(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Anel Rodoviário terá ao menos mais 18 meses de perigo

Adiamento da reforma do Anel de janeiro de 2012 para junho de 2013 causa indignação e expõe risco de novas tragédias. Trinta pessoas já morreram em acidentes na via este ano


postado em 26/11/2011 06:00 / atualizado em 26/11/2011 07:03

 

Com 26,5km de extensão, Anel é palco de problemas diversos, desde rota de fuga de criminosos até acidentes graves(foto: JUAREZ RODRIGUES/EM/D.A PRESS)
Com 26,5km de extensão, Anel é palco de problemas diversos, desde rota de fuga de criminosos até acidentes graves (foto: JUAREZ RODRIGUES/EM/D.A PRESS)

 

Um susto próximo à Praça São Vicente. O utilitário chapa branca, apressado, corta pela direita. Se não fosse a habilidade do nosso motorista, seria outra equipe do Estado de Minas a fazer a reportagem. Cena que se repete para aqueles que se aventuram no Anel Rodoviário, traço crítico que corta Belo Horizonte e região metropolitana. Ao menos até 2013, os problemas vão continuar: acidentes que mutilam e matam; rota de fuga de ladrões de carro (segundo a Polícia Civil, eles se aproveitam da proximidade do bairro com a estrada), pichações nos imóveis ao longo da marginal; homens, mulheres e crianças em iminente risco de vida por atropelamento vão continuar a escrever o capítulo triste da história do Padre Eustáquio e dos bairros vizinhos marcados pela via de muitas mortes.

E os números são assustadores. Só neste ano já foram 30 mortes e 831 feridos em 2.512 acidentes no Anel. Um forte motivo para a indignação com o adiamento de janeiro de 2012 para junho de 2013 das obras da rodovia pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) . Nilton Munhoz, de 71 anos, motorista há meio século, conhece bem as agruras da região. Há 30 anos de plantão na Praça São Vicente, o carreteiro vê o local como um dos pontos mais críticos da rodovia. “Todo mundo aqui vê esse adiamento como um verdadeiro absurdo. Qualquer acidente ou carro enguiçado no Anel se reflete no bairro. O trânsito fica travado em toda a vizinhança”, lamenta.

Wildeson Damião do Espírito Santo, de 27, caminhoneiro, é outro a fazer coro com Nilton. Para o profissional do volante, os problemas na via precisam ser encarados com mais seriedade pelo poder público. Não é só o Padre Eustáquio o prejudicado com a protelação das obras, mas toda a cidade. “São muitos os problemas: sinalização escondida, principalmente nas curvas; pintura que delimita a pista; buracos e as canaletas largas que jogam muitos carros para fora da estrada”, enumera. Lauro Oliveira, de 51, comerciante, que ganha a vida no entorno da Praça São Vicente. Ele vê no trecho do Anel às margens do bairro da Região Noroeste o principal problema do Padre Eustáquio. “É o que enfeia e traz insegurança ao lugar. Os roubos, as pichações e a desvalorização das residências e do comércio têm muito a ver com o inferno que é esse Anel Rodoviário. Esse adiamento é uma vergonha”, revolta-se.

Jaqueline Costa Oliveira da Silva, de 32, atravessa a rodovia pelo alto, na passarela. Faz isso ao menos duas vezes por dia, na parte da manhã, quando leva e busca o filho Lucas, de 5, na escolinha. Moradora do Bairro Califórnia, também lamenta a demora da tão esperada reestruturação, que, segundo ela, traria mudanças bem significativas para todos. Jaqueline aponta o desrespeito dos motoqueiros, que usam e abusam das passarelas, como problema grave. “A gente acaba tendo que disputar o nosso espaço, que já é pouco, com eles”, critica.

Frustração e insegurança

 

Borracheiro Lúcio viu uma família inteira morrer num acidente no anel(foto: FOTOS JUAREZ RODRIGUES/EM/D.A PRESS)
Borracheiro Lúcio viu uma família inteira morrer num acidente no anel (foto: FOTOS JUAREZ RODRIGUES/EM/D.A PRESS)
Bastam cinco minutos de conversa com o borracheiro Lúcio Reis, de 60, para ter o resto do dia abalado com tragédias que marcaram o Bairro Padre Eustáquio. Todas, claro, tendo como cenário o Anel Rodoviário. Há sete meses, por volta das 19h, depois de ouvir um estrondo muito grande, Lúcio correu para às margens da via. A cena que encontrou fez com que ele nunca mais se aproximasse de acidente algum. “Foi muito impressionante, muito triste e isso me marcou profundamente”, diz em tom embargado. Pausa para suportar a lembrança. Ao chegar ao carro arrebentado por caminhão truculento, viu mãe e três filhos presos sob as ferragens. Vida apenas num garoto de 6 anos. “Ele ainda gritava, chorava muito. Não pude fazer nada. Aos poucos, ele se calou”, conta, entristecido. Todos mortos. Sobrevivente, apenas o pai, que deixou o carro estacionado para buscar combustível. “Ao voltar, não tinha mais a família. Acho que nunca vou esquecer isso”.

