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Estado de Minas ARTIGO

Opinião: Quem tudo quer, tudo perde


postado em 18/01/2015 12:05 / atualizado em 18/01/2015 13:56

A sabedoria dos nossos avoengos portugueses é exemplar. Não me enfado de analisar os anexins ou ditados que nos doaram: “Quando as bargas de seu vizinho pegam fogo, ponha as suas de molho”. Tomaram bargas, que são feixes de palha trançada, por barbas. “Quem tem telhado de vidro, não joga pedras no do vizinho”, mais moderno, ou “quem muitas pedras lança ao alto, uma lhe vem à cabeça”.

Digo isso a propósito do pré-sal. Como crianças desavisadas, vimos o céu no fundo mar. Tornamos disfuncional a exploração (modelo de partilha do óleo com a Petrobras, necessariamente sócia em 30% de qualquer descoberta de terceiros habilitados a perfurar o subsolo marinho, a 6 mil metros). O resultado foi o desinteresse de muitos e sobrecarga para a estatal. Como se não bastasse, novos leilões exploratórios não foram feitos, evitando a entrada de outros players nas reservas do Brasil.

Os governos Lula-Dilma na área de petróleo e gás foram lenientes patronos de péssimas governanças corporativas, levando as ações a perderem 80% do valor que ostentavam (crime de lesa-pátria). As governanças se mostraram a técnicas, míopes em relação ao quadro mundial. Tome-se por exemplo a rápida ascensção do xisto nos EUA e dos gasodutos russos, a subida da China à 4ª maior produtora, os leilões no Golfo do México e a paralisação dos leilões nacionais de áreas exploráveis, num ramo tão dinâmico da economia mundial, de grande poder geopolítico e geoeconômico. Nos atrasamos quando era lucrativo produzir.

Os efeitos dos cinco anos sem leilões da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), entre 2008 e 2013, atingiram este ano o seu pico sobre a indústria de óleo e gás no Brasil. De acordo com o Banco de Dados de Exploração e Produção da ANP, o número de poços exploratórios perfurados este ano no país, até dezembro, foi o pior desde 2002. Ao todo, foram perfurados 81 poços entre janeiro e novembro, o que representa uma queda de 30% na comparação com igual período do ano passado. "Sem áreas para explorar, não tem perfuração” diz a ANP. Esse recuo é, sem dúvida, fruto dos anos sem leilões, um resultado esperado pela indústria.

A própria Petrobras reduziu seus investimentos em exploração por falta de dinheiro e de novas áreas, comenta o consultor e ex-diretor da ANP David Zylbersztajn. Aduz o analista: “A retração nas atividades de exploração no Brasil gera impactos não somente na renovação das reservas provadas de óleo e gás do país, como impacta os negócios da cadeia de fornecedores. No rastro do menor ritmo das petroleiras, empresas globais como Tenaris (controlada do grupo ítalo-argentino Techint), a americana Baker Hughes e a francesa Vallourec, por exemplo, vêm reportando queda de receita no mercado brasileiro nos últimos meses e já colocam o país como principal responsável no recuo de negócios na América Latina”. A Arábia Saudita, cujo custo é de US$ 8 o barril, mantém o preço em US$ 50 para prejudicar o Irã e a Rússia e sobretudo para matar o xisto dos EUA, mas tornará o pré-sal inviável (custo por barril na média de US$ 50). Esse preço é mortal.

A presidente, ao manter a atual diretoria da Petrobras, quer isentá-la de culpa? Em verdade, é um gesto teimoso, de uma impropriedade política colossal, a menos que seja para assinarem o balanço da empresa, e assim ficarem responsáveis pelo que fizeram de 2010 a essa data, que ninguém no país quer assumir risco tão grande.

Renovar a diretoria e o conselho da Petrobras com técnicos competentes da casa e pessoas testadas no mundo empresarial daria um choque de esperança e credibilidade aos acionistas nacionais e estrangeiros, como o primeiro passo para salvar a empresa. Ativar os leilões, mudar o regime de exploração e libertar o preço dos combustíveis do controle do governo, para fazer caixa, seriam passos imediatos para reanimar a empresa, com a recomendação de rever, em regime de urgência urgentíssima, os procedimentos gerenciais.

Mas, a presidente está paralisada e o quadro de descrédito só faz crescer, piorando a situação da empresa mundo afora. No fundo, milhões de pessoas se perguntam quais são os motivos para persistir na manutenção da atual diretoria e conselho de administração da combalida Petrobras, outrora a maior empresa do Brasil. Certos analistas pessimistas chegam a dizer que a empresa, a mais endividada do mundo, se tornará inadimplente e em consequência disfuncional. Estamos no fundo do poço!

E não compreendem a lógica de comprar óleo e derivados do exterior e revendê-los com prejuízo. Somente irresponsáveis gerem empresas com cotação nas bolsas internacionais dessa maneira. Patrimonialismo é exatamente isso: usar o poder e o patrimônio público para satisfazer interesses pessoais e partidários.

Sacha Calmon
Advogado, presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF) no Rio de Janeiro


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