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Estado de Minas

Moradores de Macacos começam a semana fora de casa e desnorteados

Revolta e falta de informação marcaram o primeiro dia útil das famílias desalojadas em Macacos devido ao risco de barragem se romper. Acessos fechados paralisaram a comunidade


postado em 19/02/2019 06:00 / atualizado em 19/02/2019 08:58

Cinco bloqueios de trânsito de veículos dificultaram a movimentação e terminaram inviabilizando a rotina no distrito de Nova Lima onde fica a barragem da Vale (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )
Cinco bloqueios de trânsito de veículos dificultaram a movimentação e terminaram inviabilizando a rotina no distrito de Nova Lima onde fica a barragem da Vale (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )


Falta de informação, acessos fechados, ônibus parados e crianças sem aula. Entre a sensação de desamparo e a revolta, o primeiro dia útil depois que as sirenes anunciaram a necessidade de saída de famílias de suas casas em São Sebastião da Águas Claras, distrito de Nova Lima conhecido por Macacos, na Grande BH, pelo risco de rompimento da barragem B3/B4 da Vale, foi marcado pelo transtorno e paralisação da comunidade. Com a entrada e saída restritas a um caminho precário pelo Condomínio Pasárgada, a rotina se tornou inviável, com momentos de tensão elevada e protestos. Reuniões ao longo do dia apontaram para uma possível flexibilização dos bloqueios, mas os moradores não sabem o que esperar. Segundo a Defesa Civil, 108 pessoas saíram de casa e foram para dois hotéis em BH e duas pousadas em Macacos.


O tenente-coronel Flávio Godinho, coordenador adjunto da Defesa Civil de Minas, informou que duas empresas contratadas pela Vale para verificar segurança da barragem discordaram nas análises e por isso o fator de segurança subiu de 1 para 2, exigindo intervenção de evacuação da população da área de autossalvamento. A Defesa Civil aguarda laudos que possam atestar a segurança para que a empresa comunique o retorno para o nível 1 e a consequente possibilidade de volta das pessoas para suas casas.

Uma das expectativas da população local era que o transporte público fosse suprido pela Vale, mas a comunidade acordou no primeiro dia útil pós-acionamento de sirenes sem as opções metropolitana, entre BH e Macacos, e municipal, de Macacos a Nova Lima. O pedreiro Maykon Santos Amaral, de 26 anos, chegou às 6h a um ponto de ônibus da Rua dos Guaranis, no Hipercentro de BH, e esperou até o meio-dia sem sucesso pela passagem do ônibus para Macacos. O jeito foi pegar um coletivo para Nova Lima, mas como de lá também não saía nenhum para sua comunidade, teve que pegar carona para chegar em casa, no Bairro Capela Velha. “Como vou conseguir trabalhar dessa forma?”, questiona ele.

A dificuldade com o transporte foi gerada pela imposição de cinco pontos de bloqueio ao trânsito de veículos pela Polícia Militar, alguns flexibilizados mais tarde. Segundo a corporação, os bloqueios se tornaram necessários a partir do momento em que a Vale identificou a mudança de estágio da barragem e por isso, em caso de rompimento, uma provável onda de lama poderia atingir lugares com acesso por esses pontos. Entre eles está a entrada principal de Macacos, via AMG-160 a partir da BR-040. As empresas Santa Fé e Via Ouro retiraram os coletivos e moradores afirmam que a Vale prometeu suprir a demanda com vans, mas elas não apareceram pela manhã.

A situação gerou um cenário de desinformação tão grande na população que a arte educadora Tatiana Santana, de 36, uma das moderadoras de um grupo de mensagens via celular da comunidade, teve que bloquear os envios dos demais participantes, para não disseminar informações desencontradas. “O transporte coletivo parou e os alunos ficaram sem aula. Os professores não chegaram a nossa escola aqui na vila e os alunos que estudam no Jardim Canadá e em Nova Lima não conseguiram transporte para chegar às escolas”, afirma Tatiana.