Lúcio é outro que não consegue entender tanta demora para que o Anel Rodoviário seja reestruturado. “Isso é um absurdo. Não é possível que o anel, com tantos casos graves de acidentes, não seja prioridade”, considera. Na Borracharia Baú, o motorista que pede para não ser identificado entra na conversa e diz não estar insatisfeito com o adiamento das obras. Para ele, todo o anel é uma tragédia anunciada. “Pense bem: você tem quatro pistas e de repente isso cai para duas. Quem conhece o trecho vem com cuidado, mas e os carreteiros que não conhecem? Quando descobrem, já não podem fazer mais nada e vão para cima dos carros pequenos. Aí, é um desastre atrás do outro”, opina. Para o homem de 42 anos, que ganha a vida no batidão do volante, o anel é assunto de vida ou morte.


Insegurança

 

Aline mora perto do anel e teme pela segurança dos filhos.
Aline mora perto do anel e teme pela segurança dos filhos."É acidente todo dia, mais ainda no fim de semana", diz (foto: FOTOS JUAREZ RODRIGUES/EM/D.A PRESS)
Do alto da passarela, vê-se fluxo nervoso da vida sobre rodas. Veículos de todos os tamanhos, eixos e rodas fazem tremer o concreto. Lá embaixo, o cachorro morto junto à mureta que divide as mãos é mancha comum no asfalto surrado. De longe, do outro lado das sobras do corpo do animal, uma criança de barriga de fora brinca com galho seco na marginal. Mexe com a ponta do graveto qualquer coisa que não dá para ver a distância.

Próximo à passarela, a Rua Cornélio Machado, no Bairro Dom Cabral. Ruela de cerca de 50 metros, cheia de crianças. Aline Franciele, de 19, não gosta de morar ali. Teme pela segurança dos filhos e dos irmãos. É mãe da pequena Maria Eduarda, no colo, e irmã de Bárbara Regina, de 17. Juntas, trocam olhares assustados. “É ruim demais morar aqui. É acidente todo dia, mais ainda no fim de semana. A gente não tem segurança nenhuma”, reclama.

Thiago Fonseca de Lima, de 23, morador do vizinho Dom Bosco, ajudante de produção, não tem carteira de motorista. De carona, faz uso diário do anel e não esconde trauma com os acidentes que já testemunhou. Em um deles, há três anos, viu uma mulher de 35 anos, pedestre, ter a cabeça separada do corpo ao tentar cruzar a pista. Também conta ter perdido o amigo Alan, de 13, morto por atropelamento. “Aqui, tudo é muito chocante”, diz

 

 Bairro vira rota de fuga de criminosos

Dez entre 10 moradores reclamam do trânsito no Bairro Padre Eustáquio. A principal queixa são os congestionamentos das ruas estreitas que dão um nó na região. Há ainda a questão da violência, com elevados índices de roubos de carros, residências, comércio e transeuntes, segundo a Polícia Civil. Para a maior parte dos entrevistados, a localização do bairro com saídas para o anel e para a Via Expressa facilita a fuga dos criminosos. Funcionária de loja próxima à Praça São Vicente, Maria Inês, de 41, pede mais segurança e faz duras críticas ao “corredor” de motoristas que abusam do volume do som nos fins de semana.

A vendedora, que mora no vizinho Carlos Prates, aponta a ação dos pichadores como outro problema a ser combatido. Logo abaixo, na Avenida Ivaí, paredes emporcalhadas justificam a reclamação. Ponto de passagem para dezenas de bairros movimentados da periferia, o Padre Eustáquio também sofre com o barulho. “Não há como dormir com tanto movimento. Sei de cada moto, de cada fusquinha que sobe a Rua Padre Eustáquio de madrugada”, diz o aposentado Milton Gomes.

Ex-funcionário público, avô dos pequenos Maicon e Daiane, Milton também chama a atenção para o acesso às avenidas Ivaí e Abílio Machado, de tráfego intenso, que dão acesso a “bairros cheios de jovens que gostam de muita barulheira”, diz “Olhe lá”, aponta para carro velho de cano de descarga serrado que corta a Avenida Itaú sentido Praça São Vicente. “Tem também as chuvasque quando chegam aqui é uma sujeira só, além do risco que corre esse pessoal que mora perto do anel”, conclui.

 


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)