Jornal Estado de Minas

COVID-19

Nem vacina alivia sufoco nos hospitais de Minas Gerais

 

Ouro Preto – A Região dos Inconfidentes, onde foram dados os primeiros gritos de liberdade para dias melhores, hoje está sufocada pela dor das 115 mortes por COVID-19 nas cidades de Ouro Preto, Mariana e Itabirito. Nos últimos 10 dias famílias enterraram 23 pessoas. Na luta por salvar vidas, o gerente assistencial da Santa Casa de Ouro Preto, Leandro Leonardo de Assis, pede atenção para a situação que os profissionais da linha de frente enfrentam no combate à COVID-19. Na Santa Casa de Ouro Preto, polo de atendimento das cidades, a taxa de leitos de UTI para COVID-19 está em 100% de ocupação desde 28 de dezembro e de enfermaria, segundo boletim atualizado em 21 de janeiro, está com 100% ocupação.





 

Esses números se refletem na vida dos profissionais da saúde que hoje trabalham nos 10 leitos de UTIs da instituição e a chegada da vacina foi vista como uma brisa em tempos sufocantes. “Foi muito emocionante participar dessa conquista da ciência. Sermos o primeiro local, em Ouro Preto, a receber o lote da vacina demonstra o respeito com a Irmandade de Sant'Ana e o reconhecimento dos trabalhos que vêm sendo feitos na Santa Casa”, diz o gerente assistencial.

 

Mas passada a alegria das primeiras pessoas vacinadas, a realidade ainda é preocupante. De acordo com Leandro Leonardo, o quantitativo de vacinas que chegaram é insuficiente para atender toda a demanda do hospital. Foram entregues, na terça-feira (19), 200 vacinas. “Priorizamos aqueles que atuam na UTI e Pronto Atendimento do Hospital, pois essa foi a recomendação do município. No entanto, nossa demanda geral, incluindo os setores administrativos, é de 585 pessoas que precisam ser imunizadas.”

 

Mesmo com a chegada do imunizante, Leandro de Assis vê dias difíceis pela frente: "O cenário atual é muito tenso" (foto: Arquivo pessoal)

 

Com a imunização ainda fora do alcance da maioria da população e até dos colegas da área, o enfermeiro, que hoje está entre as lideranças da instituição, vê com preocupação os avanços da doença. Casado e pai de dois filhos, o gerente assistencial da Santa Casa, afirma que a invisibilidade e a falta de reconhecimento e de envolvimento por parte da população têm dificultado o combate à pandemia. “Quando todo mundo precisou parar, só nós não paramos. É uma realidade que ninguém entende que no dia a dia, a gente luta para manter o melhor. É o tempo todo correndo atrás. Aí, muitas vezes, temos profissionais desmotivados por não verem um entendimento da população de que a luta para dias melhores é de todos”.





 

Para atender os 10 leitos da UTI COVID-19 são necessários cerca de 70 profissionais da saúde, entre eles 14 médicos, quatro enfermeiros de nível superior, 30 profissionais técnicos de enfermagem, seis fisioterapeutas, seis nutricionistas. Segundo Assis, o empenho da equipe e a dedicação dos profissionais durante quase um ano de linha de frente na pandemia são fundamentais para que muitas vidas possam ser salvas, mas, por outro lado, pessoas que poderiam ser lideranças em suas comunidades, no sentido de orientar e envolver, não têm feito esse papel, pelo contrário, muitos negam a gravidade”.

 

“Independente de política, de qual forma de liderança que a pessoa exerça, é necessário o envolvimento. Se a pessoa tiver oportunidade de envolver e orientar outras pessoas, ela já estará fazendo essa liderança e vai contribuir de alguma forma. Não é uma questão de política partidária, o envolvimento está relacionado a uma conscientização social e pessoal”.

 

O gerente assistencial da Santa Casa conta que a saúde mental de muitos profissionais da instituição ficou comprometida ao longo desse quase um ano de pandemia. O hospital trabalha em regime de contratação por CLT e por não poder se licenciar, muitos profissionais da linha de frente pediram demissão alegando esgotamento físico e emocional.





 

“O cenário atual é muito tenso porque quando surgiu a pandemia os profissionais esperavam um período curto de intensificação das medidas de cuidado de proteção, em torno de dois, três meses e já estamos há quase um ano. E o que vemos hoje nos profissionais é um desgaste físico e emocional muito grande pela extensão do problema. Hoje a nossa dificuldade é achar e manter profissionais qualificados, continuando na garantia de assistência de qualidade aos pacientes”, analisa.

