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Estado de Minas Crise ambiental

Bolsonaro vai encarar líderes mundiais na Cúpula do Meio Ambiente

Sem credibilidade, o governo participará de reunião, esta semana, organizada nos EUA pelo presidente Joe Biden, e falta política confiável para a Amazônia


19/04/2021 04:00 - atualizado 19/04/2021 07:27

O país registrou os maiores índices de fogo na floresta Amazônica na última década, com 197,6 mil focos em 2019 e 222,8 mil em 2020 (foto: Mauro Pimentel/AFP - 23/4/19 )
O país registrou os maiores índices de fogo na floresta Amazônica na última década, com 197,6 mil focos em 2019 e 222,8 mil em 2020 (foto: Mauro Pimentel/AFP - 23/4/19 )
Brasília – Pressionado pela comunidade internacional a melhorar a sua política ambiental, sobretudo para diminuir os índices de destruição na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se reunirá nesta semana com as principais lideranças do mundo na Cúpula do Meio Ambiente promovida pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

Embora o mandatário brasileiro tenha garantido ao colega norte-americano, em carta à Casa Branca, os compromissos de acabar com o desmatamento ilegal até 2030 e reduzir gradativamente as emissões de gases de efeito estufa, a tendência é de que ele encare um ambiente hostil no evento, com muita desconfiança quanto às suas promessas. Especialistas apontam que o Brasil chega ao encontro de forma vergonhosa.

Não bastasse a descrença nas palavras de Bolsonaro, o Brasil chega ao encontro mundial em meio a denúncias contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, de que teria cometido os crimes de organização criminosa e advocacia administrativa ao proteger desmatadores ilegais na Floresta Amazônica.

Nos primeiros anos do mandato de Bolsonaro, o país registrou dois dos maiores índices de incêndios florestais na última década, com 197,6 mil focos em 2019 e 222,8 mil focos (o mais alto do período) em 2020, segundo números do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) — e um aumento no desmatamento da Amazônia,

O ministro Ricardo Salles também é apontado como autor de desmontes em instituições a exemplo do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Ele deve enfrentar na cúpula a prova de fogo para permanecer no cargo. Salles permanece na mira do Centrão e precisa trazer ao país algum resultado, por isso, tem se movimentado amplamente, em diversas reuniões com autoridades.

Testado pelo Centrão, ministro Ricardo Salles busca apoio para melhorar sua imagem (foto: Sérgio Lima/AFP - 27/8/19)
Testado pelo Centrão, ministro Ricardo Salles busca apoio para melhorar sua imagem (foto: Sérgio Lima/AFP - 27/8/19)

Joe Biden, organizador do evento, tem em mãos carta escrita por senadores norte-americanos condenando as políticas ambientais promovidas por Bolsonaro justamente porque elas “dão sinal verde para os criminosos que operam na Amazônia, permitindo-lhes expandir dramaticamente suas atividades”.

“Tanto o Brasil quanto os Estados Unidos devem fazer mais para desenvolver políticas fortes de gestão ambiental e florestal. Isso só poderá ser feito, no entanto, se o governo Bolsonaro começar a levar a sério os compromissos climáticos — e somente se proteger, apoiar e se envolver de maneira significativa com os muitos brasileiros que podem ajudar o país a cumprir esses compromissos”, diz o texto escrito pelos senadores.

Para defensores da causa ambiental, a expectativa é de que não haja um acordo entre os Estados Unidos e o Brasil, porque é necessário ainda uma maior negociação. O que está claro é que o governo busca, desesperado, recursos de países estrangeiros. Salles tem condicionado o recebimento de verba ao controle do desmatamento no país.

Apesar de não se esperar que haja assinatura de um acordo, especialistas, ainda assim, temem que os EUA não se comprometam a mobilizar países para garantir repasses ao Brasil sem um compromisso e metas sérias por parte do governo Bolsonaro.

Na última sexta-feira, o enviado especial para clima de Biden, John Kerry, publicou em seu Twitter que é importante o compromisso com o fim do desmatamento ilegal feito por Bolsonaro na carta enviada, mas que espera ansiosamente por “ações imediatas e o engajamento com as populações indígenas e a sociedade civil para que este anúncio possa gerar resultados tangíveis”.

Titular sênior do Instituto de Energia e Ambiente (IEA) da Universidade de São Paulo (USP), Pedro Roberto Jacobi afirma que é preocupante a possibilidade de um acordo entre os dois países sem um compromisso sério de Bolsonaro, e que não se sabe ainda se o governo Biden pensa em “dar algum crédito de confiança a uma gestão ambiental desastrosa”. “Não dá para confiar”, afirma.

