode ter. Os atos do Ministério Público são julgados pelo Poder Judiciário. Quem faz o controle dos atos administrativos e financeiros do MP são os tribunais de contas e o próprio CNMP. Um órgão administrativo interferir na atividade do Ministério Público é algo inconstitucional e um contrassenso. Essa é a maior reclamação do Ministério Público. O segundo ponto: o procurador-geral escolher dois terços do conselho superior, que é o órgão de controle interno que julga os arquivamentos dos membros do Ministério Público e os processos disciplinares. Eu sou procurador-geral, mas sou democrata. Não posso aceitar que o procurador-geral indique dois terços (do conselho superior), quando, atualmente, (os conselheiros) são eleitos pela classe. E, normalmente, a classe não escolhe os corporativistas. Escolhe os melhores quadros da instituição para o conselho. É uma eleição democrática. Outro ponto fundamental é a escolha do vice-presidente do CNMP  –  que é o corregedor nacional, que hoje é feita pelos próprios integrantes do Conselho Nacional do Ministério Público – e não só membros do Ministério Público. É formado também por juízes e advogados indicados pela Câmara e pelo Senado. Isso me parece o melhor modelo. O atual passa a ser membros do Ministério Publico, ex-procuradores de justiça, o que é um avanço que houve nas conversas com o presidente da Câmara e os o procuradores-gerais de justiça.

Mas isso não gera uma influência política?

De uma certa forma, vai, sim, politizar o processo de escolha, mas vamos discutir, já que a Câmara, ao que parece, quer votar essas mudanças no Conselho Nacional do Ministério Público. Não estamos fechados ao diálogo. Vamos dialogar para que possa sair, talvez, uma proposta que ainda vai para o Senado, que aprimore o Ministério Público e não prejudique o seu funcionamento. As instituições precisam de paz para trabalhar e essas reformas criam um clima de aflição porque, no fundo, a proposta tem um pouco de um sentimento de parte da casa (Câmara) contra as ações do Ministério Público, especialmente quanto à Lava-jato. Isso é uma verdade incontestável.

Um grupo de procuradores e subprocuradores emitiram uma nota, pedindo a rejeição da PEC 5/2021. Eles alegam que, se aprovada a proposta vai ter como consequência a destruição do modelo do Ministério Publico, criado pela Constituição de 1988. O senhor também tem esse entendimento?

Sim. O primeiro relatório da PEC, do relator Paulo Magalhães (PSD-BA), era muito ruim. Praticamente liquidava o modelo do Ministério Publico criado pela Constituição de 1988. A proposta que foi apresentada na última quinta-feira já teve alguns avanços. Algumas balizas foram aprimoradas. Mas ainda assim nós precisamos sentar porque o texto é confuso. E isso pode ter retrocesso – e não avanço. O Ministério Público reconhece os seus erros também. Somos obra humana e somos todos falíveis. Mas, nós não podemos aceitar que uma proposta venha destruir o modelo constitucional do Ministério Público. Depois, sabemos que o Senado pode aprimorar (a proposta) e temos marcada uma conversa com o presidente Arthur Lira para a segunda-feira (hoje), para verificar se conseguimos chegar ao modelo lógico, razoável, preservando o formato constitucional do Ministério Público. O que nós não podemos transgredir e nem aceitar – e temos aí a luta social para mostrar aos parlamentares que não é o melhor caminho –, é que os fundamentos do Ministério Público constitucional sejam desestruturados.  Vejo uma disposição do presidente Arthur Lira no sentido de encontrar o melhor modelo. Ai, sentaremos à mesa para discutir,  já que existe a decisão da presidência de deliberar sobre este assunto. Então, vamos tentar, no limite do possível, achar algo que seja adequado para o Ministério Público continuar funcionando. Caso não aja um texto comum, paciência. Podemos até perder no plenário, mas o que não podemos aceitar é algo que desestruture o Ministério Público nacional e interfira na sua atividade constitucional, politizando as ações da instituição.

Hoje, os procuradores-gerais de Justiça terão um encontro em Brasília e depois terão reunião com o presidente da Câmara, Arthur Lira. Quais os pontos serão colocados nesses encontros?

Para nós, o mais importante é que as ações do Ministério Público não sejam politizadas. Não haja interferência na autonomia da instituição. E que não seja desvirtuada a organização do Ministério Público. Eu acho que já houve avanços entre o primeiro relatório do relator e o texto apresentado no plenário (da Câmara), mas é preciso achar o ponto comum. Caso não seja possível preservar os fundamentos da instituição, é melhor perdermos na Câmara e depois discutir a questão no Senado.

Mas, na prática, o que se teme em relação à aprovação do texto da PEC 5/21?

Hoje, você pode achar que a ação do Ministério Público é ruim em determinado ponto. Mas, amanha, você vai querer uma ação do Ministério Público para fazer valer a ordem constitucional e legal e este Ministério Público estará acuado. Os promotores poderão ter receio e medo de atuarem por conta de um conselho nacional que estaria altamente politizado e os promotores sujeitos a sanções de toda ordem. Então, vamos criar, na verdade, no Ministério Público, promotores receosos de atuar. Isso não é razoável.  Nem na República Velha, nem na ditadura foi assim: a interferência de um órgão administrativo nas funções do Ministério Público. Aí, um dia, o Ministério Público vai propor uma ação para a proteção do meio ambiente e uma empresa poderosa, com uma articulação política consegue que o conselho afaste o ato do promotor e puna o promotor de justiça. Isso não pode acontecer. Então, somos a favor de controles internos e externos, mas nada que interfira na atividade funcional dos membros do Ministério Público.

Em resumo, qual será o formato da proposta final que os procuradores-gerais de justiça vão apresentar à Câmara dos Deputados?

Vamos discutir. Eu falo muito com o presidente Arthur Lira, que é meu amigo pessoal,  sobre as necessidades de as instituições terem paz para trabalhar. Já que há uma vontade deliberada da Câmara de votar a proposta, que tenha um modelo que preserve os fundamentos do Ministério Público e aperfeiçoe o Conselho Nacional do  Ministério Público. Se for algo que vai desestruturar aquele Ministério Público da Constituição de 1988, que tantos serviços tem prestado ao povo brasileiro, nós não podemos concordar com isso – aí a Câmara delibera contra a opinião pública, contra a nossa vontade, contra esse modelo – e nós vamos discutir no Senado algo que seja dentro de um a lógica constitucional. Nos não podemos impor nossa vontade para o parlamento,  mas respeitamos a Câmara, vamos conversar com todos os parlamentares – aqui de Minas Gerais, eles são 53.

Então, o que senhor espera do resultado das conversas em Brasília?

Espero bom senso. Que se a Câmara quer liberar sobre a questão, que preserve os fundamentos do Ministério Público, o seu funcionamento e o modelo constitucional. Que não interfira na independência funcional e não politize e a instituição e tampouco dê ao procurador-geral de Justiça poderes superiores. Somos uma instituição democrática, que tem eleições internas para todos os cargos. E tem que permanecer assim: a democracia começa dentro do Ministério Público.


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