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Estado de Minas

Salvador de vidas e realizador de sonhos

Força de vontade, coragem e persistência levaram o jovem do interior a realizar seus ideais


postado em 28/07/2019 04:23

(foto: alexandre guzanshe/em/d. a press)
(foto: alexandre guzanshe/em/d. a press)


Exemplo de coragem e determinação, o médico e empresário José Salvador Silva, saiu do interior, sofreu bulling, enfrentou alguns fracassos, mas conseguiu, com muito trabalho, vencer na vida. Nunca parou de sonhar e conseguiu realizar tudo o que almejou, desde a cura do câncer de colo uterino à construção de não apenas um hospital, mas quatro. Sempre muito estudioso, percebeu a importância de estruturar a família e a empresa para um sistema de sucessão, a fim de que sua obra perpetuasse. Virou modelo e case de sucesso. Em agosto, começa a obra do quinto Hospital Mater Dei, em Salvador, na Bahia.
 
Quando veio para Belo Horizonte?
Nasci em Santana do Pirapama, pequena cidade próxima a Curvelo, Diamantina e Serro. De lá fomos para Baldim e em 1946 nos mudamos para Belo Horizonte.

É verdade que trocaram seu sobrenome?
Sim. Meu avô paterno se chamava Antônio José Sabino, e quando foi registrar meu pai, o escrivão de Pirapama, que era parente direto da Chica da Silva, o convenceu a trocar o Sabino por um sobrenome mais bonito, moderno e atual: Silva. Meu avô concordou. Na prática, a família continuou sendo conhecida por Sabino.

São quantos irmãos?
Somos oito. Sou filho do segundo casamento de meu pai. Ele se casou com Amável, que morreu após o parto da primeira filha, Corina. Aí se casou com a cunhada Maria Salvador – minha mãe –, mais conhecida como Lilia, e tiveram sete filhos. Minha mãe vinha de Dom Joaquim, perto do Serro. Estudou em Conceição e foi minha primeira professora na Fazenda Santa Cruz. Foi ela quem me ensinou a ler e a escrever. O mais impressionante é que a história da família da minha mulher, Norma, é igual à minha. A mãe dela, Maria Pia, morreu no puerpério, em Feira de Santana, na Bahia, pouco depois do nascimento de Norma. Seu pai voltou viúvo para Januária e também se casou com sua cunhada Julieta. Acredito que as histórias dessas mortes tão próximas podem ter influenciado minha decisão de ser ginecologista e obstetra.

Passou a infância em uma fazenda?
Meu pai era comerciante em Pirapama e em 1935 fechou o armazém e nos mudamos para a Fazenda Santa Cruz, em Baldim. Não conhecia jornal e nem rádio. Televisão não existia. Foi lá que conheci e me apaixonei pela música, quando aos 7 anos vi a banda de música da cidade. Essa paixão me estimulou anos depois a tentar entrar para a banda de música do Colégio Dom Bosco. Comecei tocando bombardino e depois passei para o piston.

Por que foi para o Dom Bosco?
Disseram para os meus pais que o ensino lá era muito bom. De fato era, mas também era famoso pela rigidez na disciplina. Toda família de Belo Horizonte que tinha filhos problemáticos, indisciplinados, viciados, difíceis, que não estudavam e eram chamados de “juventude transviada”, internava esses filhos no Dom Bosco ou no Caraça. Foi lá que meu irmão Geraldo e eu, dois ingênuos, puros, simples, bem- comportados, convivemos com essa turma da pesada.

Como era lá dentro?
Uma verdadeira prisão. Levantávamos às 5h, tomávamos banho com água gelada. Assistíamos a cinco missas longas e burocráticas na igreja do colégio. Eu e o Geraldo, dois frangos caipiras, ingênuos, tímidos, éramos ridicularizados e humilhados.
Sofreu bulling. Como enfrentou isso?
Foram muitas brigas e lutas para sobreviver. O ambiente hostil, agressivo e difícil nos fortaleceu e nos preparou para as grandes lutas e batalhas para toda a vida. Padre Antônio Vieira, grande escritor e o maior orador sacro da língua portuguesa, era débil mental e não conseguia aprender nada. Um dia, sentiu um estalo na cabeça, uma luz iluminou seu cérebro e se tornou superinteligente. Ele era minha inspiração. Eu rezava para ter este estalo, que depois descobri que tinha nome: desejo. Ao desejo eu acrescentaria mais duas condições fundamentais e mágicas: nunca desistir e persistir sempre.

