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Estado de Minas VIDA DE PROFESSOR

Educadores que ensinam como reescrever destinos

Mestres que se dedicam à educação de jovens e adultos falam da satisfação em proporcionar uma nova chance de aprender aos que não puderam frequentar a escola


10/10/2023 04:00 - atualizado 10/10/2023 09:28
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Fernanda Sueli Soares
"Se fosse possível, só lecionaria na EJA. Os estudantes vêm com uma trajetória diferente, têm muitas histórias para contar. Gostam de escrever, de copiar textos e de fazer contas" Fernanda Sueli Soares, Atua há 20 anos na profissão, 12 dos quais como professora na Educação de Jovens e Adultos (EJA), com alunos da Escola Municipal Padre Sebastião Tirino, no Centro de Sabará (foto: Tulio Santos/EM/D.A.Press)

As palavras abrem portas, os números indicam saídas, enquanto os professores mostram os caminhos com a luz do conhecimento. Assim na escola como no dia a dia, os alunos precisam de direção – e ainda mais se estão na idade adulta e têm maiores compromissos. Mas, mesmo com os dias atribulados, e com a ajuda de “guias” dedicados, eles pegam lápis e papel para reescrever sua história.

“Nunca é tarde para estudar. Parei no tempo, mas recuperei minha história”, garante o motorista Sebastião Januário Alves, de 72 anos, matriculado na unidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Escola Municipal Padre Sebastião Tirino, no Centro de Sabará, Região Metropolitana de Belo Horizonte. Nesta semana dedicada aos professores, ele presta sua homenagem: “São anjos guiados por Deus para iluminar nossa jornada.”

Já na capital, o professor Gleidston Alis, com pós-doutorado em literatura e docente na EJA da Escola Municipal Caio Líbano Soares fala do seu ofício com devoção e olhos voltados para a questão social. “Vivemos num país marcado por desigualdades históricas, então dou minha contribuição para diminuir esse quadro. Muitos jovens e adultos brasileiros saíram da escola por necessidade, não porque quiseram.”

Guias para uma segunda chance

No vasto mundo de conhecimento, a vida imita a arte, a arte imita a vida e as duas se completam em harmonia. Na plateia de um teatro, diante do palco, ou na sala de aula, olhando para o quadro, lá estão homens e mulheres, várias cores de pele, ricos e pobres, gente de todas as idades em busca de história, cultura, transformações. Na Semana do Professor, os aplausos vão para os mestres – ou seriam “maestros?” – que regem suas classes, dedicam seus dias ao ofício fundamental à sociedade e fazem das tripas, coração, para a turma não desafinar. Nem perder o trem da história.

Em tempos tão desafiadores para a humanidade, os professores trazem lições de vida e aprendizagem para imprimir o tom certo à caminhada dos estudantes. E sempre mostram a direção, especialmente quando lecionam para aqueles que, por uma série de motivos, não tiveram acesso ao ensino fundamental ou médio na fase tradicional. 
 
Há 20 anos na profissão, 12 dos quais atuando como professora na Educação de Jovens e Adultos (EJA), em Sabará, na Grande BH, Fernanda Sueli Soares declara sua paixão pela sala de aula, de forma especial para a sua turma de alunos de 16 a 88 anos. “Se fosse possível, só lecionaria na EJA. Os estudantes vêm com uma trajetória diferente, têm muitas histórias para contar. Gostam de escrever, de copiar textos e de fazer contas”, explica Fernanda, responsável pela terceira e quarta séries da EJA na Escola Municipal Padre Sebastião Tirino, no Centro de Sabará.

Nas classes multisseriadas da EJA (primeira e segunda, de alfabetização; terceira e quarta, de temas diversos), os alunos podem esbanjar criatividade. “Temos muitas atividades, a exemplo de pintura em pano de prato e em sabonete. Todo mundo participa e, curiosamente, os que não têm habilidade ajudam os que têm.”

O dia de Fernanda Sueli começa às 5h e termina depois das 22h, quando sai da escola. Casada, mãe de Bernardo, de 11 anos, e Gabrielly, de 6, ela leciona ainda, à tarde, no ensino fundamental da Escola Municipal Construtor Joaquim Borges. “A gente corre de um lado para outro, leva os filhos para a escola, prepara as aulas, mas tudo isso dá muito prazer.”

O desejo de ser professora nasceu aos 8 anos. “Até essa idade, tive muita dificuldade na aprendizagem, não conseguia ser alfabetizada. Mas, então, fui estudar na sala da professora Marta Sueli, que tinha Sueli no nome, como eu, e tudo mudou. Logo aprendi e decidi que seria professora”, recorda-se a moradora de Sabará, certa de que, mais do que um trabalho, ser professora é missão, sacerdócio.

Anjos e planos ambiciosos

A aula começa às 17h45, termina às 22h, e o motorista Sebastião Januário Alves, de 72, procurar não falhar. E leva os estudos muito a sério, cheio de planos. “Daqui a pouco, quero estar na faculdade. Meu sonho é ser engenheiro, e peço a Deus que me dê saúde e sabedoria para chegar lá”, diz o homem natural de Caratinga, na Região Leste de Minas, que se enche de entusiasmo para dizer que “nunca é tarde para estudar”.

