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Estado de Minas Estilo

Inspiração em Minas

Estilistas se reúnem para conversar sobre as influências da mineiridade em suas criações


01/05/2022 04:00 - atualizado 30/04/2022 23:26

Reunião
Luiz Cláudio, Renato Loureiro, Graça Ottoni e Virginia Barros (foto: Higor Barreto/Divulgação)


Existe sempre aquele momento em que um estilista vai deixar as marcas da mineiridade em sua criação. Por mais minimalista que seja, por mais que acredite que a moda é um movimento internacional, por mais que, às vezes, tema ser classificado como caricato ou regional, é impossível fugir da origem. Ser mineiro é uma história introjetada no interior de todos que partilham da cultura, valores e tradições cultivadas desde o início da província de Minas Gerais.
 
Estilistas se reúnem
Mary Arantes, Liliane Rebehy, Tereza Santos e Victor Dzenk (foto: Higor Barreto/Divulgação)
 
 
Foi esse o tema da conversa que reuniu oito nomes consagrados do cenário fashion de Belo Horizonte em torno dos painéis Moda e Mineiridade – Criadores Mineiros, realizados no Memorial Minas Gerais Vale durante duas noites, com mediação desta jornalista. “No Ano da Mineiridade, a Secretaria Estadual de Cultura e Turismo ressalta a importância de estabelecer um diálogo propositivo junto ao setor, de forma a valorizar e promover a moda enquanto representação da identidade mineira”, explica Natalie Oliffson, diretora de articulação e integração cultural e gestora do Circuito da Liberdade, idealizadora da ação.
 
bordados
Tecidos preciosos e bordados da Apto 03 (foto: Higor Barreto/Divulgação)
 
 
A primeira mesa foi formada por Terezinha Santos, Mary Arantes, Victor Dzenk e Liliane Rebehy. Pioneiros do mercado, os três primeiros começaram seus trabalhos nos anos 1980 e contribuíram decisivamente para consolidar o polo fashion de Beagá com suas atuações nos eventos mais importantes do Brasil. Liliane, diretora criativa e proprietária da Coven, chegaria nos anos 1990 com uma produção centrada no tricô.
 
Vestido
Detalhe look Renato Loureiro (foto: Higor Barreto/Divulgação)
 
 
Para Terezinha Santos, o momento mineiridade mais efetivo da Patachou, marca que comandava na época, foi com a coleção inspirada no trabalho de Amílcar de Castro, exibida na São Paulo Fashion Week (SPFW). Liderada por ela, a equipe de estilo mergulhou no universo do artista para criar shapes minimalistas e esculturais, tais como as esculturas de Amilcar, além de uma paleta pensada no mesmo conceito. “Seu traço gestual em preto e branco estava até na passarela executada pelo arquiteto mineiro João Diniz”, lembrou.
 
Coven
Coven e a coleção inspirada no Vale do Jequitinhonha (foto: Higor Barreto/Divulgação)
 
 
No caso da Coven, o Vale do Jequitinhonha foi tema do inverno 2019 por um acidente de percurso bem-sucedido. Liliane contou que visitou o Vale do Jequitinhonha e se deparou com a preciosidade dos trabalhos das bordadeiras e das tecelãs, cujos bordados adornaram a linha de t-shirts e da camisaria em tricoline. A confecção de colchas no tear manual do Vale guiou a criação de listras, cores matizadas por fios em mesclas e texturas. 
 
As tonalidades próprias da região entraram na cartela de cores e a estamparia ganhou forma por meio dos desenhos de Diogo, filho de uma das bordadeiras. As árvores e o burro desenhados por ele foram diretamente para as peças. “Foi a primeira vez que busquei um tema genuinamente mineiro para criar uma coleção da Coven, tudo dentro da visão particular da marca”, afirmou.
 
Bijoux
Bijoux de Mary Arantes (foto: Higor Barreto/Divulgação)
 
 
Já Victor Dzenk se encontrou com a mineiridade quando se debruçou sobre o barroco. “Todo estilista sempre está em busca de um tema para desenvolver e, nesse momento, eu o encontrei numa estampa de fundo de um dos oratórios colecionados por Ângela Gutierrez”. O print, que misturava flores, fragmentos de talhas e volutas, foi um dos mais bonitos e comerciais concebidos por Victor, valorizando, sobretudo, vestidos muito femininos.
 