Quantos anos ficou no Dom Bosco?
Três. Depois fui estudar no Colégio Anchieta, em Belo Horizonte, onde conheci o José Helvécio, que se tornou um amigo para toda a vida. Ele foi competente e dedicado diretor administrativo do Mater Dei por mais de 30 anos. Nos dois anos de científico eu trabalhava o dia todo em uma empresa de seguros e estudava de noite.

A vida de estudante foi bem difícil, não é?
Não foi nada fácil. Morávamos na Lagoinha e íamos para o colégio a pé, de bonde ou de ônibus. Descobri muito cedo que as pessoas que viajam em um ônibus superlotado, espremido, desconfortável, de pé, e as que passam ao lado em um automóvel confortável viviam em planetas diferentes.

Como surgiu o interesse em fazer medicina?
Sempre fui sonhador e queria estudar muito e sempre. Não tinha médicos na família, fui o primeiro. Admirava o trabalho dos médicos da região, achava um trabalho bonito, inspirador. O sonho de ser médico era, e sempre foi, um estímulo para estudar.

Como conseguiu se preparar para o vestibular sem tempo de estudar?
Parei de trabalhar no terceiro científico para me concentrar no vestibular. Levantava diariamente às 3h, junto com o colega e amigo José de Castro Abreu. Não fizemos cursinho, estudávamos sozinhos. Fizemos o vestibular em 1951, e passamos na UFMG e na Ciências Médicas, que começava o curso naquele ano. Também passamos no concurso para escriturário da Prefeitura de Belo Horizonte. Fomos transferidos para o Hospital Municipal, que era dirigido pelo dr. Odilon Behrens, nome que o hospital passou a ter após sua morte.

Trabalhava e estudava?
Sim. Trabalhava na recepção do hospital. Era recepcionista mesmo. Depois consegui transferência para o laboratório. Fiz residência médica completa trabalhando em tempo integral na área de ginecologia e obstetrícia chefiada pelo dr. Henrique Machado Horta, meu grande mestre. Naquela época, o Hospital Municipal tinha um grande movimento porque, além dos funcionários da PBH, atendíamos indigentes, e várias empregadas domésticas, que depois nos indicaram para suas patroas. Trabalhava muito mesmo, com energia e entusiasmo. Até meus 30 anos não sabia o que era cansaço. Dormia umas 4 ou 5 horas por noite. Fiquei 12 anos sem tirar férias.

Quando conheceu Norma?
Na Faculdade de Medicina. Fomos colegas. Ela sempre foi linda. Começamos a namorar. Quando estávamos no sexto ano de medicina tínhamos um grande sonho, fazer uma viagem à Europa, mas ninguém tinha recursos para isso. Formamos um grupo de 20 colegas e decidimos vender rifa de um Ford novo, azul, 1956, que compramos. Norma foi passar férias em sua cidade e seu pai, Armando Moraes, em uma manhã vendeu 200 bilhetes em uma feira de gado, na maior facilidade. Se tivesse 500 teria vendido. Depois que nos casamos e os filhos nasceram – Henrique, Maria Norma, Renato e Márcia –, nas férias iam para a fazenda de seus pais e eu ficava aqui, trabalhando.

E como foi a viagem à Europa?
Saímos do Rio de Janeiro, de navio. Viajamos na terceira classe, nos porões do navio. Só se via água e peixes pelas janelas dos quartos. Durante a viagem li os 10 volumes da História da civilização, de Will Durant. A viagem foi de 45 dias, 19 de navio ida e volta, e 26 rodando de ônibus por 10 países, num total de 10 mil quilômetros de asfalto. Isso é exemplo de empreendedorismo.

Fez outra viagem internacional 
durante a faculdade?
Internacional não, mas depois de conhecer as maravilhas da Europa decidi conhecer o Vale do Jequitinhonha. Pude comparar o grande progresso, o desenvolvimento econômico, o luxo exagerado da Europa com o pobre contraste do Jequitinhonha. O subdesenvolvimento, carente, desnutrido e contaminado por doenças endêmicas. De novo parecia que tinha visitado planetas diferentes.

Qual o seu hobby?
Ler. Todas as pessoas conscientes precisam ler muito, principalmente o médico, para atender e compreender bem as necessidades dos clientes. Todo médico precisa ter uma cultura geral humanística ampla, para atender bem o cliente com empatia e compaixão. Na consulta o médico avalia o cliente e vice-versa. Aquele que só medicina sabe, nem medicina sabe. O hábito de leitura deve ser estimulado. Todos os anos, seis meses antes do meu aniversário, pedia aos filhos um presente: ler um livro previamente escolhido por nós. No almoço de comemoração cada filho analisava, elogiava, criticava ou depreciava o livro escolhido. Era também um aprendizado e treinamento para aprender a falar em público.

