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Estado de Minas O PETRÓLEO E A AGRICULTURA

Pequenos produtores de cidades mais pobres sofrem com alta dos combustíveis

O impacto da alta dos preços de combustíveis chegou ao campo, mas pequenos produtores do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha sentem mais os efeitos


17/04/2022 04:00 - atualizado 18/04/2022 15:48

Com o recente aumento do preço da gasolina, os moradores dos municípios mais pobres e isolados do estado, situados no Norte de Minas e no Vale do Jequitinhonha, estão pagando mais caro pelos derivados de petróleo do que a população de cidades mais ricas como Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, que tem o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de  Minas Gerais,  de 0,813. O custo elevado dos combustíveis nos municípios de baixa renda, mostrado pelo Estado de Minas, tem peso maior ainda para os responsáveis por levar alimentos à mesa dos moradores desses lugares: os pequenos produtores. Criado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o IDH é baseado nos indicadores de educação, saúde e renda. 

 

Em Ibiracatu, no Norte de Minas, o litro de gasolina está custando R$ 8,08; já o do óleo diesel, R$ 7,48
(foto: Hiane Magalhães/divulgação)

 

Os agricultores familiares são impactados pelo aumento dos combustíveis por várias vezes: quando deslocam até a área urbana para vender a produção ou para fazer compras; e também com o reajuste dos preços dos insumos agrícolas, que têm em sua composição matéria-prima oriunda do petróleo. Por serem perecíveis, os hortifrutigranjeiros necessitam ser enviados rapidamente para o mercado consumidor, não podendo ser estocados, o que eleva o custo da logística.  A alta dos combustíveis dificulta a vida dos pequenos produtores dos municípios de baixo IDH e também do Projeto Jaíba, maior perímetro irrigado da América Latina, situado no município homônimo, no Norte de Minas. 

 

Um dos que sofrem na pele o problema é José Pedro Aguilar Viana, de 51 anos, agricultor familiar de Coronel Murta (9,2 mil habitantes), cujo IDH é  0,627, no Vale do Jequitinhonha, onde o Estado de Minas encontrou a gasolina mais cara no estado: em um posto, R$ 8,49, um real a mais do que valor comum cobrado em Belo Horizonte; e em outro, a R$ 8,59. Na semana passada, um dos postos da cidade “baixou” o preço da gasolina para R$ 8,29 o litro, numa “promoção”. O litro do óleo diesel em Coronel Murta está custando R$ 7,59. 

 

José Pedro tem uma pequena propriedade na localidade de Lorena, distante sete quilômetros da área urbana  de Coronel Murta. Ele não  possui  carro próprio: “Só tenho uma motinha”, diz. Por isso, precisa pagar o frete de um  veículo particular toda vez que se desloca até a cidade para vender seus produtos, comprar matérias-primas ou cuidar de outros compromissos. 

 

“O preço do combustível aumentou demais. Quase todo o dinheiro que a gente  fatura está indo embora no frete”, reclama o agricultor de Coronel Murta, que também fornece verduras e hortaliças para a merenda escolar, por meio do Programa de Aquisição de Alimentos do governo federal. Ele disse que depois do último reajuste dos combustíveis está pagando em torno de R$ 70 pelo transporte entre Lorena e a sede de Coronel Murta.

 

Coronel Murta 9,2 mil habitantes IDH: 0,627
"O preço do combustível aumentou demais. Quase todo o dinheiro que a gente fatura está indo embora no frete", José Pedro Aguilar Viana, de 51 anos, produtor em Coronel Murta, no Vale do Jequitinhonha (foto: Arquivo pessoal)

 

 “Antes,  eu pagava de R$ 25 a R$ 30 de frete”, afirma José Pedro, que tem um terreno de 10,24 hectares e faz o plantio de feijão, hortaliças e frutas em uma área de 3 hectares.  O cultivo é viabilizado pela água de uma nascente  na propriedade do pequeno agricultor, recuperada há poucos anos em programa ambiental apoiado pelo Serviço de Aprendizagem Rural (Senar). 