 

Leandro afirma que dentro da Santa Casa de Ouro Preto há cuidados em relação à saúde mental da equipe. “Dentro do nosso recursos humanos temos profissionais para nos atender. Dentro do hospital tem um grupo de quatro psicólogos que atendem tanto quem está internado, quanto a equipe de saúde”. Mas mesmo assim, a vida pessoal dos profissionais fica comprometida. O próprio gerente sente a falta do abraço do filho, de 15 anos. Por morar em outra cidade, as visitas ao pai foram reduzidas desde o início da pandemia e quando os dois se encontram é sempre com distanciamento.

 

O gerente conta que esse sacrifício foi notado em outros membros da equipe de saúde e um deles, para evitar contato com familiar do grupo de risco, chegou a entrar em casa pulando a janela do quarto, dormir, e no dia seguinte sair de casa pulando pela janela novamente. “Começamos a sentir o preconceito por sermos profissionais da linha de frente. A mesma sociedade que aglomera se isola da gente por sermos fontes de possível transmissão. Na verdade é o contrário, por sabermos da seriedade da doença, somos os mais prevenidos, justamente por estarmos na linha de frente dessa guerra ao vírus”.





 

INFLAÇÃO Outro desafio enfrentado pelos hospitais que atendem pacientes com COVID-19 foi o aumento de preços e falta de produtos. Enquanto em alguns países houve medidas para conter a inflação de medicamentos e equipamentos necessários no combate à COVID-19, o que foi visto, desde o início no Brasil foram aumentos em alguns produtos, que chegaram a 900%.

 

De acordo com o gerente assistencial da Santa Casa, sedativos que antes da pandemia custavam R$9,00, no período crítico de junho, julho, agosto chegaram a R$90,00. “No início, tivemos muita dificuldade em adquirir os equipamentos de proteção individual para os nossos funcionários mais foi o mercado que se fechou para todos os serviços, a dificuldade para a compra de máscaras, os capotes impermeáveis e tivemos que adotar estratégias como por exemplo, as nossas costureiras produzirem os capotes”.

 

Hoje a maior dificuldade, segundo o gerente, é a inflação de demanda. “Vemos muitos produtos inflacionados como por exemplo a máscara cirúrgica que comprávamos a R$ 0,13 a unidade e hoje custa em média R$ 2,00. Os valores deram uma melhorada em outubro, novembro e agora em janeiro já percebo uma nova inflação, tem medicamentos que já estamo,s com dificuldade de comprar, como relaxantes musculares”.





 

Depoimentos

(foto: Arquivo pessoal)
 

Chamado à consciência 

Cíntia Martins Aguiar,enfermeira intensivista do Hospital Municipal de Governador Valadares

 

“Sou enfermeira pós-graduada em terapia intensiva adulto e resolvi me especializar porque senti em meu coração a necessidade de cuidar das pessoas gravemente enfermas. A pandemia do novo coronavírus aguçou minha sensibilidade, por perceber o medo e a insegurança nos olhos dos pacientes quando ainda estão conscientes antes da intubação.

 

A sensação de impotência e angústia me faz refletir sobre a fragilidade e brevidade de nossa existência. Em muitos casos, os pacientes já estão com comprometimentos mais graves e aceitam facilmente a intubação, porque não aguentam mais, estão no limite por não conseguir respirar. Eles chegam ansiosos e com medo de morrer. Ficam sem acompanhante, sem visita e sem o apoio familiar. Muitas vezes, nós somos o apoio.

 

O vírus é altamente contagioso. Essa é a mensagem que eu gostaria de deixar para toda a população. Famílias chorando na porta da UTI, gritos de dor e desespero estão virando rotina. É preciso lembrar que os doentes precisam do meu cuidado, da minha calma e serenidade. Estamos com o físico e o emocional muito sobrecarregados. Tenho compromisso com a vida! Preciso me cuidar para cuidar das pessoas.





 

Neste período de vigência da onda vermelha, gostaria que as pessoas se conscientizassem da importância de manter o isolamento. Temos de evitar as aglomerações, e assim, não colocar em risco as pessoas mais vulneráveis. Ficar em casa não é só se isolar; é uma atitude de empatia e proteção aos mais frágeis. É ilusão pensarmos que pessoas jovens não terão problemas. Cada vez mais, temos pacientes jovens acometidos pela COVID-19 e com agravamentos significativos.

