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Estado de Minas PATRIMÔNIO

Fechada por 15 anos, Casa dos Cacos é reaberta em Contagem

Espaço cultural chama atenção por ser todo revestido com coleção de pedaços de louças e cerâmicas


27/08/2022 04:00 - atualizado 26/08/2022 19:42

Fachada da Casa dos Cacos
Imóvel foi comprado pela prefeitura em 1991 e tombado como patrimônio histórico e cultural em 2020 (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
 
Durante duas décadas, pequenos pedaços de louças e cerâmica se juntaram e formaram uma moradia inusitada, que posteriormente se tornaria patrimônio com arquitetura própria. Depois de obras de reestruturação, o casarão ganhará nova vida e retomará sua característica original. Construído a partir de 1963 e fechado por 15 anos por problemas estruturais, o Museu Casa dos Cacos finalmente será reaberto ao público hoje (27/8), no Bairro Bernardo Monteiro, em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A restauração, que custou R$ 2,4 milhões aos cofres do município, vai contribuir para o resgate de uma antiga tradição cultural local.
 
A iniciativa de construir a casa foi do geólogo Carlos Luís de Almeida, natural de Juiz de Fora, mas que passou grande parte de sua vida em Belo Horizonte. Ao comprar o imóvel na década de 1960, quis transformá-lo numa espécie de casa de campo para passar os fins de semanas. Sempre que visitava o local, ele ampliava o espaço com novos fragmentos, em cômodos distintos. A casa tomou a atual forma em 1989, ano da morte do geólogo. O imóvel foi comprado pela prefeitura dois anos depois e tombado como patrimônio histórico e cultural em 2020.

“Nos anos 1960, não havia tantas casas em Contagem. Era um ambiente tipicamente rural. Ele morava no Carlos Prates e vinha de trem até o Bernardo Monteiro com saquinhos de cacos para construir a casa. O que era só para ser um banheiro, um banco, ele transformou todo o espaço, buscando nova criatividade”, conta Lúcio Honorato, artista e assistente da Secretaria Municipal de Cultura de Contagem.
 
Ver galeria . 13 Fotos Detalhe do Museu Casa dos Cacos, em Contagem, que reabre as portas após restauraçãoGladyston Rodrigues/EM/D.A Press
Detalhe do Museu Casa dos Cacos, em Contagem, que reabre as portas após restauração (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press )
 
A ideia ganhou forma com o passar do tempo. As peças formam diversos mosaicos nas paredes do imóvel, dando origem às esculturas de cachorros, cabras e a curiosa elefanta chamada de "Fifi". No banheiro da casa, nas toalhas, vaso sanitário, pia e no porta-papel higiênico são reproduzidos cacos. Quartos, sala, cama, televisão, rádio, mesa de jantar também são revestidos pelos fragmentos.

Na sala de jantar, a mesa e o telefone são cobertos com pedaços de vidros de várias cores. Toda a calçada e os móveis são formados por fragmentos de cerâmica. Do lado de fora, Carlos construiu uma escultura da Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida, em Brasília.

Todo visitante que vai ao local sempre interroga: quantos cacos existem ao todo? As crianças são as mais curiosas. A resposta é desconhecida. “Uma vez, o Carlos disse que era a pergunta que mais se fazia. Todo mundo queria saber quantas peças havia, mas ele não falava. Logo, brincava que a quantidade era infinita e incontável”, diz Honorato. “Nos restaurantes ou cafés, o Carlos sempre quebrava um prato ou xícara de propósito para pegar os cacos para levá-lo para casa”, complementa.

Alguns materiais usados para remodelar a casa seriam do Palácio do Planalto, doados por Lucy Geisel, casada com o ex-presidente Ernesto Geisel, que governou o Brasil no período da Ditadura Militar (de 1974 a 1979). O proprietário do extinto Café Pérola, na Praça Sete, em BH, também foi um dos fornecedores de cacos. Quadros do também ex-presidente Juscelino Kubitschek e do empresário Silvio Santos, dos quais o geólogo era fã, enfeitam as paredes da Casa dos Cacos. Imagens do local foram exibidas no programa do Chacrinha, da Rede Globo, nos anos 1980.

Meses antes de morrer num acidente automobilístico, em agosto de 1976, Kubitschek visitou a casa e deixou uma mensagem ao construtor e decorador. "Meu caro amigo Carlos, ao visitar a sua Casa de Cacos, quando aí passei, galvanizou-me o coração sentimental e a alma tornou-se imensamente inefável pela elevada beleza inaudita que veio estuar-me e encantar-me, deixando-me profundamente sensibilizado".
 
Enquanto esteve aberto, o museu recebia em torno de 300 visitantes por mês. Desde seu fechamento, o espaço teve diversas promessas de reformas, mas nada havia sido concretizado. Em meados de 2014, uma empresa chegou a ser contratada para dar início à restauração, mas a falta de dinheiro fez com que o projeto fosse paralisado. Os recursos só foram garantidos a partir do ICMS Cultural repassado posteriormente aos municípios.

Pioneirismo no país

 
A Casa dos Cacos é a única em sua tipologia no Brasil. A construção é considerada pioneira do gênero no país e equiparada à Capela de Ossos, na Igreja de São Francisco, em Évora, Portugal, e às criações do arquiteto espanhol Antoni Gaudí (1852-1926).

Em 2020, o documentário Contagem do Tempo, produzido pela Associação Move Cultura, mostrou parte do patrimônio da cidade, inclusive a situação do abandono da Casa dos Cacos.
 
O produtor cultural e mestre em ciências sociais Rafael Aquino, que produziu o filme, comemora a restauração do espaço: “É um ganho muito importante para Contagem. A cidade ainda é carente quanto à preservação de seu patrimônio. Hoje, ele é infelizmente ignorado. Nossa arte deixou de existir ou é mal preservada. Que essa restauração sirva de estímulo para a preservação de outros bens do município”.


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