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Estado de Minas 'SUB-HUMANO'

MP dá 10 dias para PBH responder à recomendação para fechar maior albergue de Belo Horizonte

Após denúncias do EM, promotores cobram da Prefeitura de BH fim do Albergue Tia Branca, por superlotação, condições degradantes e risco de doenças. Caso pode virar briga judicial


postado em 09/07/2016 06:00 / atualizado em 09/07/2016 08:15

Unidade da Região Leste de BH chega a receber 400 pessoas, oito vezes mais que o recomendável(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Unidade da Região Leste de BH chega a receber 400 pessoas, oito vezes mais que o recomendável (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Depois das denúncias de condições que representam ameaças à saúde, higiene e segurança da população em situação de rua acolhida no maior abrigo de Belo Horizonte, feitas pela reportagem do Estado de Minas no último domingo, o Ministério Público (MP) entregou recomendação à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) cobrando a desativação do Albergue Tia Branca, no Bairro Floresta, Região Leste da capital, e a transferência de suas vagas para estruturas a serem implantadas. Outra recomendação, embasada também em denúncias da reportagem e em inquéritos do MP, exige a revogação da instrução normativa municipal que prevê recolhimento de objetos pessoais de pessoas que pernoitam nas ruas e praças da capital mineira. As orientações foram entregues a representantes da PBH e a administração municipal tem 10 dias para responder se as acatará integralmente, parcialmente ou as rejeitará. Nesse último caso, a questão pode ser resolvida pela via judicial. Se houver concordância, um termo de ajustamento de conduta (TAC) será celebrado entre o MP e a PBH para determinar prazos e metas. A Procuradoria-Geral do Município informou que “analisará as recomendações para uma tomada de decisão”.

O MP recomendou à prefeitura “a completa desativação da unidade de acolhimento institucional Tia Branca” e a criação de unidades “com a observância das exigências estabelecidas nas normas da assistência social, especialmente a resolução do Conselho Nacional de Assistência Social”. Instituiu-se um prazo não superior a dois anos para a gradual extinção do albergue, paralelamente à ativação das novas unidades e vagas. “É inadmissível que as pessoas continuem a receber esse tipo de tratamento sub-humano que vinha sendo prestado no albergue”, disse o chefe da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais (Cimos), Paulo Cesar Vicente de Lima.

No último domingo, a reportagem do EM pernoitou no Albergue Tia Branca, no Bairro Floresta (Região Leste). Antes mesmo de entrar, recebeu alertas na entrevista com assistentes sociais do edifício sobre os riscos de contaminação por tuberculose, por haver doentes com tratamentos deficientes nos mesmos quartos que pessoas saudáveis, infestações de percevejos e violência. Funcionários e albergados entraram em conflitos várias vezes no refeitório e no pátio. Nos quartos, grupos de moradores tomavam cobertores e camas uns dos outros, à força de ameaças. As paredes tinham tijolos expostos e não havia chuveiros com água quente para todos.

O MP incluiu esse relato nos argumentos da recomendação e acrescentou denúncias de usuários e de vistorias anteriores, em que foi observado também atendimento de até 400 pessoas, quando o Sistema Único da Assistência Social preconiza, no máximo, 50. O documento critica ainda outros pontos, como a proliferação de percevejos, considerada “grave, com altos índices de pessoas picadas e adoecidas” (veja quadro). As recomendações são assinadas por três promotores da Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos, Igualdade Racial, Apoio Comunitário e Fiscalização da Atividade Policial e pelo coordenador da Cimos, Paulo Cesar Vicente de Lima.

“Entregamos pessoalmente à Prefeitura de BH as duas recomendações, com a intenção de construir uma solução consensual que traga benefícios aos desamparados. Estamos otimistas com a possibilidade de acatamento, para que não seja necessária uma ação civil pública”, disse o promotor Paulo Cesar de Lima. Nas duas recomendações, o MP considera improbidade administrativa a não solução dessas irregularidades. O coordenador do Cimos destaca, ainda, ser complexa a questão das pessoas em situação de rua. “Não basta o poder público para solucionar tudo, é preciso engajamento da sociedade para vencer o preconceito. A maior dificuldade dessa população é conseguir emprego. Quando vão a uma entrevista e apresentam como endereço um abrigo, não conseguem a vaga”, afirma o promotor.