Coordenadora de Clima do Greenpeace, Fabiana Alves reforça que o medo é de que haja um acordo sem condicionantes firmes. “Tem que fazer negociação com um país que esteja entregando uma proteção da sua maior floresta tropical, e o Brasil não está entregando isso, assim como está violando de forma sistemática direitos humanos. É bastante sério os EUA negociarem com um governo assim”, ressalta. Fabiana afirma que os EUA deveriam pressionar o Brasil, e ela espera que isso aconteça.

Ambientalistas e entidades têm alertado nesse sentido. Na semana passada, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) publicou um vídeo direcionado a Biden dizendo para que o presidente norte-americano não confie no presidente Jair Bolsonaro, e que não faça um acordo climático com ele.

Enfraquecido


A coordenadora do Greenpeace afirma que o Brasil chega à cúpula bastante enfraquecido, sem planos e com políticas públicas esvaziadas, para negociar com um país que já não é comandado por Donald Trump, mas sim por Biden, que se preocupa com a crise do clima.

Fabiana pontua que o governo nunca teve como prioridade as mudanças climáticas e o presidente sempre foi “cético em relação à ciência e não deu o devido valor para a contenção do desmatamento da Amazônia”.

“Passou pano para quem desmatou, colocou novas regras que abria terra para grilagem sem culpabilizar e criminalizar aquelas pessoas fazendo atos criminosos na região. A mesma coisa o ministro do meio ambiente”, afirma.

O professor Jacobi ressalta que o país chega à cúpula “de uma forma vergonhosa”. “O que nós observamos é que o processo de desmonte e de falseamento das informações colocam o Brasil numa posição extremamente frágil. Essa mensagem que o presidente mandou ao Biden é vergonhosa, é quase que uma mensagem pedindo esmola. ‘Faremos isso se nos derem recurso’. A gente ficar nessa posição de pedir recurso para preservar é vergonhoso. O país está na contramão do que propõe essa reunião do clima”, diz.

Cobrança mira ações já efetivas


A postura vista nas últimas semanas no governo federal, que tenta passar a imagem de compromisso ambiental e condicionar o recebimento de recursos à preservação ambiental, vai na contramão de tudo o que foi visto desde que Bolsonaro assumiu a presidência.

O mandatário criticou por diversas vezes investimentos internacionais para preservação da Amazônia, dizendo que o país não precisava de dinheiro para esse fim. Em 2019, Alemanha e Noruega suspenderam os repasses do Fundo Amazônia e até hoje o Brasil não conseguiu reativar as contribuições, apesar das negociações que tentou conduzir.

Nas últimas semanas, o país tem desesperadamente tentado barganhar com os EUA. Além da carta enviada pelo presidente Jair Bolsonaro a Biden, foi divulgado pelo jornal “Folha de S. Paulo” que em reunião com a equipe de John Kerry, o ministro Ricardo Salles mostrou a imagem de um cão olhando para uma máquina de frango. Estaria escrito junto da imagem “expectativa de pagamento”.

Congressistas brasileiros acreditam que o governo Bolsonaro precisa dar provas mais consistentes aos líderes internacionais de que a política ambiental do país será corrigida.

O deputado Nilto Tatto (PT-SP), integrante da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, reclama que o governo tem assumido posicionamento diante da comunidade internacional de não reconhecer a crise climática e nem os espaços internacionais em que são discutidas saídas para amenizar o problema. Além disso, ele critica que, internamente, o Executivo não cumpriu nenhum dos compromissos que assumiu em encontros anteriores.

“O Brasil deveria adotar a política que historicamente adotou com relação ao meio ambiente, de participar de debates sobre mudanças climáticas para ter metas mais ambiciosas, sobretudo para reduzir a emissão de gases de efeito estufa”, opina. Para o deputado Camilo Capiberibe (PSB-AP), membro representante da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, a cúpula representa momento decisivo para Bolsonaro.

“Não adianta fazer promessas para 2030, é preciso mostrar resultados em 2021. Haverá pressão de outros países porque o que está em jogo não é a soberania do Brasil, como diz o presidente, mas sim, o futuro do planeta. Portanto, o governo precisa apresentar alguma coisa muito concreta para melhorar a sua posição”, afirma. (AF e ST)






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