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Estado de Minas

Ministério Público quer fim de invasão na Serra do Curral

Promotoras entram com ação contra acusado de invasão no Bairro Comiteco, em BH, e denunciam negligência do município ao permitir construções irregulares em área tida como tombada


postado em 10/08/2016 06:00 / atualizado em 10/08/2016 07:42

Representante de donos de lotes, advogado Gustavo Tavares mostra área de construções questionadas(foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Representante de donos de lotes, advogado Gustavo Tavares mostra área de construções questionadas (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
O Ministério Público de Minas Gerais quer que a Prefeitura de Belo Horizonte remova moradores e destrua construções de um loteamento considerado ilegal instalado sobre o perímetro de tombamento do entorno da Serra do Curral, cartão-postal da capital mineira reconhecido pela Fundação Municipal de Cultura (FMC) e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo o MP, as obras tidas como clandestinas foram feitas por João Batista Filho, um ex-metalúrgico que alega ser proprietário de 60 lotes adquiridos há mais de 15 anos no local, mas é questionado tanto pelo poder público quanto por donos de lotes na região, que o consideram grileiro de terras. Quase cinco anos após o Estado de Minas mostrar pela primeira vez o problema no Bairro Comiteco, Região Centro-Sul de BH, o MP diz que o loteador está destruindo o meio ambiente e que a PBH teve tempo suficiente para resolver a situação, o que motivou uma Ação Civil Pública na Justiça pedindo a interrupção de todas as atividades no local.


As promotoras Cláudia Ferreira de Souza e Lílian Marotta Moreira consideraram que a administração municipal foi “negligente” e agiu com “inércia” e “descaso”, o que contribuiu para que a região fosse degradada. O MP ainda pede que a Justiça obrigue o município e o ex-metalúrgico a pagarem no mínimo R$ 1 milhão de compensação pelos danos ambientais na região, como o lançamento de esgoto em fossas e o desmatamento de cerca de 23 mil metros quadrados em área de transição entre os biomas de mata atlântica e cerrado, o que foi constatado pela Polícia Militar do Meio Ambiente. Em caráter liminar, as promotoras querem que João Batista interrompa imediatamente qualquer intervenção nos terrenos e que a PBH faça um levantamento de tudo que foi feito na área, além de cadastrar todas as pessoas que estiverem vivendo de forma irregular no loteamento em um prazo de 30 dias, sob pena de multa de R$ 1 mil por dia.

O problema teve início ainda em 2011, quando donos de lotes em uma área sem infraestrutura urbana nos limites da Praça JK, da Vila Acaba Mundo e também da Serra do Curral, no Bairro Comiteco, com entrada pelas ruas Aldebaram e Monte Azul, começaram a desconfiar de cercas e telas instaladas na região em áreas particulares das quadras 182 e 183. Desde aquela época, o advogado Gustavo Tavares, que representa 14 proprietários na região, entrou na Justiça denunciando o problema, o que, segundo ele, motivou várias ameaças de João Batista e seus funcionários ao próprio advogado e a seus clientes.

De lá para cá foram duas ações de reintegração de posse, um processo administrativo na prefeitura, um inquérito policial e o inquérito civil que virou ação na Justiça do Ministério Público, segundo o advogado. “Estamos há cinco anos tentando providências para a região, mas até hoje nada foi feito. Inclusive, os proprietários pagam normalmente os tributos como IPTU e taxa de iluminação, sendo que não existe infraestrutura”, diz Tavares. Ontem, depois de mostrar a área à reportagem, Gustavo foi parar na delegacia, pois diz ter sido ameaçado de morte por telefone por Fabrício Bruno Braz, que seria funcionário do responsável pelo loteamento.

Em 2012, equipe do Estado de Minas esteve no local e já havia presenciado uma tentativa de intimidação feita pela mesma pessoa ao advogado, que também acabou na delegacia. Apesar de a Prefeitura de BH alegar que fazia estudos para identificar a extensão das ocupações e garantir que a obra estava embargada, o que se vê no local é a expansão das construções. É possível observar materiais para construção, casas já prontas e trabalhadores iniciando a obra de mais um imóvel, bem perto da Serra do Curral. Um deles disse que trabalha para um coronel aposentado da Polícia Militar e que está acostumado a fazer pequenos serviços na região. O homem atendeu à ligação do EM, mas desligou em seguida, ao ouvir que se tratava de um veículo de imprensa.