Viúvo e residente em Sabará, Sebastião está aposentado e faz trabalhos esporádicos como motorista – sua vida, a exemplo de milhões de brasileiros, começou na zona rural e está recheada de surpresas. “Lá na minha terra, no meu tempo de criança, havia um fazendeiro muito ‘bonzinho’, que abriu uma escola na sua propriedade. A professora veio de Viçosa (Zona da Mata mineira), mas, passado um tempo, se casou e foi morar em São Paulo. Fiquei sem estudar um tempo, depois, adulto, me mudei para Belo Horizonte e fui obrigado novamente a interromper os estudos. Felizmente, aprendi a ler e a escrever.”

Na EJA da Escola Municipal Padre Sebastião Tirino, no Centro de Sabará, ele cursa a quarta série e só tem elogios para a professora Fernanda Sueli, a quem considera competente e paciente. “Ela é ótima. Se a gente não entende, explica tudo de novo. Nasceu para ser professora, está sempre disposta a ajudar”, testemunha Sebastião.

Visão social com amor pelo ensino

Em Belo Horizonte, há 348 professores para 6,8 mil alunos matriculados nos cursos de Educação de Jovens e Adultos (EJA), de acordo com a Secretaria Municipal de Educação, e uma unidade, a Escola Municipal Caio Líbano Soares, no Bairro Santo Antônio, na Região Centro-Sul, com atendimento exclusivo nessa modalidade. Entre os docentes da unidade está Gleidston Alis, graduado em letras na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com doutorado em estudos literários e pós-doutorado nessa área do conhecimento.

Casado, nascido em Betim e morador de Contagem, na Região Metropolitana de BH, Gleidston leciona nos ensinos médio e fundamental na Caio Líbano Soares, para alunos de 15 a 70 anos, e diz que está na função por escolha e oportunidade. “Vivemos em um país marcado por desigualdades históricas, então dou minha contribuição para diminuir esse quadro. Muitos jovens e adultos brasileiros saíram da escola por necessidade, não porque quiseram.”

Na sala de aula, Gleidston encontra uma grande riqueza em relatos pessoais, os quais podem ser aproveitados no planejamento. “É como se eu puxasse um fio de histórias... E elas chegam com detalhes, carregadas de experiência de vida, levando a uma troca produtiva. Além disso, os mais jovens têm uma dinâmica que estimula os alunos mais velhos.”

As palavras do professor traduzem um grande amor pela educação. “Trabalho em escola pública também em Betim, na Escola Municipal Osório Aleixo da Silva, onde leciono língua portuguesa. Sei que os professores são agentes de transformação da sociedade, e fico muito feliz quando encontro ex-alunos, uns que estão na escola técnica, outros já cursando faculdade e até morando no exterior. Vejo, mais do que nunca, como podemos abrir portas para um novo mundo, com perspectivas e horizontes.”

Boas-vindas para um novo futuro

Com uma proposta pedagógica baseada na pluralidade e na riqueza das vivências dos estudantes, a Escola Municipal Caio Líbano Soares, que funciona no antigo prédio da Fafich/UFMG, está sempre de portas abertas, diz o professor Gleidston. “Tudo é oferecido gratuitamente aos cidadãos como um direito constitucional. A cidade tem uma enorme demanda de pessoas que precisam do serviço prestado pela escola, e, muitas vezes, não têm essas informação.”

No convite aos jovens e adultos, Gleidston avisa que a escola tem vagas abertas para a EJA durante todo o ano. Os interessados podem ligar para o telefone (31) 3277-8590 ou ir à Rua Carangola, 288, 5º andar, no Bairro Santo Antônio, na Região Centro-Sul de BH.  
 
Gleidston Alis
%u201CVivemos em um país marcado por desigualdades históricas. Muitos jovens e adultos saíram da escola por necessidade, não porque quiseram%u201D Gleidston Alis, É graduado em letras na UFMG, com doutorado e pós-doutorado em estudos literários (foto: Marcos Vieira /EM/DA. Press)
 

Reportagem especial

Em homenagem à Semana do Professor, o Estado de Minas publica desde domingo (8/10) série especial que mostra histórias e desafios enfrentados pelo profissional que é responsável não só pela formação de todos os profissionais, mas também, em muitos casos, por ser um suporte essencial às famílias de crianças e adolescentes.

A primeira reportagem mostrou a situação atual da educação infantil em Janaúba, Norte de Minas, cidade marcada pelo heroísmo da educadora Helley de Abreu, que morreu tentando salvar alunos de incêndio criminoso na Creche Gente Inocente, em 5 de outubro de 2017.

No segundo dia, o EM revelou a dedicação de mestres que cresceram em comunidades carentes e, formados, se dedicaram a ajudar a transformar a realidade de alunos que enfrentam condição semelhante. 

6,8 mil 

alunos estão matriculados nos cursos de Educação de Jovens e Adultos em Belo Horizonte

348

educadores atuam em BH em turmas dedicadas ao ensino de alunos mais velhos

 


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