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Estado de Minas

Impasse sobre o anexo do Iate chega à Justiça

Em ação contra o clube e a prefeitura, MP pede demolição da área em 180 dias. Medida foi recomendada pela Unesco ao conceder título de patrimônio mundial ao conjunto moderno da Pampulha


postado em 04/09/2019 06:00 / atualizado em 04/09/2019 07:29

Vista do Iate com o anexo: ação estipula prazo de 30 dias para o clube apresentar projeto técnico de demolição da construção(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press - 11/07/19)
Vista do Iate com o anexo: ação estipula prazo de 30 dias para o clube apresentar projeto técnico de demolição da construção (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press - 11/07/19)


O longo impasse sobre o anexo do Iate Tênis Clube, ícone do conjunto moderno da Pampulha reconhecido como patrimônio da humanidade, chega aos tribunais. Em ação, com pedido de liminar, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) contra o clube particular e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), o promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico da comarca, Júlio César Luciano, pede que seja demolida a construção “irregular, feita sem autorização e alvará”, onde funcionam academia de ginástica, estacionamento e salão de evento. O prazo solicitado é de 180 dias, a partir da notificação, com multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento.

Já no prazo de 30 dias, a direção do clube deverá apresentar à PBH um projeto técnico sobre a demolição do anexo, elaborado com assessoria especializada e aprovado em várias instâncias responsáveis pelo tombamento do prédio – Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município, Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em 17 de julho, foram lembrados os três anos de elevação do conjunto moderno da Pampulha, na capital, a Patrimônio da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Conforme a ação datada de 19 de agosto e em tramitação na 3ª Vara de Fazenda de BH, a prefeitura, especificamente, terá que apresentar, em 30 dias, ao Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco, relatório e documentação detalhada sobre as ações e projetos apresentados no Plano de Intervenção para o Iate Tênis Clube e compõem o Plano de Gestão e Monitoramento do conjunto moderno. No relatório, deverão constar cronograma de execução de intervenções e informação atualizada sobre o estado de conservação da edificação projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), com jardins do paisagista Burle Marx (1909-1994) e obras de Cândido Portinari (1903-1962), cujo nome batiza um salão interno.

Jardins projetados por Burle Marx: recuperação é uma das medidas previstas(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press - 31/7/19)
Jardins projetados por Burle Marx: recuperação é uma das medidas previstas (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press - 31/7/19)


Em caso de condenação pela Justiça, será estipulada multa ao clube e à PBH por danos coletivos devido à não demolição do anexo. De acordo com o MPMG, há uma série de providências a serem tomadas em benefício do patrimônio cultural, como recuperação dos jardins projetados por Burle Marx, restauro do salão Portinari (retirada dos lambris metálicos dos pilares internos, recuperação do revestimento original em mármore, reconstrução da escada de acesso ao local, conforme o projeto original, recolocação do mural O Esporte, de Roberto Burle Marx), recuperação do perfil das margens da lagoa e tratamento vegetal das margens como área de transição entre água e as demais dependências do clube.

Questão crucial


A demolição do anexo que muitos chamam de “puxadinho do Iate” se tornou uma questão crucial no período pré e pós-concessão do título da Unesco para o complexo arquitetônico projetado por Niemeyer, na década de 1940, em torno do espelho d'água, e com outros ícones: Igreja São Francisco de Assis, Casa do Baile, atual Centro de Referência de Urbanismo, Arquitetura e do Design, e Museu de Arte da Pampulha (MAP).

Com área de 4 mil metros quadrados e erguido entre 1977 e 1984, o anexo teve a demolição recomendada pela Unesco. Antes da conquista do título – em 17 de julho de 2016, durante a 40ª reunião do Comitê de Patrimônio Mundial da Unesco, em Istambul, na Turquia –, houve compromisso da PBH em resolver as pendências. E o principal: no período de três anos, deveria ser demolido o anexo do Iate, recomendação que constava do relatório final da ONU enviado, via Itamaraty, à PBH e à Fundação Municipal de Cultura (FMC).

Em entrevista ao Estado de Minas, quando se completaram três anos da chancela da Unesco, o promotor de Justiça Júlio César Luciano ressaltou que “não se pode permitir algo que coloque em risco um título como esse”. Ele informou que, depois de longa negociação, não prosperou um acordo judicial que poderia resolver essa e outras pendências na Pampulha.

O presidente do Iate Tênis Clube, José Carlos Paranhos de Araújo, explicou, ontem, que está se inteirando dos fatos para, então, divulgar uma posição. A PBH, via Fundação Municipal de Cultura, informa que ainda não foi notificada sobre a ação do MPMG.

Rima sonora


O antigo Iate Golfe Clube tem a forma de um barco ancorado, visão que fica melhor ainda do MAP, localizado do outro lado do espelho d’água da Pampulha. No interior do clube, dá para ver o mastro da embarcação e a caldeira, e, ao caminhar pelo jardins, logo perto da entrada, o visitante vai encontrar um busto de Juscelino Kubitschek (1902-1976), que era prefeito de BH quando o Iate foi construído. Na peça de bronze há uma frase de JK: “A Pampulha veio como uma rima sonora, da beleza e harmonia ao poema da cidade”.

Ao chegar ao Iate, inaugurado em 1943 com um baile de gala, deve-se prestar atenção a alguns detalhes que fizeram a diferença, em termos de inovação, na arquitetura desenvolvida no Brasil e no mundo naqueles tempos. Niemeyer fez ali a cobertura em forma de “asa de borboleta em pleno voo”, conforme o coordenador técnico do dossiê apresentado à Unesco, arquiteto Flávio Carsalade. Em seu livro Pampulha, da série BH. A cidade de cada um, Carsalade escreveu que “o Iate fora construído para aproveitar as novidades náuticas que aqui se abriam; afinal, remar no Parque Municipal não era exatamente o máximo em esportes náuticos. A ideia para o Yatch Golf Club era aproveitar a lagoa para esse tipo de esporte (seu primeiro andar fora projetado para isso e o segundo andar para festas”.

Os especialistas chamam a atenção para o fato de a edificação se harmonizar plasticamente debruçando-se sobre a represa. Para imprimir ritmo às fachadas, foram usados brises metálicos em caráter funcional, a fim de garantir proteção quanto à incidência solar no interior do salão, que chega pelas paredes envidraçadas. Privatizado em 1960, o clube manteve o uso como espaço de lazer e práticas esportivas, embora sofrendo muitas alterações ao longo dos anos – tantas que ficou parcialmente descaracterizado devido à construção do anexo.

Em defesa do patrimônio


Será lançada, hoje, às 11h30, na Câmara Federal, em Brasília (DF), a Frente Parlamentar em Defesa do Patrimônio Histórico Brasileiro, com participação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). De Belo Horizonte, seguiu a superintendente da autarquia federal no estado, Célia Corsino. O objetivo é acompanhar a tramitação de proposições na Câmara e no Senado que contribuam para o aprimoramento de legislação de preservação do patrimônio cultural brasileiro, apoiar e fortalecer as instituições ou órgãos federais, estaduais e municipais responsáveis pela defesa do setor, promover debates, audiências e seminários sobre os temas afetos à preservação e outros. A Frente conta com a adesão de 224 parlamentares. 


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