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Estado de Minas Homenagem

Roupa escultural

Fábrica mineira de jeans conecta moda e arte em coleção que explora modelagem estruturada, volumes e misturas de lavagens


30/05/2021 04:00 - atualizado 29/05/2021 22:52

(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)


Jeans como você nunca viu. Na nova coleção da Cedro Têxtil, o tecido normalmente associado a calça e jaqueta se transforma em peças surpreendentes. Usando como referência vários artistas, como a belo-horizontina Lygia Clark, a fábrica mineira apresenta a roupa ora como escultura, com volumes e modelagens bem-estruturados, ora como tela, com blocos de cores que se unem geometricamente. Vestido de festa, blazer, jardineira e outras criações servem de inspiração para o mercado.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 
 
A coleção Sentidos marca as mudanças de rumo da Cedro Têxtil. Mesmo antes da pandemia, o plano era trabalhar com um único grande lançamento no ano, seguido por outros menores. “Já estávamos planejando também investir no on-line para atingir os clientes de maneira mais rápida e objetiva e desenvolvemos na pandemia o book e o showroom digitais”, complementa o estilista Eduardo Paixão. Neles, os lojistas têm acesso virtualmente a fotos, dados técnicos, informações de moda e editoriais.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 

A palavra sentido, que dá nome à coleção, pode ser entendida de várias formas. Tanto se relaciona aos cinco sentidos do corpo humano (tato, visão, paladar, audição e olfato) quanto a uma direção que se escolhe seguir. Ainda carrega o significado de encontrar propósito para alguma ação.
Considerando estas múltiplas interpretações, a equipe de estilo buscou inspiração em artistas e obras de arte que, de alguma forma, interferem na nossa percepção sobre o mundo.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 
 
Entre eles, a mineira Lygia Clark, uma das integrantes do Grupo Frente, que difundiu o movimento construtivo pelo país. “Uma característica interessante da obra da Lygia Clark é nunca ser definitiva ou acabada. Depende do contato das pessoas para ganhar vida”, comenta. O estilista destaca a série Bichos. As esculturas, formadas por chapas metálicas com dobradiças, se movimentam indefinidamente e se transformam de acordo com a vontade de quem a manipula.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 
 
Abraham Palatnik, colega de Lygia Clark no Grupo Frente, é mais uma referência da coleção. O engenheiro ficou conhecido por criar esculturas movidas através de engrenagens e telas coloridas que exploram luzes para criar uma ilusão de ótica. Outra inspiração vem da obra de Victor Vasarely, artista que nasceu na Hungria e viveu na França, considerado o pai da optical art. Suas pinturas, baseadas em formas geométricas, enganam o olhar e dão a sensação de que estão se mexendo.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 
 
E como tudo isso se transporta para a roupa? Através de modelagens estruturadas e volumes escultóricos. Na coleção, encontramos mangas amplas, ombros marcados e muitos babados. Como exemplo, a presença de rufos, babados construídos a partir da dobradura de tecido (neste caso, fita de jeans), que adornam o pescoço. A gola volumosa, muito comum na realeza, era sinônimo de poder.
Para um lado mais minimalista, podemos citar o vestido que se conecta com elementos do japonismo. Tem cara de quimono, mas não de forma óbvia. A parte de baixo é mais justa, as mangas são bem amplas e o decote em V profundo mostra feminilidade. “Pensamos em um design muito limpo e construímos o volume pelo próprio corte do tecido.” Parece mesmo uma dobradura.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 
 
O uso do jeans realmente surpreende nesta coleção. Além de babados e volumes, franjas feitas de passantes de calça, que são aquelas alças com a função de posicionar o cinto no cós, formam um vestido. As tiras foram cortadas e aplicadas uma a uma. A peça pode muito bem ser usado em uma festa. Da mesma forma, o vestido com babados em todo o seu acabamento, da barra assimétrica à gola. “Usamos para fazer este vestido de festa um tecido leve, que normalmente viraria camisa”, aponta.
 