Você sempre teve muitos sonhos. Quais eram seus sonhos como médico?
Descobrir a cura do câncer, acabar com a dor do parto e construir um novo hospital em Belo Horizonte.

Conseguiu realizar todos eles?
A cura do câncer do colo uterino é possível com o diagnóstico precoce através da colposcopia e colpocitologia. Colposcópio fabricado na Alemanha custava 50 mil cruzeiros naquela época. Fui tentar um empréstimo em um tradicional banco daquela época, Banco Gontijo, e apesar de o diretor ser nosso conhecido, negou o empréstimo. Procurei meu vizinho, o Antônio de Matos, dono de Armazém na Floresta, contei emocionado minha história e ele, com empatia emprestou-me o dinheiro na hora. Comprei os dólares e o José Helvécio, que ia à Europa, trouxe o equipamento. Até então só existia um colposcópio em Minas, que era do professor da UFMG Alberto Henrique Rocha. O nosso foi o segundo e está até hoje no consultório de Norma, Márcia e Maria Norma. Diagnosticamos inúmeros carcinomas iniciais, com 100% de cura. Sobre acabar com a dor no parto, todos os medicamentos de analgesia medicamentosa no parto devem respeitar três princípios: não prejudicar a mãe, nem a criança, nem o trabalho de parto. O que ninguém tinha conseguido proporcionar até então. Nosso espírito empreendedor sugeriu que ligássemos concomitantemente na veia da parturiente um soro fisiológico ou glicosado e colocasse nele uma ampola de ocitócio, que não deixava as contrações uterinas paralisarem. Foi um sucesso. Vieram médicos de todo o país para aprender anestesia no parto, mas a mãe dormia. Pouco tempo depois, o anestesista José Elísio Corrêa Lima introduziu no Mater Dei a anestesia peridural. Nossa clínica passou a ser a maior de Belo Horizonte.

A construção do hospital foi a
maior realização?
Depois de três fracassos conseguimos construir não apenas um, mas quatro hospitais, e em 22 de fevereiro de 2022 vamos inaugurar o quinto Mater Dei, em Salvador, na Bahia.

Quais fracassos?
Quem é empreendedor tem que estar preparado para o fracasso, saber dar a volta por cima, não desistir e partir para outra. Desejo, não desistir nunca e muita determinação. O primeiro fracasso foi a tentativa frustrada de fundar o Hospital Samaritano, na Lagoinha, com um grupo de médicos do Hospital Municipal. O segundo, tentar comprar o Hospital Vera Cruz, junto com o dr. Henrique Horta, para transformá-lo em maternidade. Convocamos ginecologistas e obstetras para entrarem conosco, mas na reunião, um médico da Santa Casa desestimulou  todos. O terceiro fracasso foi a construção do Hospital Santa Mônica, hoje Belo Horizonte, na Avenida Antônio Carlos. Nunca fui diretor de lá. Era muito mal administrado, atendia mal os clientes e tinha muitos erros estratégicos. Aprendi muito com os erros e suas consequências.

O último sonho deu certo.
Sim. Um sonho grande precisa ser compartilhado para se tornar ideal de muitas pessoas. Este foi o maior segredo do Mater Dei: compartilhar o sonho, virou força telúrica estimulante e viva. Arrematamos o terreno em leilão público em novembro de 1972. Começamos a construção em 1976 e inauguramos o primeiro hospital, na Rua Gonçalves Dias, em 1º de junho de 1980. Anos depois, construímos o Mater Dei da Rua Mato Grosso, unindo as duas unidades. Há alguns anos inauguramos o Mater Dei da Avenida do Contorno, e este ano foi a vez do Mater Dei Betim/Contagem.

Fale do programa de sucessão.
Em 1995, fomos fundadores do primeiro PAEX da Fundação Dom Cabral. Fomos informados de que somente 10% das empresas sobrevivem à terceira geração, as demais vão à falência ou desaparecem. Foi um alerta. A partir daí, criamos nosso processo sucessório com a Dom Cabral e o professor Elismar Álvares, que é exemplo para muitas empresas. Três filhos estão na direção – o Henrique é o presidente, e apenas quatro netos (um de cada família) podem ser diretores. Os netos que optaram pela direção precisam trabalhar antes nos melhores hospitais do Brasil. Posteriormente, têm que fazer MBA em universidades de ponta dos Estados Unidos ou Europa. José Henrique, Felipe e Renata já cumpriram todas as fases necessárias e já são diretores. Lara se prepara para esta realização em futuro próximo. É importante dizer que a pessoa mais importante na Rede Mater Dei de Saúde é o nosso cliente. 


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