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Estado de Minas Justiça

Proposta de deputado põe em risco perícia independente no INSS

Projeto de lei que trata da remuneração de peritos está na pautada CCJ e pode barrar busca de recurso do cidadão na Justiça


01/07/2019 06:00 - atualizado 01/07/2019 07:59

Guilherme Feliciano, ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho:
Guilherme Feliciano, ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho: "Há uma incoerência quando o perito que realiza a prova judicial pertence ao mesmo corpo que originalmente recusou àquele cidadão o seu direito" (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Brasília – Após uma explosão de protestos nas redes sociais e de uma enxurrada de reclamações de especialistas, o deputado federal Eduardo Bismark (PDT/CE) decidiu amenizar um “jabuti” incluído no projeto de lei (PL 2.999/2019), do qual é relator, que extinguia a perícia médica independente para contribuintes do INSS que tiveram benefícios negados ou cancelados pelo órgão.

A consequência do artigo inserido no texto seria deixar o cidadão que eventualmente se sentiu lesado apenas com a avaliação dos peritos federais – os mesmos, de acordo com os críticos, responsáveis pela retirada dos benefícios.

Eduardo Bismark prometeu protocolar hoje um novo relatório com a mudança do item. “O objetivo da medida foi reduzir custos, e ela teve apoio do Ministério da Economia, dos peritos e do Judiciário. Tenho conversado muito com todas as partes. Entretanto, por causa da polêmica, vou incluir um parágrafo explicando que a convocação da perícia independente é da deliberação do juiz (conforme é hoje). Se ele questionar qualquer resultado, pode vetar ou convocar outro especialista. Aí, acho que atendemos a todos: médicos, Justiça e equipe econômica”, diz o deputado.

O PL 2.999/2019 trata da remuneação dos peritos do INSS, está na pauta da CCJ para votação na terça-feira.

Atualmente, quando o segurado da Previdência Social tem algum problema sério que o deixa permanente ou temporariamente incapacitado, a primeira perícia é feita por peritos médicos federais. Quando o laudo não está de acordo com o que o doente ou incapaz pensa ou sente, ele busca o Judiciário. Durante o processo, o magistrado convoca outro especialista na mesma área, de fora do serviço público, para ter uma segunda opinião. É justamente essa segunda opinião que será prejudicada se a proposta de Birmark permanecer no projeto de lei.

O relator alegou ter proposto a eliminação da perícia independente por motivo de economia. No relatório apresentado à CCJ em 26 de junho, ele explica que uma única perícia judicial pode chegar, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), a R$ 1.850. “Estima-se que em 2019 o montante necessário ao custeio das perícias judiciais alcance o valor de R$ 316 milhões e, em 2020, se nenhuma providência for adotada, ultrapasse R$ 328 milhões”, afirma. Dessa forma, seria mais racional aproveitar melhor do corpo de peritos médicos federais, “com o objetivo de realização da perícia também na esfera judicial”.

Crítica


De acordo com a advogada Viviane Moura de Sousa, presidente da Comissão de Direito Previdenciário da seção do Distriuto Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF), a proposta “é, no mínimo, imoral”. “Entendemos que, se o INSS já negou a perícia, a parte lesada, que é o pobre, vai ficar mais lesada ainda. Além disso, o isolamento da carreira dos peritos federais também já foi criticado pelo Conselho Federal de Nacional”, destaca Viviane.

O juiz Guilherme Feliciano, do Departamento de Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), destaca que, “de fato, há uma incoerência quando o perito que realiza a prova judicial pertence ao mesmo corpo que originalmente recusou àquele cidadão o seu direito”. Não é adequado, afirmou, aproveitar os peritos federais, quando a própria União é a ré.

Especialista defende servidor


O especialista em direito previdenciário Washington Barbosa, diretor-acadêmico do Instituto Duc In Altum, não vê problema no fato de o perito federal eventualmente fiscalizar o trabalho de um colega. “O especialista tem responsabilidade profissional e, em caso de fraude, responde a processo ético, civil e penal. Nenhum laudo é irrefutável e todos merecem contraditório. Acho que dá mais segurança que o processo, no todo, seja tratado por um concursado do que por uma perícia privada”, argumenta.

Na análise do advogado Diego Cherulli, porém, a ideia por trás do PL 2.999 é extinguir a perícia independente, apesar do prejuízo para o cidadão. “É importante destacar que a maioria das perícias que passaram pelo pente-fino do INSS estão judicializadas. Isso causa ainda mais prejuízo para os cofres públicos porque, lá na frente, além da indenização, a União vai ter que bancar aquele direito com juros e correção monetária. É nisso que o governo tem que pensar. Não é adequado que um grupo de nega seja o mesmo que vá avaliar a contestação do que foi negado”, ressalta.

Francisco Cardoso, presidente da Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP), critica as declarações da representante da OAB/DF e do advogado Diego Cherulli. “Nós temos fé pública. Somos isentos e não dependentes de gestor ou de governo. Podemos, sim, emitir laudo mesmo quando a União é parte do processo. Trabalhamos para o Estado e não precisamos da amizade de juízes”, afirmou. Ele disse ainda que, “se a OAB for coerente, deveria sair do processo (acompanhamento do PL 2.999)”.

Por meio de nota, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) lembrou que dados do TCU, demonstram que os custos médios periciais na Justiça Estadual chegam a ser 50% maiores do que na Justiça Federal. No Tribunal do Mato Grosso do Sul, em que a perícia judicial é mais cara, o custo médio chegou, em 2016, próximo ao máximo estipulado pelo Conselho de Justiça Federal (R$ 720). “Os dados ainda apontam que, embora a Justiça Federal possua 85% dos processos previdenciários (acidentários ou não), ela é responsável por apenas 17% do total gasto com perícias, enquanto a Justiça Estadual (apenas nas ações acidentárias e delegadas) é de 27%”, destaca a Ajufe.


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