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
(foto: Marcio Rodrigues/Divulgação)
 
 
Apesar de toda a estrutura, as peças não se distanciam do conforto. A maioria tem shapes mais amplos justamente para não gerar incômodo. “O momento que vivemos pede roupas de ficar em casa, típicas de home office, que privilegiam o conforto, mas elas acabam indo para as ruas”, explica o estilista. A calça pantalona, a saia longa plissada e a jardineira são bons exemplos.

CONFORTO Perseguindo o máximo de conforto, a Cedro traz uma novidade exclusiva nesta coleção: o denin FitsYou, desenvolvido em parceria com a Lycra, que une resistência e elasticidade. Por ser um fio mais robusto, a sensação é de usar uma peça feita sob medida, pois se ajusta bem ao corpo, mas não a ponto de dificultar qualquer movimento. Pelo contrário, entrega bastante mobilidade.
A arte também se expressa no jogo de cores do jeans em uma única peça. O vestido estilo quimono combina três tonalidades, criando um interessante contraste. Já a jardineira, cheia de recortes, coloca lado a lado um jeans bem claro e outro bem escuro, que são lavados separadamente. Isso traz a ideia de bloco de cores, que podem ser identificadas nas pinturas de Lygia Clark e de Victor Vasarely.
 
A referência fica mais evidente em um look de sarja. A blusa combina cinza e amarelo. Por cima, um blazer branco que chama a atenção pelo ombro. As dobras no tecido criam um volume intencionalmente exagerado, que remete à proposta escultórica da campanha (as modelos, se observar, estão paradas como estátuas). Como uma obra de arte, a roupa é para ser contemplada.
De modo geral, segundo Eduardo, a preferência tem sido pelo jeans autêntico, em sua cor original, que é aquele azul bem escuro. Ele é chamado de jeans raw, que em português significa cru. “A impressão é de que nem passou pela lavanderia, foi direto para o corpo. Na verdade, ele passa só pelo amaciamento para que tenha um toque agradável”, pontua. Ainda sobre lavanderia, destaque para os desgastes localizados, privilegiando pontos comuns de atrito, como joelhos, cotovelos e bolsos.
 
 
(foto: Arquivo pessoal)
(foto: Arquivo pessoal)
 
A "propositora" 
 
Mineira como a Cedro Têxtil, Lygia Clark (1920 – 1988) saiu de Belo Horizonte para revolucionar a arte contemporânea. No Rio de Janeiro, iniciou seus estudos sob a orientação de Burle Marx. Passou também uma temporada em Paris, onde fez sua estreia com uma exposição individual.
 
Ao longo da carreira, a belo-horizontina questionou padrões que permeiam o universo da arte. Lygia não gostava de ser chamada de artista, sempre se intitulou “propositora”. Vanguardista, ousou usar a moldura como parte de suas telas. Assim, criou o que definiu como “linha orgânica”, espaço entre a moldura e a pintura, numa tentativa de mostrar que o quadro seria um objeto tridimensional.
 
A forma de se expressar através da arte foi mudando com o tempo. Lygia começou pelas pinturas, depois se dedicou às esculturas. Mais tarde, decidiu propor experimentações sensoriais, nas quais o espectador não se coloca apenas no lugar de contemplar. Ele passa a fazer parte da obra, “emprestando” o seu corpo e participando ativamente da criação.
 
A série “Bichos” (1960), que inspirou a coleção da Cedro Têxtil, de fato é uma de suas obras mais populares e que bem exemplifica a sua vontade de colocar o espectador como prota- gonista. Mas podemos citar outras tantas, como “Túnel” (1973), em que as pessoas percorrem um tubo de pano de 50 metros de comprimento, arrastando-se pelo chão, até sair pelo outro lado, numa referência ao nascimento.
 
A obra de Lygia Clark ganhou reconhecimento internacional e integra o acervo de importantes museus pelo mundo. Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio), Museu de Arte de São Paulo (Masp) e Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) são alguns dos exemplos. A Associação Cultural Lygia Clark conta com mais de seis mil imagens e 15 mil folhas de documentos ligados a ela.
Como resumiu a própria Lygia Clark fazendo uma retrospectiva da sua trajetória, “todo o meu processo foi uma tentativa de reunir a arte e a vida.” 


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