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Estado de Minas

Documentos inéditos da Inconfidência Mineira são revelados

Documentos do processo investigativo sobre a exumação dos restos mortais dos inconfidentes estão expostos na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Minas


postado em 15/04/2018 06:00 / atualizado em 15/04/2018 08:08

Adalberto Mateus, Márcia Santos e Maria Cândida Seabra, integrantes do IHGMG, mostram manuscritos inéditos sobre a Inconfidência Mineira(foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Adalberto Mateus, Márcia Santos e Maria Cândida Seabra, integrantes do IHGMG, mostram manuscritos inéditos sobre a Inconfidência Mineira (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)

Documentos inéditos sobre a Inconfidência Mineira (1788-1789) poderão ser vistos até 27 de abril na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), em Belo Horizonte, no mês em que os brasileiros lembram o movimento liderado por Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes (1746-1792). Datados de 1936, com fita preta, lacre e o tom amarelado do tempo, os papéis, no formato de “cartas de encaminhamento”, tratam do processo investigativo sobre a exumação dos restos mortais dos inconfidentes Tomás Antônio Gonzaga, João da Costa Rodrigues e Vitoriano Gonçalves Veloso, que cumpriram o degredo na África ordenado pela Coroa portuguesa.

A coordenadora da Comissão Cultural Permanente de Geografia e Ciências Afins do instituto, Márcia Maria Duarte dos Santos, informa que as cartas têm uma longa trajetória desde que foram encaminhadas ao Brasil, no governo Getúlio Vargas, pela então colônia portuguesa de Moçambique. “Estão, portanto, longe dos olhos do grande público há mais de 80 anos”, revela a professora e especialista em cartografia histórica, ressaltando que os documentos foram doados, passaram por um processo de higienização e de catalogação, sendo um dos tesouros manuscritos da instituição, fundada há 110 anos.

Da mostra, que foi aberta no sábado com palestra e mesa-redonda sobre a Inconfidência Mineira, faz parte também um recibo assinado por Tiradentes a respeito do soldo quando era alferes e patrulhava a Estrada Real, que ligava Ouro Preto (MG) a Paraty (RJ). “Esses documentos jogam mais luz sobre a nossa história, para que ela não se repita”, lembra a também integrante da comissão, professora Maria Cândida Trindade Costa Seabra, responsável, há 10 anos, pela organização dos documentos na sede do instituto. Para facilitar, na atualidade, o trabalho da equipe de pesquisadores, que se completa com o promotor de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda e o jornalista Adalberto Mateus, os documentos continham uma placa com o nome do doador e datas.

O presidente do IHGMG, Aluízio Alberto da Cruz Quintão, conta que o acervo tem 43 documentos referentes à Inconfidência Mineira, que foram fotocopiados para garantir a preservação dos originais. Num livro de capa vermelha estão cartas do governador de Angola e Moçambique, decisões judiciais (acórdãos), procurações, recibos, editais do governo e outros de interesse de pesquisadores, professores, estudantes e do cidadão que quer conhecer mais sobre o passado. “São de interesse histórico e cultural”, resume. O instituto, acrescenta Aluízio Alberto, tem biblioteca, hemeroteca (jornais e revistas), videoteca, setor de honrarias e medalhas e mapoteca.

Documento original emitido por Tiradentes, no caso tratando do acerto de contas na patrulha do Caminho Novo, em 1781, que faz parte do acervo(foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Documento original emitido por Tiradentes, no caso tratando do acerto de contas na patrulha do Caminho Novo, em 1781, que faz parte do acervo (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
RESPEITO À MEMÓRIA O promotor de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda, integrante do IHGMG, destaca que a instituição, desde a fundação, tem um compromisso muito forte com a pesquisa e a preservação dos fatos envolvendo a Inconfidência. E lembra que o respeito à memória dos inconfidentes vem se perdendo ao longo das gerações. “Por força legal, todas as repartições públicas estaduais deveriam ter um quadro com a efígie de Tiradentes, norma que caiu no esquecimento. Da mesma forma, muitos imóveis ligados a episódios da Inconfidência estão em ruínas ou foram demolidos, representando perda irreparável para Minas.”

