

O antigo prédio incendiado foi demolido. Em seu lugar, com recursos de doações de um grupo de empresários, foi erguido um novo centro de educação infantil. A nova creche recebeu o nome da professora Heley de Abreu Silva Batista, que morreu como heroína, depois de atuar para salvar as crianças no meio das chamas. Ela também lutou com o vigia Damião para tentar impedir a tragédia.
Por meio de uma ação coletiva por danos morais e materiais, a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) busca um acordo com a Municipalidade para reparação aos danos provocados às vítimas. O defensor público Gustavo Dayrell, que atua no caso em Janaúba, afirma que as famílias das vítimas, todas de baixa renda, enfrentam uma situação preocupante porque o dinheiro recebido por meio de doações está chegando ao fim.
Os recursos, administrados pela Associação dos Familiares das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia Gente Inocente de Janaúba (AVTJana), são destinados ao pagamento de consultas médicas e medicamentos usados pelas vítimas. Ao todo, segundo a Defensoria Pública, foram transferidos para a associação em torno de R$ 400 mil das doações, vindas de todo o país, por ocasião do triste acontecimento, que teve repercussão internacional.
“Passaram quatro anos. A ação está tramitando na Justiça. O dinheiro da Associação está chegando ao fim. Se não for feito o acordo o final ou, pelo menos, garantida a renovação do acordo parcial, as famílias vão ficar desamparadas”, alerta o defensor público.
Segundo Dayrell, diante da complexidade da ação, a Defensoria Pública luta para viabilizar um acordo com a municipalidade e evitar o desamparo das vítimas e de suas famílias. “A Defensoria Pública busca, de preferência, um acordo final para dar segurança aos familiares e para que eles possam receber a indenização mais rapidamente”, explica Dayrell. Ele ressalta que neste último ano apenas foi realizado o pagamento mensal referente à antecipação parcial das verbas indenizatórias, com desembolso pela prefeitura local para as famílias atingidas nos valores de R$ 500 e R$ 1 mil, a depender da situação de saúde de cada uma.
A antecipação, que findaria em dezembro de 2018 e tem sido renovada anualmente, é resultado de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado pelo município após o ajuizamento da Ação Civil Pública da Defensoria Pública.
E até mesmo essa antecipação não está garantida. “Esse acordo parcial tem sido renovado anualmente, mas não foi definido o valor total nem por quanto tempo. Todos os anos, os familiares sofrem a angústia da incerteza da renovação”, explica Dayrell.
Desta forma, ressalta o representante da Defensoria Pública, as famílias não sabem quanto ainda vão receber nem quando o valor deverá ser desembolsado pela Municipalidade. “Esse é o ponto. Teria que fazer um acordo final para saber quanto será devido a cada um. Do valor total devido, se faria o abatimento do que já foi pago a título de adiantamento. A Defensoria propôs à prefeitura acordo pra estipulação do valor definitivo, mas não houve resposta”, informa Dayrell. “Não havendo um acordo final, a Defensoria entende ser imprescindível ao menos a renovação do acordo de antecipação parcial da indenização”, acrescenta.
Dayrell explica ainda que as ações judiciais são contra o município porque o autor do ataque à antiga creche era servidor (vigia) municipal. “Por essa razão, a lei atribui ao município o dever indenizatório, independentemente de prova de culpa”, pontua.
“A situação demanda urgência. Há receio de que o acordo parcial, que hoje permite o pagamento da antecipação parcial da indenização, não seja renovado para o próximo ano”, acrescenta o defensor.
A Defensoria Pública de Minas Gerais acompanha o drama das famílias das vítimas desde a tragédia. Além do processo coletivo por indenizações, o órgão é autor de três ações individuais. Uma delas, para o fornecimento de medicações, foi deferida liminarmente e o poder público está arcando com o tratamento. Outra, de indenização por danos morais sofridos por um pai que perdeu o filho no incêndio, também obteve êxito. Porém, a prefeitura interpôs recurso e a decisão ainda não saiu. Também aguarda julgamento a terceira ação, que pede a reparação para um pedreiro que no momento do incêndio estava trabalhando na frente da creche e, ao entrar para salvar as crianças, sofreu queimaduras.
O que diz a prefeitura
Por meio de nota, a Prefeitura de Janaúba informou que efetua normalmente o pagamento da antecipação indenizatória às famílias das vítimas do incêndio na Creche Gente Inocente. A Municipalidade comunicou que já pagou aproximadamente R$ 2,5 milhões de antecipação de indenização para 70 famílias das vítimas da tragédia.Segundo a prefeitura, os pagamentos são feitos em cumprimento ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público Estadual (MPMG) todo início de mês, em valores que variam de R$$ 545,45 a R$ 1.090,90 por família.
“A atual gestão teve que remanejar a quantia de aproximadamente R$ 720 mil do orçamento da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos justamente para pagar essa antecipação indenizatória, uma vez que no orçamento do município de 2021, elaborado pela gestão anterior, não constava essa dotação orçamentária específica”, informa a nota da administração municipal.
A prefeitura informa ainda, além de ter criado uma comissão especial para avaliar e acompanhar as condições atuais das famílias, “analisa a proposta apresentada pela Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais com relação à definição dos valores de indenização e o abatimento do que já foi antecipado” e que “as tratativas estão bem adiantadas”.