Repórter enfrentou noite entre moradores de rua e mostrou condições e ameaças a que estão sujeitas essas pessoas(foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press)
Repórter enfrentou noite entre moradores de rua e mostrou condições e ameaças a que estão sujeitas essas pessoas (foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press)
Apreensão de pertences também é questionada

Nas ruas e praças de Belo Horizonte, as pessoas que não têm casa e se refugiam em barracas ou sob marquises de edifícios precisam recorrer a esconderijos nos bueiros, em galhos de árvores e à boa vontade de porteiros para guardar suas posses, pois relatam ser vítimas de guardas municipais que recolhem seus objetos. Ao pernoitar na Praça Raul Soares e percorrer a Região Centro-Sul de BH, várias pessoas em situação de rua denunciam que cobertores, móveis e outros objetos são levados nas abordagens. De acordo com o Ministério Público, várias denúncias nesse sentido embasaram inquérito civil e a partir dele e das denúncias da reportagem do EM foi formulada recomendação para que a Prefeitura de Belo Horizonte abandone esse tipo de política, que deve ser respondida em 10 dias.

No caso do recolhimento de pertences das pessoas em situação de rua, a recomendação exige “a revogação imediata da Instrução Normativa Conjunta 1, de 2 de dezembro de 2013”, e a interrupção imediata do recolhimento dos pertences de pessoas em situação de rua, “ainda que sob a alegação de gestão do espaço público”. A instrução questionada permite que agentes públicos apreendam pertences considerados “não essenciais à sobrevivência”, o que excluiria material que a pessoa consiga carregar “em um só deslocamento e sem auxílio de veículos”, como roupas, alimentos, documentos, bolsas, receitas e medicamentos, cobertores etc.

OUTROS ABRIGOS Na recomendação que pede a desativação do Albergue Tia Branca, o MP também critica severamente as condições das demais unidades de acolhimento institucional, os abrigo São Paulo e a República Maria Maria, para mulheres. “Também se encontram em desacordo com as normativas do Sistema Único de Assistência Social, sendo também frequentemente alvo de denúncias, conforme consta em inquérito civil” em tramitação. Critica também o fato de que no Orçamento Participativo dos anos de 2007, 2008 e 2012 foram aprovados equipamentos voltados especificamente para as pessoas em situação de rua que nunca foram implantados.


PBH DIZ QUE FAZ CONTROLE

Sobre as condições do abrigo Tia Branca, a Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social (SMAAS) informa que  pessoas em tratamento de tuberculose “são acolhidas após o período de risco de transmissão (15 dias depois de iniciado o tratamento)”, mas não comentou sobre os alertas de assistentes sociais de que doentes sem tratamento continuam a transmitir a infecção. “No que se refere aos percevejos, a SMAAS monitora e realiza, junto à Fiocruz, ações de combate, faz trocas de colchões e cobertores quando necessário e orienta os usuários”, afirma a secretaria. Quanto à segurança, a pasta sustenta que conta com a atuação da Guarda Municipal e o trabalho dentro do albergue é feito “na perspectiva de prevenir conflitos”. Sobre a retirada de objetos de moradores em situação de rua, a informação é de que “em nenhuma hipótese, os pertences pessoais essenciais à sobrevivência” serão objeto de apreensão. (MP)


NOITES MAL DORMIDAS
Veja problemas relatados pelo MP no Albergue Tia Branca

» Violência, negligência e maus-tratos de funcionários a usuários
» Discriminação de pessoa portadora
do vírus HIV
» Condições precárias da edificação, más condições sanitárias, falta de água e de bebedouro
» Proliferação de insetos (percevejos) e outras pragas
» Capacidade total de 400 usuários, acima do adequado (50/dia)
» Concentração do serviço num único local da cidade, com efeito de isolamento/segregação
» Inoperância de alguns dos chuveiros
» Não cumprimento da quantidade mínima de pessoas na equipe de referência para atendimento direto e atendimento psicossocial
» Não oferta de material de higiene de forma adequada, faltando travesseiro, virol, lençol e toalha de banho, além de o material não ser entregue em embalagens individualizadas
» Precárias condições dos quartos e das camas
» Toalha de banho fornecida aos usuários equivalente a um quarto de uma peça comum


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