Apesar de denúncia de degradação ambiental, operários trabalhavam normalmente ontem no local(foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Apesar de denúncia de degradação ambiental, operários trabalhavam normalmente ontem no local (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
As promotoras Cláudia Ferreira de Souza, da Promotoria de Habitação e Urbanismo, e Lílian Marotta, que atua na Promotoria de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural de BH, receberam informações da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana dizendo que a área em questão está inserida em dois tipos de parcelamento do solo em BH: Zona de Proteção 2 (ZP2) e Área de Proteção Ambiental 1 (APA1), ambas inseridas no perímetro considerado de tombamento do entorno da Serra do Curral. Já a Fundação Municipal de Cultura informou ao MP que não foram encontradas invasões em área pública tombada da Serra do Curral, com base em relatório da Regional Centro-Sul da prefeitura. De qualquer forma, o município informou ao MP que vem atuando desde 2010 para fiscalizar o local, atestando a falta de licenças ou autorizações para intervenções na região, mas nada impediu a expansão da ocupação sem as autorizações devidas.

“É incontestável que o loteamento clandestino realizado pelo primeiro requerido (João Batista) causou danos ambientais, uma vez que ele realizou a supressão de vegetação em área de transição entre a mata atlântica e o cerrado, além de ter instalado fossas negras e edificações no local”, segundo a ação civil pública, que também traz críticas à PBH. “Essa demora em atender à necessidade pública é imperdoável, pois o município está obrigado a efetivar os direitos fundamentais da dignidade da pessoa humana e do meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo responsável por garantir qualidade de vida à população, não podendo se omitir por conta de promessas distantes”, acrescentam.

DEMOLIÇÕES O MP quer que a Justiça condene o Executivo municipal a fazer a demolição de tudo o que foi construído na área e a remover as famílias envolvidas, com inserção em programas de habitação. Outra pedido diz respeito à recomposição da área degrada. As promotoras também querem uma varredura nos bens de João Batista, com o objetivo de pôr em indisponibilidade itens que possam garantir indenizações aos donos de lotes lesados. O EM tentou entrar em contato com João Batista e seus advogados, mas eles não foram localizados. Por telefone, Fabrício Braz negou que tivesse ameaçado o advogado Gustavo Tavares e disse que o Ministério Público está agindo por interesse de uma empresa que atua na região. “Essa situação da propriedade dos lotes será resolvida na Justiça”, afirma. O único documento do processo disponível para consulta traz um pedido do juiz Rinaldo Kennedy Silva solicitando a manifestação da Prefeitura de BH antes que o magistrado avalie os pedidos em caráter liminar.

Nas mãos da Justiça

Pedidos do Ministério Público em caráter liminar

Para o responsável pelo loteamento considerado clandestino

1) Apresentar contratos de compra e venda dos lotes

2) Interromper as atividades nas quadras 182, 183 e 184, com entrada pelas ruas Aldebaran e Monte Azul, no Bairro Comiteco, incluindo a retirada de anúncios de promessa de venda e recebimento de mensalidades relativas a possível comercialização de terrenos

3) Colocação de placa identificando que o loteamento foi paralisado por estar irregular

4) Identificação e indisponibilidade de bens, para garantir indenizações a consumidores lesados

Para a Prefeitura de Belo Horizonte

1) Cadastramento das intervenções feitas nos lotes e cadastramento social dos moradores

Pedidos da Ação Civil Pública *

1) Retirada das pessoas que estiverem morando na área irregular, com inserção das que preencherem os requisitos em programas habitacionais da PBH, em prazo de 60 dias

2) Demolição das construções clandestinas nas quadras 182, 183 e 184, com a correta destinação do entulho

3) Regularização fundiária dos lotes, caso a prefeitura conclua por essa medida, em prazo de 180 dias

4) Reabilitação da área afetada ou compensação ambiental caso os danos tenham sido irrecuperáveis, em prazo de 30 dias

5) Pagamento de indenização aos donos de lotes lesados

6) Pagamento de indenização por danos coletivos ao meio ambiente, de no mínimo R$ 1 milhão, assumidos solidariamente entre a prefeitura e o responsável pelo loteamento

7) Cancelamento do parcelamento do solo previsto há mais de 60 anos para a área em disputa

* Os prazos são pedidos pelo MP. Assim como os demais requerimentos, dependem de posicionamento da Justiça

Prefeitura de BH
diz que fará vistoria

Consultada, a Prefeitura de Belo Horizonte informou já ter se manifestado no processo e informou que a área que é objeto da ação do MP é particular. Ainda de acordo com o município, a definição sobre o fato de os terrenos se situarem ou não em área tombada depende de vistoria ainda a ser realizada por órgão municipal. A administração sustenta que todas as medidas administrativas necessárias estão sendo adotadas e que a eventual demolição de construções irregulares é a última providência e, que depende de determinação judicial.


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