Para entender melhor a história dos documentos agora expostos, é preciso voltar no tempo, desta vez guiados por Adalberto Mateus, também membro da instituição. Tudo começou, conta, com o livro Amor infeliz de Marília e Dirceu, escrito pelo advogado, magistrado e historiador mineiro Augusto de Lima Júnior (1889-1970). “No prefácio, ele pedia o traslado dos restos mortais de 13 inconfidentes. Na época da publicação, o presidente Getúlio Vargas estava em Juiz de Fora, na Zona da Mata, e atendeu de pronto à solicitação”, explica. Augusto de Lima Júnior foi então designado para os entendimentos com o governo português e seguiu para a Europa.

Em julho de 1938, os restos mortais chegaram a Ouro Preto, na Região Central, e foram levados, em cortejo, para a Matriz de Nossa Senhora da Conceição, no Bairro de Antônio Dias, no Centro Histórico – mesmo antes da inauguração do Museu da Inconfidência, passaram a repousar no Panteão dos Inconfidentes, no andar térreo do prédio da Praça Tiradentes. Adalberto informa que o visitante poderá ver ainda, na exposição, quadros sobre Tiradentes, uma linha do tempo sobre o traslado e outros dados sobre o movimento.

 

Decreto da derrama

 

Para entender a história de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, é preciso conhecer o momento social e político do fim do século 18. A rainha de Portugal, dona Maria I (1734-1816), conduzia uma política reformista e moralizadora em relação às colônias portuguesas, principalmente a partir de 1783. O objetivo era tirar das elites locais os cargos que ocupavam no governo, reforçar a dependência econômica em relação a Lisboa, barrar os desmandos dos padres e cobrar os débitos dos contratadores de impostos (pessoas que compravam da Coroa o direito de cobrar tributos dos súditos). Na época, Portugal tinha o direito de cobrar o “quinto do ouro”, taxa de até 20% sobre a produção do metal. Mas se os mineradores não pagassem ao governo 100 arrobas de ouro anuais, a Coroa portuguesa poderia decretar a derrama, obrigando as câmaras municipais a fazer o povo pagar o valor necessário para chegar àquele total.

Em 1788, Luís Antônio Furtado de Castro do Rio Mendonça, visconde de Barbacena (1754-1830), chegou em Minas com ordem para decretar a derrama. A situação gerou descontentamento na capitania, em especial nas pessoas ligadas a grupos privilegiados – contratadores, clérigos, militares, contrabandistas etc. Um grupo começou, então, a articular uma conspiração contra o governo, chamada de Inconfidência ou Conjuração Mineira. No século 18, novos ventos sopravam sobre o Ocidente, trazendo a filosofia de pensadores franceses que criticavam o poder absoluto dos reis, administração colonial, monopólio comercial, intolerância religiosa e sistema de trabalho. A Inconfidência floresceu no ambiente de efervescência intelectual e política, como ocorria na Europa e Américas, em especial, com a independência (1776) das 13 colônias que deram origem aos Estados Unidos.

As novidades chegaram a Minas pelos livros, jornais, manuscritos e relatos orais de viajantes. Imbuído desse espírito, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, denunciou que altos tributos e monopólio comercial transformaram Minas, uma capitania rica, em lugar de pobreza. Mas havia um delator, Joaquim Silvério dos Reis (1756-1819). O movimento foi abortado em 1789 e Tiradentes enforcado três anos depois.

 

 

Serviço


 

Exposição: A Inconfidência Mineira na memória do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais 

Local: Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, na Rua dos Guajajaras, 1.268, no Bairro Barro Preto, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte.

 

Aberta para visitação de segunda a sexta-feira, das 13h30 às 17h30.

 

Entrada franca

 

Mais informações: www.ihgmg.org.br 


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