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Estado de Minas

Hélio Garcia, a velha "raposa" da arte do impossível, tinha estilo único na política

Ex-governador de Minas Gerais duas vezes, ele também foi vice-governador de Tancredo Neves e prefeito de Belo Horizonte. Era o político dos bastidores.


postado em 06/06/2016 09:03 / atualizado em 06/06/2016 12:47

Governador de Minas por duas vezes, prefeito de Belo Horizonte, deputado federal e deputado estadual, formado nas escolas do udenista Magalhães Pinto e pessedista Tancredo Neves, Hélio Garcia marcou a política mineira, principalmente no período compreendido entre os anos 80 e a primeira metade da década de 90.

Escolhido por Tancredo Neves para ser, em 1982, o vice em sua chapa na disputa ao governo de Minas, teve papel fundamental não apenas na campanha que derrotou numa disputa apertada o candidato do governo militar, Eliseu Resende, do Partido Democrático Social (PDS). Hélio foi também um dos principais articuladores do Acordo de Minas, que garantiu a repetição no estado das negociações que viabilizaram a formação da Aliança Democrática -, coligação do PMDB com a Frente Liberal (dissidência do PDS liderada por Aureliano Chaves) - para o lançamento da candidatura de Tancredo à Presidência em agosto de 1984.


Quando Tancredo renunciou ao cargo de governador, Hélio Garcia, que acumulava o exercício da vice-governadoria e da Prefeitura de Belo Horizonte, passou o comando da cidade a Rui Lage para assumir o estado. Tocador de grandes obras, sempre terminou as gestões com alta popularidade. Ao final de cada mandato, invariavelmente se exilava em sua fazenda produtora de café, no Sul de Minas, a Fazenda Santa Clara.

Hélio tinha estilo único. Odiava as luzes da ribalta. Mas amava os bastidores: “Política deve ser feita à noite, de chapéu e sobretudo, dentro de um táxi em movimento", pregava. Era discreto. Pensava muito e falava pouco. Mas quando o fazia, usava o seu arsenal de tiradas. Não era nem cruzeirense, nem atleticano, mas americano “por parte do pai, e pai não se contraria”, explicava. Na disputa à Prefeitura de Belo Horizonte de 1996 votou em “Amílcar de Castro”, evitando a sinuca de bico entre o seu médico pessoal e amigo Célio de Castro (PSB) e Amílcar Martins (PSDB), candidato do então governador Eduardo Azeredo (PSDB). Gostava de dizer que não tinha inimigos, porque nem tempo para fazer novos amigos tinha. Também repetia: “Não brigo, mas também não faço as pazes”. Muitos sentiram o peso da máxima. Francelino Pereira, governador de Minas pela via indireta entre 1979 e 1982, ex-presidente da Arena, homem que deu incansáveis mostras de lealdade ao regime militar, foi um deles.

Ao final de março de 1979, logo depois que assumiu o governo de Minas, Francelino driblou o então vice-presidente da República Aureliano Chaves, que apoiava Hélio Garcia para a Prefeitura de Belo Horizonte: apressou-se em silêncio a indicar o aliado Maurício Campos. Ao encontrar-se casualmente com Hélio na Assembleia Legislativa, Francelino tentando uma aproximação, brincou: “Ô Hélio, você emagreceu", disse o governador pegando no paletó do “amigo”. Hélio retrucou, virando as costas em seguida: "Uai, Francelino, você agora virou alfaiate? Alfaiate é que se preocupa com roupa dos outros..." Se não era brigados, fazer as pazes pra quê?

Em 29 de novembro de 1979, com o fim do bipartidarismo imposto pelo Ato Institucional número 2 de 1965, Tancredo Neves, Hélio e Magalhães Pinto articularam a fundação do Partido Popular (PP). A nova sigla reunia políticos da situação e da oposição, numa tentativa de sinalizar uma via de conciliação alternativa entre a oposição e o regime militar. Hélio foi eleito presidente e organizou o partido no estado.

A formação do PP foi o embrião da chapa Tancredo Neves – Hélio Garcia. Dois anos depois, a nova legenda seria incorporada pelo PMDB e derrotaria em Minas o PDS de Francelino Pereira. Sem deixar o cargo de governador, Francelino conduziria campanha de Eliseu Resende. Com a máquina ma mão, a disputa foi apetada. Tancredo e Hélio venceram com pouco mais de 200 mil votos de diferença. A estratégia da oposição de agregar nomes egressos da Arena, com ampla penetração em pequenas cidades, como era o caso de Hélio Garcia, fora bem sucedida. Ali deu-se o passo decisivo de Tancredo rumo ao Palácio do Planalto.

