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Estado de Minas PRECONCEITO

Montes Claros: inocentado, rapaz negro fica preso quase dois anos por crime

Absolvido em juri popular, jovem foi vítima de racismo estrutural e considerado suspeito de crime por ser negro, segundo a Defensoria Pública


01/12/2020 16:23 - atualizado 01/12/2020 17:50

Defensor publico Cantídio Filho (foto: Arquivo pessoal)
Defensor publico Cantídio Filho (foto: Arquivo pessoal)
Absolvido em júri popular, o jovem L.B.C, de 26 anos, ficou quase dois anos preso, acusado de crimes de tentativa e homicídio consumado. Os jurados reconheceram que ele é inocente e que foi confundido com o verdadeiro autor dos crimes, seguindo o argumento da defesa. Para o defensor público Cantídio Dias de Freitas Filho, que atuou no caso, o rapaz, que é negro, foi acusado injustamente e ficou preso por um crime que não cometeu por causa do racismo estrutural.


 

“o caso é emblemático e espelha o racismo estrutural e institucional que assola o nosso país e escancara os preconceitos e estereótipos enfrentados pela população negra”, afirma Cantídio Filho. Depois de um ano e oito meses preso, o rapaz foi liberado em 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.

 

Entenda o caso

 

De acordo com o processo judicial, no dia 30 de março de 2013, um homem foi morto a tiros, na porta de sua casa, no Bairro Independência, em Montes Claros. Horas antes, a vítima tinha dito para a Polícia Militar que, no mesmo dia, tinha sofrido tentativa de homicídio a tiros.

 

De acordo com o boletim de ocorrência, a vitima apontou que suspeitos do disparo seriam um indivíduo negro, alto, que trajava uma blusa preta com listras brancas e um boné preto; e um indivíduo branco, baixo, magro, cabelos loiros, que trajava uma blusa preta e bermuda. Ainda segundo o processo, duas horas depois do registro do BO, o autor, em companhia de comparsas, voltou ao local, subiu no muro e alvejou a vitima, que morreu em decorrência dos disparos.

 

Uma denúncia anônima, feita por meio do Disque 190, dava conta de que os envolvidos no crime estariam na esquina da casa da vítima. De acordo com a defesa, no dia do crime, o jovem L. estava em um churrasco com amigos e, após ouvir os tiros, se dirigiu à esquina da rua da casa da vítima para observar a movimentação e a aglomeração que se formou no local, quando, foi abordado por policiais que afirmaram que o jovem possuía as mesmas características indicadas pela denúncia anônima.

 

No momento da abordagem, o rapaz trajava blusa vermelha e não estava de boné e, mesmo alegando não ter nenhuma ligação com os acontecimentos, foi conduzido à delegacia, onde permaneceu por cerca de sete horas. 

 

De acordo com o defensor publico, o loiro também negou a autoria do crime não chegou a ser processado. Já em relação ao jovem negro, o desfecho foi outro, com ele sendo preso e processado, mesmo alegando inocência. Ainda segundo a  defesa, o rapaz se mudou para São Paulo e um oficial de justiça foi ao e endereço do jovem, uma casa simples, em um bairro da Capital Paulista. Mas, como não foi encontrado, foi considerado foragido e o juiz decretou a prisão preventiva dele para garantir a aplicação da lei penal. 

 

Ele acabou sendo preso em 6 de fevereiro de 2019, quando se encontrava no Parque do Ibirapuera (Zona Sul de São Paulo), em companhia da companheira e do filho de quatro anos. Logo em seguida, foi transferido para o Norte de Minas e ficou recolhido no Presídio Regional de Montes Claros, de onde so saiu no dia 20 de novembro, um dia após a absolvição no julgamento. O verdadeiro autor do crime até hoje não foi identificado.   

 

Engano

 

De acordo om o defensor público Cantídio Filho, durante a sessão do júri, um dos policiais que atendeu a ocorrência por ocasião do homicídio, contradizendo a versão inicialmente apresentada por outros policiais, afirmou que L. não possuía as características apontadas pela vítima e pela denúncia anônima. Também foi ouvida uma testemunha que estava com o rapaz no dia dos fatos e presenciou o momento em que ele se dirigiu à esquina da casa da vítima.

 

Ainda no plenário do Tribunal do Júri, o jovem afirmou que acreditava ter sido escolhido “aleatoriamente” pelos policiais como suspeito dos crimes simplesmente por “ser negro”.

 

Durante o julgamento, Cantídio Filho abordou, entre outras questões, o “Black Lives Matter, movimento ativista internacional, com origem na comunidade afro-americana, que campanha contra a violência direcionada às pessoas negras. 

 

“Trata-se de um movimento importantíssimo despertou a consciência jurídica nos Estados Unidos e se espraiou por todo mundo”, disse.

 

O defensor público afirma que o rapaz foi acusado e ficou preso injustamente “por causa da cor da dele”. “O réu foi abordado com base na descrição da cor da pele e da vestimenta. Ocorre que a vestimenta não batia (no dia dos fatos) - há foto no processo que demonstra a disparidade com a descrição. O réu estava com outras pessoas, mas foi abordado porque na denúncia via Copom, descreveram que se tratava de um negro com determinada roupa, e de um loiro com determinada roupa”, relata. 

 

 “Na hora da abordagem, acharam um loiro que estava perto, e que correu da polícia, e acharam o negro que estava em uma esquina com outra pessoas, e que não correu. Prenderam ambos sem mandado, e sem flagrante. O loiro afirmou na audiência que não foi processado por aquilo, enquanto o negro, que desde o início, colaborou na abordagem do dia dos fatos (que foi ilícita), e que compareceu na delegacia todas as vezes, foi processado por três delitos”, lamenta Cantídio Filho. 

 

 Ainda de acordo com o defensor público, além de ter sido preso injustamente,pao ser confundido com o autor do crime, o jovem, que é autônomo, enfrenta outro drama agora: a dificuldade para arrumar um emprego.


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