
Nossa Senhora do Rosário recebeu homenagens ontem nas ruas do Bairro Prado, Região Oeste de Belo Horizonte. Embalados pelo som do tambor, devotos de todo o estado se reuniram em trajes de gala para louvar a padroeira do congado, no dia em que o Festejo do Tambor Mineiro completava 10 anos. Em uma festa que não envolve apenas a fé, mas música, dança e percussão, os grupos que representam a cultura afro-mineira dividiram as atenções com artistas como a cantora Elza Soares e o instrumentista Marco Lobo. A expectativa era receber 10 mil pessoas nos três quarteirões fechados da Rua Ituiutaba.
Idealizado por Maurício Tizumba, o Festejo do Tambor Mineiro celebra o encontro de guardas do congado. Em cortejo, os grupos desfilaram em direção a um altar onde estava Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia e São Benedito. Os devotos rezam cantando, dançando e tocando os instrumentos de percussão. Como anfitrião da festa, o músico mineiro reforça que a intenção é mostrar que a cultura popular resiste. “É raro ver uma festa em Minas Gerais que reúne um grande número de negros festejando. Isso ajuda a quebrar preconceito e mostrar a importância da nossa tradição”, destaca Tizumba, que se sente fortalecido depois de acompanhar o festejo.
Está sempre marcado no calendário do advogado Tiago de Miranda, de 32 anos: o terceiro domingo de agosto é dia de celebrar o congado. “A minha ligação com a festa não é por ascendência, mas por afinidade. Valorizo muito a cultura mineira e gosto de prestigiar os artistas locais”, explica. Ao lado da mulher, Isabel Vieira, de 32, ele registrou com a câmera fotográfica a primeira vez em que o filho participou do festejo. “Fazemos questão que ele conheça essa cultura e aprenda desde cedo a respeitar as diferenças”, completa ela. Pelo visto, Pedro Vieira de Miranda, de 1, gostou de tirar foto entre os congadeiros.
Desde que nasceu, Felipe Mota, de 2, desfila com a Guarda do Divino, sediada no Bairro Aparecida, Região Nordeste da capital. Fizeram até um tambor pequeno para ele, mas o menino se interessamesmoé pela roupa branca e vermelha. “Ele não pode ver que quer usar. Se eu não esconder, ele fica o dia todo com ela”, conta a mãe, a auxiliar de serviços gerais Meyre Rodrigues Mota, de 49, que dançou por 19 anos na Guarda de Congo Feminina. Destaque da guarda, Felipe demonstra que quer seguir os passos dos pais congadeiros. “É um orgulho para a gente vê-lo aprender a dançar. Vai seguir a raiz negra.”
Assim como Nossa Senhora do Rosário, São Benedito é homenageado no Festejo do Tambor Mineiro. Por ser santo cozinheiro – dizem que ele guardava comida para os escravos –, as refeições são momentos importantes do encontro. Há 10 anos, a congadeira Neusa Pereira Teixeira é responsável pelo café da manhã e almoço dos integrantes das guardas. Foram 30 quilos de feijão, 130 quilos de frango e 50 quilos de arroz, preparados desde sábado de manhã, para servir 800 pessoas. “É muito gratificante fazer esse trabalho. Agradeça a São Benedito, pois é ele que cozinha, e não eu.” O santo ganhou um altar enfeitado com frutas na entrada do salão, idealizado por Maria do Nascimento Silva, de 62, e suas quatro filhas, que também enfeitaram o altar principal. “Digo que é um palácio que a gente decora para que os visitantes se sintam reis, rainhas, príncipes e princesas”, diz a capitã do Grupo de Congo Feminino.
Neta de rainha e filha de dançarina do congado, a segurança Lucilene Ferreira da Silva, de 44, participou pela primeira vez da festa no Prado. Posicionada ao lado do altar, ela viu de perto a homenagem das guardas a Nossa Senhora do Rosário e dançou no ritmo africano. “O toque do tambor contagia. Você não sabe dançar, mas vai se mexendo”, diz.
