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Estado de Minas

Parentes de vítimas de queda de viaduto e acidente em barragem ainda esperam justiça

Familiares de vítimas das tragédias sofrem com demora das investigações e a incerteza de punição dos culpados


postado em 05/01/2015 06:00 / atualizado em 05/01/2015 07:12

Valquiria Lopes

'Já se passaram seis meses do acidente e até agora nenhum esclarecimento', Analina Soares Santos, mãe de Hanna Cristina, que morreu no queda do viaduto na Avenida Pedro I, em 3 de julho de 2014. Viaduto Batalha dos Guararapes desabou em 3 de julho do ano passado e deixou dois mortos (foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)
'Já se passaram seis meses do acidente e até agora nenhum esclarecimento', Analina Soares Santos, mãe de Hanna Cristina, que morreu no queda do viaduto na Avenida Pedro I, em 3 de julho de 2014. Viaduto Batalha dos Guararapes desabou em 3 de julho do ano passado e deixou dois mortos (foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)
 

Muito tempo de espera e poucas respostas. Parentes de vítimas de tragédias que marcaram Belo Horizonte e a Região Central de Minas no ano passado sofrem com a angústia causada pela falta de informações sobre as causas dos acidentes que mataram seus familiares e a incerteza da punição dos responsáveis. Em 3 de julho, em plena Copa do Mundo, a queda da alça sul do Viaduto Batalha dos Guararapes, na Avenida Pedro I, causou a morte de duas pessoas e deixou 23 feridas. Em 10 de setembro, uma barragem da Mineração Herculano, em Itabirito, estourou e um mar de lama e água varreu máquinas e operários. Três morreram soterrados e cinco ficaram feridos.

Mesmo com a grande repercussão, inclusive internacional, do desabamento do viaduto, o inquérito, que já passa de 1,2 mil páginas e mais de 80 oitivas, ainda não foi concluído seis meses depois. Aberto em 3 de julho, teve pedido de dilação do prazo em 4 de agosto. Retornou da Justiça em 10 de setembro, com mais 90 dias para continuidade da investigação. O novo prazo acabou em 10 de dezembro, mas o delegado Hugo e Silva, da 3ª Delegacia de Venda Nova, se adiantou no pedido de mais tempo para finalizar o inquérito, que ainda está sendo analisado pela Justiça. Ainda não há data para conclusão da investigação, que depende também de laudos técnicos que estão em andamento.

No caso da barragem da Mineração Herculano, o inquérito aberto em 10 de setembro para apurar as causas do rompimento do reservatório também não foi concluído. O primeiro prazo de 30 dias venceu em 10 de outubro, quando houve o primeiro pedido de prorrogação. O documento voltou do Judiciário 14 dias depois, quando houve a segunda solicitação para ampliação do tempo. Agora, a delegada de Itabirito, Melinna Clemente, aguarda resposta da Justiça e o retorno do inquérito.

A longa demora na conclusão dos inquéritos revolta familiares das vítimas. Analina Soares Santos, de 52 anos, mãe da motorista Hanna Cristina dos Santos, de 24, que morreu ao volante do ônibus atingido pelo viaduto, cobra respostas. “As pessoas morrem e tudo fica por isso mesmo. Já se passaram seis meses do acidente e, até agora, nada, nenhum esclarecimento. A impressão que fica é que não estão preocupados com isso. Penso nisso todos os dias”, desabafa.
Analina também sofre com outra consequência da tragédia. “Depois que a Hanna morreu, o pai da minha neta requereu a guarda dela e a Ana Clara passou a morar com ele. Só eu sei a dor de perder uma filha e uma neta ao mesmo tempo”, diz a mãe, que entrou com ação na Justiça para tentar a guarda da menina.

O músico e empresário Enderson Eliziano, de 33, pai de Ana Clara, hoje com 6 anos, afirma que o acidente serviu para estreitar mais os laços dele com a garota e que a tragédia deixa um sentimento de impunidade. “A gente luta para não cair no esquecimento, porque esperamos que a Justiça responsabilize os culpados e os proíba de continuar a executar obras que coloquem outras vidas em risco”, diz.


A reportagem do Estado de Minas tentou contato com Cristilene Pereira Sena, mulher de Charlys Moreira do Nascimento, que também morreu no acidente. Ele dirigia um Uno, que ficou destruído sob o viaduto. Ela, no entanto, não quis falar sobre a tragédia.