Em meio a vários moradores que não sabiam o que fazer no centro comunitário onde a Vale cadastrava os ocupantes da zona de autossalvamento em caso de rompimento, houve alguns momentos de maior tensão, com gritos e discussões ríspidas. Diante de informações desencontradas, o professor e artista plástico Almiro Mendonça, de 72, foi um dos que acabaram se exaltando. “As pessoas querem ir embora de Macacos, para onde viemos em busca de tranquilidade. Tenho 72 anos e minha esposa, 65. Ela está traumatizada com essa situação. Isso é crime, a Vale tem que resolver isso urgentemente”, disse.

Maykon Amaral enfrentou uma
Maykon Amaral enfrentou uma "odisséia" desde as 6h para chegar a Macacos. Sem coletivo até as 12h, teve que mudar de rumo e pegar carona (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)


ALIMENTAÇÃO Já cadastrada por ser moradora de uma possível área de passagem de lama, a auxiliar de serviços gerais Andreza de Jesus Silva, de 33, reclamava da necessidade de alguns produtos de higiene pessoal e também mais comida. “Não temos roupa, porque elas estão molhadas pela chuva. Ficamos dois dias andando de mochila na chuva e por isso molhou. A pousada que eles arrumaram tem conforto para dormir e água para tomar banho, mas está faltando material de higiene e alimentação. O café da manhã tem, mas e o almoço e o jantar, as crianças vão ficar passando fome?”, questiona ela, que saiu de casa com o marido e três filhos. A Vale a colocou em uma pousada dentro de Macacos.

Uma dúvida recorrente da população ontem era sobre a dimensão de uma possível área atingida em caso de rompimento de barragem. Do terreno onde cria 50 ovelhas, o motorista Rui Maia Amorim, de 70, vê a barragem e conta que perdeu o sono desde que as sirenes tocaram, no sábado. “Não sei se corro risco ou não e preciso saber qual é a minha situação, mas ninguém fala nada. A sirene não tem hora pra tocar, se eu ficar doente aqui, como vou fazer?”, pergunta. (Colaborou Gabriel Ronan)

Bloqueios flexíveis


Ao perceber as reclamações da comunidade desorientada em Macacos, integrantes da cúpula da Polícia Militar e da Defesa Civil de Minas Gerais se reuniram com membros da Vale e levaram as demandas para buscar uma solução. Ao fim do encontro, o coronel Antônio Balsa, comandante da 3ª Região da PM, informou que para amenizar o sofrimento e melhorar a qualidade da vida da população, houve uma flexibilização nos pontos de bloqueio ao tráfego, que passaram a ser monitorados de perto com autorização de trânsito de veículos, e também a abertura de um novo acesso, no Campo do Costa, que tem totais condições de ser usado como rota de fuga sem nenhum risco. As liberações sob monitoramento valem para os horários em que ainda houver luz natural, mais ou menos entre as 5h e as 20h.

A flexibilização dos acessos ocorreu, por exemplo, na entrada do Bairro Capela Velha, onde o fechamento gerou protesto de moradores na parte da manhã. Mas não na AMG-160, que continuou fechada, sem permissão de acesso. Segundo Antônio Balsa, esse caminho funcionará a partir de hoje, das 5h às 20h, em um sistema siga e pare que permita o monitoramento dos veículos por meio de rádio. Já no caminho que dá acesso a Nova Lima, o bloqueio foi liberado entre a capela de São Sebastião das Águas Claras e a BR-040, permitindo uma segunda opção ao tráfego precário do Condomínio Pasárgada, única alternativa que estava liberada até então.

Outra situação viabilizada pela Polícia Militar foi a entrada em Macacos pelo Campo do Costa, uma região que pertence à Vale, mas que é conhecida da população local. “O fluxo nessa estrada vai ser de mão dupla. É uma estrada que consegue retirar toda a comunidade de Macacos sem risco nenhum, se for necessário”, diz o militar. No local, as autoridades colocaram pó de asfalto para facilitar o vai e vem de veículos. Sobre o transporte público, Balsa afirmou que ao longo do dia as vans prometidas pela Vale entraram em operação. 

 


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