De poucas palavras, era nos gestos em que a esfinge se decifrava. Na década de 90, certa vez, a pedido do então presidente Itamar Franco, Zé Aparecido foi conversar com Hélio no Palácio das Mangabeiras. Um não confiava no outro. A “rixa” vinha de longe: Zé Aparecido, que era peemedebista, sentiu-se preterido quando em 1982 Hélio Garcia foi anunciado por Tancredo como o seu vice, posição que pleiteava mas acreditava, perdera quando viajara para uma cirurgia cardíaca em Cleveland, nos Estados Unidos. Mais de dez anos depois deste episódio, Zé Aparecido chegava ao Palácio da Liberdade levando uma testemunha para a conversa com o governador mineiro. Mas ao ser recebido por Hélio em pessoa, notou que também ele se encarregara de chamar não uma, mas duas testemunhas.

Ao mandar recados Hélio era sempre certeiro: “No nosso comício teremos bandeiras brancas e pretas, azuis, verdes e amarelas, vermelhas, todas, porque não temos preconceito de cor'”, anunciou em 1984, já governador, durante a campanha de rua de Tancredo Neves, destinada a legitimar a disputa indireta à Presidência da República. Hélio mirava no governador do Pará, Jarbas Barbalho, que havia mandado a polícia recolher as bandeiras vermelhas de apoio a Tancredo durante comício naquele estado.

Formado em direito, começou a carreira política elegendo-se deputado estadual em 1962, durante o governo de Magalhães Pinto. Embora Magalhães tenha sido um dos articuladores do golpe militar em Minas, Hélio, que ocupava o cargo de secretário de Estado de Interior e Justiça, teve comportamento discreto no movimento que destituiu João Goulart.

Da UDN Hélio passou à Arena a partir da instituição do bipartidarismo, em 1965. Foi pela Arena que elegeu-se deputado federal em novembro de 1966, mas, ao encerrar o seu mandato em janeiro de 1971, declarou-se desiludido com a política. O regime militar recrudescia. Hélio, que já assistira à cassação de Márcio Moreira Alves pelo Ato Institucional número 5, em 1968, estava pouco à vontade na base do governo. Este seria o primeiro de vários afastamentos ao longo de sua carreira política – principalmente ao final de seus mandatos executivos, quando exilava-se em sua fazenda por longos períodos, antes de ganhar fôlego para novo retorno.

Os últimos anos de sua vida foram reclusos. Hélio pouco saía de sua casa na rua Paracatu do bairro Santo Agostinho. Foi um longo ostracismo provocado por vários problemas de saúde. Lapsos de memória evoluíram para esquecimentos e dificuldades inclusive de reconhecer mesmo pessoas próximas. O ex-governador foi diagnosticado com provável mal de Alzheimer. Teve graves problemas circulatórios, osteoporose e insuficiência coronária. Usava marcapasso em decorrência de uma arritmia. Em outubro de 2006, foi interditado.

Adriana, filha mais velha, com o apoio da irmã do meio, Andréa, foi a curadora do pai até 2009. Mas uma indisposição entre a irmã mais nova, Daniela, e as duas mais velhas, entretanto, levou a uma sequência de entraves judiciais que inviabilizaram a curatela: Adriana se viu impedida de renegociar empréstimos, contraídos por Hélio Garcia no processo de produção do café. A Fazenda Santa Clara era muito produtiva, empregava mais de cem trabalhadores, e iniciava a produção contraindo empréstimos bancários, que eram investidos no café e quitados após a comercialização.

Com o apoio de Daniela, o advogado Evandro de Pádua Abreu, que no segundo governo de Hélio Garcia (1991-1994) chegou a acumular várias pastas -, foi indicado pela juíza Ângela de Lourdes Rodrigues para a curadoria, em substituição a Adriana. Mas a gestão da curatela do antigo correligionário, que se estendeu de 2009 a 2012, trouxe mais problemas do que soluções. Em março de 2015 a 2a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou Evandro de Pádua Abreu, por desvio dos seus rendimentos utilizados em atividades distintas à sua finalidade. Segundo a sentença, ele deixou de efetuar pagamentos e despesas essenciais como plano de saúde, contas de água, luz, tevê por assinatura, telefone fixo, celular, condomínio, entre diversas outras, o que levou à sua inclusão no cadastro de pessoas inadimplentes, além da deterioração de sua qualidade de vida. Francisco Luís Moreira Penna foi nomeado curador em substituiçao a Evandro de Pádua


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