 

Não é só sobre ‘pegar’ é sobre também transmitir! É sobre respeito aos mais vulneráveis! Sobre não superlotar os hospitais! Sobre não devastar o sistema de saúde e respeitar os profissionais que ali trabalham! Conscientizem-se! Recolham-se!

 

A chegada da vacina contra a COVID-19 e início da imunização da linha de frente trouxeram esperança para a população, principalmente para os profissionais de enfermagem. Fui vacinada no dia 20 com a CoronaVac, produzida pela empresa Sinovac e o Instituto Butantan. E quero deixar claro que a vacina é a melhor forma de prevenção de muitas doenças e, com certeza, será para a COVID-19.

 

A vacinação está entre as maiores conquistas em saúde pública no mundo e hoje, o Brasil passa por um momento de grande avanço. Foi dado o primeiro passo para a maior campanha de vacinação no mundo contra o novo coronavírus.”





 

(foto: Arquivo pessoal)
 

Exposição estressante

 

Juliana Carpanez, técnica de enfermagem do Hospital de Pronto-Socorro Dr. Mozart Teixeira, em Juiz de fora

 

“Apesar de não trabalhar direto no setor de COVID-19, a gente recebe pacientes com traumas e quando vamos ver, ele testou positivo. É muita insegurança, essa é a palavra-chave. Porque você fica exposta, preocupada. Quando a gente trabalha direto com pacientes COVID-19, já sabe e usa os equipamentos certos. A pressão psicológica é muita, você está o tempo todo exposto. Eu me contaminei em agosto e é muito ruim. Passei muito mal. A cada sintoma diferente, mais preocupada a gente fica. A exaustão física é muita também, porque muitos profissionais foram afastados por serem idosos, grupo de risco. Então, a sobrecarga de trabalho é muito grande, com muitos plantões extras.”

 

 

(foto: Arquivo pessoal)

Trabalho dobrado

 

Anderson Leandro, de 40 anos, enfermeiro do Hospital João Penido, em Juiz de Fora

 

“É cansativo, estressante, a gente tenta não demonstrar, mas fica com falta de paciência, passa a comer mais. Tem o estresse do trabalho, mais o isolamento em casa, porque a gente não sai mais. E quando um colega falta ao trabalho, se estou disponível, vou cobrir o horário e dobro. Já fui trabalhar 12 horas, mas um colega teve problemas de saúde e trabalhei mais 12. Topo esse desafio de trabalhar 24 horas porque, graças à minha chefia, depois consigo encaixar as folgas. Vejo que várias pessoas internadas agora estavam fazendo isolamento mas, no final de ano, alguém foi fazer uma visita, um filho, sobrinho. A consequência vem agora. Tem muito paciente que chega conversando, em pé, e, em menos de 36 horas já está intubado à beira da morte.” 

O que é o coronavírus


Coronavírus são uma grande família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus (COVID-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doença pode causar infecções com sintomas inicialmente semelhantes aos resfriados ou gripes leves, mas com risco de se agravarem, podendo resultar em morte.
Vídeo: Por que você não deve espalhar tudo que recebe no Whatsapp

Como a COVID-19 é transmitida? 

A transmissão dos coronavírus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secreções contaminadas, como gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal próximo, como toque ou aperto de mão, contato com objetos ou superfícies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.



Vídeo: Pessoas sem sintomas transmitem o coronavírus?


Como se prevenir?

A recomendação é evitar aglomerações, ficar longe de quem apresenta sintomas de infecção respiratória, lavar as mãos com frequência, tossir com o antebraço em frente à boca e frequentemente fazer o uso de água e sabão para lavar as mãos ou álcool em gel após ter contato com superfícies e pessoas. Em casa, tome cuidados extras contra a COVID-19.
Vídeo: Flexibilização do isolamento não é 'liberou geral'; saiba por quê

Quais os sintomas do coronavírus?

Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:

Em casos graves, as vítimas apresentam:

Os tipos de sintomas para COVID-19 aumentam a cada semana conforme os pesquisadores avançam na identificação do comportamento do vírus. 

Vídeo explica por que você deve 'aprender a tossir'


Mitos e verdades sobre o vírus

Nas redes sociais, a propagação da COVID-19 espalhou também boatos sobre como o vírus Sars-CoV-2 é transmitido. E outras dúvidas foram surgindo: O álcool em gel é capaz de matar o vírus? O coronavírus é letal em um nível preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar várias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS não teria condições de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um médico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronavírus.



Coronavírus e atividades ao ar livre: vídeo mostra o que diz a ciência

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