'A investigação está muito lenta. Até hoje não sabemos de nada. É uma questão de justiça', Maria das Graças Santos Batista, mãe do operário Adilson Batista, que morreu soterrado após estouro de barragem, em 10 de setembro do ano passado (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
'A investigação está muito lenta. Até hoje não sabemos de nada. É uma questão de justiça', Maria das Graças Santos Batista, mãe do operário Adilson Batista, que morreu soterrado após estouro de barragem, em 10 de setembro do ano passado (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Em Itabirito, a família do operador de máquinas Adilson Aparecido Batista, de 44, conseguiu vencer o drama de não poder enterrar o corpo dele, encontrado em 20 de novembro. Mas quase quatro meses depois da tragédia, a angústia de não ter uma resposta para a causa permanece. “A investigação está muito lenta. Até hoje, não sabemos de nada e falta mais empenho para esclarecer o que houve. Claro que isso não vai trazer meu filho de volta, mas é uma questão de justiça”, afirma a aposentada Maria das Graças Santos Batista, mãe do operário.

Ela diz que, desde o dia da morte do filho teve de passar a tomar remédios controlados e que tem “lutado muito para não adoecer”. O irmão de Adilson, Valtenil Batista, também critica a demora para conclusão do inquérito. “Alguém precisa ser responsabilizado e punido, porque meu irmão vinha falando três meses antes de morrer que havia risco de a barragem ceder. Ninguém deu ouvidos a ele. Ele avisava ao encarregado no trabalho que iria morrer e ninguém fez nada”, conta. Segundo Valtenil, o irmão saiu de casa para trabalhar no dia da tragédia, pediu bênção à mãe e avisou que toda a família iria no velório dele, porque a barragem iria ceder e matá-lo.

 

Polícia prolonga inquéritos

Os principais entraves para a conclusão dos inquéritos sobre as tragédias no Viaduto Batalha dos Guararapes, em Belo Horizonte, e na mineração em Itabirito são os laudos técnicos complementares à perícia, segundo autoridades policiais. Mas a polícia nega que haja atraso ou lentidão na investigação e garante que a perícia demanda tempo para conclusão.

Responsável pela apuração do rompimento da barragem, a delegada Melinna Clemente diz entender a angústia dos familiares. “Mas chegamos a um momento em que dependemos de laudos técnicos. Aquele foi um evento complexo e é preciso fazer perícias detalhadas que envolvem profissionais de diversas áreas, como da engenharia, geologia e biologia”, disse. Segundo ela, vários materiais foram recolhidos no dia do acidente, como solo, rochas e água, e os testes demoram para ser feitos.

A delegada afirma que não pode concluir o inquérito sem o resultado das análises. “Dessa forma, a perícia ficará mal elaborada e as chances de chegar a uma condenação são pequenas. Não há demora e ninguém está parado. Praticamente toda a equipe da delegacia ficou empenhada para solucionar esse caso”, afirmou, adiantando que a conclusão não deve demorar mais.

Em setembro, a mineradora Herculano apresentou o resultado de um estudo preliminar que aponta a existência de canais subterrâneos originários de um fenômeno geológico raro, conhecido como “inversão de relevo”, que pode ter levado ao rompimento da barragem.

A normalidade nos prazos também foi constatada no Ministério Público. De acordo com o coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais, Marcelo Matar, os pedidos de dilação de prazo estão relacionados à complexidade dos eventos. “O inquérito requer diversas oitivas, que são longas, demoram horas. Além disso, a perícia é extremamente técnica. O tempo gasto até agora é justificável. Não há falhas no trabalho da polícia”, garantiu.

INDENIZAÇÃO Presidente da Comissão de Advocacia Pública Municipal da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Minas Gerais (OAB/MG), Henrique Carvalhais explica que a conclusão dos inquéritos não influencia nos pedidos de indenização. “Uma decisão na esfera administrativa não repercute nas de natureza civil e também nas de natureza criminal”, disse. Segundo ele, a ação pode ser proposta, mesmo que a condenação ainda não tenha ocorrido.

Para o presidente da Consol Engenharia, Maurício de Lana, autora do projeto do viaduto, não há nenhuma ação judicial contra a empresa. Segundo ele, a Consol não participou da execução do projeto, que também teria sofrido modificações ao ser implantado. Por determinação do Ministério Público, a empresa e a Construtora Cowan, responsável pela obra, assinaram um termo de ajustamento de conduta (TAC) para construção de uma trincheira na Avenida Pedro I, e a Consol elaborou o projeto da estrutura. O responsável pela execução da obra, no entanto, ainda não foi definido.


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