Nascida em uma família simples de Rio do Prado, no Vale do Jequitinhonha, Mary Arantes aprendeu desde cedo a usar as mãos para criar a partir de objetos inusitados. Comandou a Mary Design durante quase 40 anos e continua inventando moda na vida. Exuberância, extravagância, opulência estão no seu vocabulário, assim como as palavras feito a mão e artesanato.
 
“Sou over”, confessou a estilista que, durante o evento, leu  “Tempos modernos – Manifesto ao apreço”, no qual aborda sua opção pelo artesanal, nadando contra a corrente do industrial. “Sempre quis oferecer bijus que tivessem permanência e menos modismos... nós, mineiros, temos em nossa memória esse saber fazer, cujas mudinhas estão acabando. Fiz do tecido a minha morada, enviesei panos, enveredei por labirintos de rendas, fuxicos e crochês...”, afirmou no longo texto, repleto de considerações sobre a pressão do mercado da moda atual.   

Autorais A segunda mesa foi composta pelos veteranos Renato Loureiro e Graça Ottoni, contemporâneos da década de 1980, e contou ainda com a presença de Luiz Cláudio, diretor criativo da Apartamento 03, e da designer de calçados Virgínia Barros. Os dois últimos são da geração 1990 e têm desenvolvido uma parceria nos desfiles da SPFW. Ambos são também criadores natos, desenvolvendo coleções reconhecidamente autorais.
 
Luiz Cláudio tem uma ligação estreita com os tecidos, uma verdadeira fascinação que remete à tradição têxtil de Minas Gerais, cuja história remonta às rocas de fiar. “Gosto de adornar a roupa, sempre existe a possibilidade de colocar mais algum elemento, um bordado, um babado”, ele explicou. A desconstrução da matéria-prima ou o uso inusitado dessas bases nas criações é o seu maior diferencial.
 
Virgínia, por sua vez, partilha da mesma veia criativa. Já fez sapato de papelão, casca de bananeira, tecidos, e uma das suas coleções mais mineiras homenageou as espécies nativas da Serra do Cipó. “Faço calçados para pessoas e gosto de criar o que me agrada”, ela diz, confessando que é obcecada por novas formas e formatos.
 
Graça Ottoni, por sua vez, é exemplo de criadora autoral. Natural de Teófilo Otoni, abandonou um emprego seguro na área de estatística para iniciar um negócio na moda, na garagem da sua casa. Se no começo as roupas eram elaboradas a partir de patchworks e tinturadas artesanalmente, tempos depois a produção da marca – que se tornou conhecida nacionalmente pelos belos desfiles no Fashion Rio – seguiu o mesmo conceito handmade. Para Graça, não existem regras: já fez estampa inspirada em tela de artista, adora os bordados manuais, os alinhavados, mistura materiais e texturas, elege o tricô manual. Tudo isso faz parte de seu repertório em mais de 40 anos de mercado.
 
Considerado um mestre pelas novas gerações, Renato Loureiro, formado em administração de empresas, foi outro que abandonou o cargo de CEO no escritório local da L’Oreal para se dedicar à moda. O estilista, que não aprecia muito a terminologia moda mineira, argumentando que moda é algo internacional, na verdade sempre lançou técnicas bem disseminadas em Minas, como os fuxicos e os patchwork, para diferenciar seu trabalho na grife homônima, que conduziu durante longo tempo. 
O momento em que essa adesão se tornou mais evidente foi quando conheceu o precioso bordado temático da artista Maria Amélia. A partir daí, foi formada uma parceria que resultou em uma coleção e desfile no SPFW. “Conheci seus estandartes em uma exposição na sala multiuso do jornal Estado de Minas e fiquei encantado.  Quando a procurei, a convenci a fazer uma dobradinha comigo e deu muito certo”. Sim, a dobradinha deu o que falar.


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