 

Planejamento Outro pequeno produtor que sofre os efeitos da alta dos derivados de petróleo é Manoel Lopes de Oliveira, de 60, morador de Bonito de Minas, de 11,5 mil habitantes , município norte-mineiro que tem o terceiro pior  IDH (0,537) de Minas Gerais. O litro da gasolina está sendo vendida a R$ 7,85 na cidade, enquanto o preço do litro de  óleo diesel é R$ 7,35.  

 

Manoel tem uma propriedade de 14 hectares, na localidade de Barreiro Mato, a oito quilômetros da área urbana de Bonito de Minas. Ele se desloca até à cidade, em média, três vezes por semana e faz entregas de casa em casa, vendendo frango caipira, mel, verduras, folhas verdes e outros produtos.  

 

Os deslocamentos são feitos em uma motocicleta, adaptada para o transporte dos hortifrutigranjeiros. “Eu estava pensando em comprar um carro. Mas acabei desistindo da ideia. A gasolina está cara demais”, afirma o agricultor familiar. 

 

Manoel também é apicultor e usa moto para outras atividades do seu dia a dia, como na captura de abelhas no campo. Ele disse que “não tem noção de quanto desembolsa no posto de combustíveis. Mas calcula que gasta em torno R$ 40 por semana com gasolina. “Mas sempre eu vou a Januária (48 quilômetros de Bonito de Minas). Aí, a gente tem que gastar mais ainda com o combustível”, acrescenta o pequeno produtor. 

 

bonito de minas 11,5 mil habitantes IDH: 0,537
"Toda vez que fazemos uma viagem, a gente precisa planejar e aproveitar ao máximo para não ter prejuízo", Manoel Lopes de Oliveira, de 60 anos, agricultor e apicultor em Bonito de Minas, na região Norte do estado (foto: Arquivo pessoal)

 

“Com a alta da gasolina, toda vez que fazemos uma viagem para vender alguma coisa, a gente precisa planejar direito e aproveitar ao máximo a viagem para não ter prejuízo”, afirma Manoel de Oliveira. “Se o preço do combustível continuar subindo e não baixar, não vai ter como a gente trabalhar”, completa o agricultor familiar. 

 

‘Sem saída’ O reajuste dos derivados de petróleo também trouxe complicações para os pequenos agricultores de Ibiracatu, de 5,4 mil habitantes e com IDH de 0,591. O litro de gasolina na cidade está custando R$ 8,08, enquanto o preço do litro de óleo diesel é R$ 7,48. 

 

“O impacto que a gente teve com o aumento do preço dos combustíveis foi alto demais. A renda nossa está sendo muito pouca. Ficamos sem saída”, lamenta Valdineide Gonçalves Mendes dos Reis, de 52, pequena produtor da localidade de Bamburral, na zona rural de Ibiracacatu. Todas as sextas-feiras, ele se desloca de carro 15 quilômetros, do seu sítio até à cidade, para vender hortaliças na feira livre promovida pela prefeitura. 

 

Ibiracatu 5,4 mil habitantes IDH: 0,591
"Com o aumento do preço dos combustíveis, o custo das nossas viagens dobrou de seis meses prá cá", Reinaldo Rodrigues Ferreira, de 30 anos, produtor em Ibiracatu, no Norte de Minas (foto: Arquivo pessoal)

 

Ainda em Ibiracatu, o agricultor familiar Reinaldo Rodrigues Ferreira, de 33, da comunidade de Tabuas, vai até à área urbana (distante 10 quilômetros de sua propriedade) uma vez por semana para vender mandioca, laranja, limão e outras “coisas da roça”. Nos deslocamentos, usa uma motocicleta, veículo mais econômico. 

 

Mesmo assim, Reinaldo reclama da alta da gasolina. “A nossa margem de lucro com a venda dos produtos reduziu 50 por cento. Com o aumento do preço dos combustíveis, o custo das nossas viagens dobrou de seis meses prá cá”, alega o sitiante. 

 

Conta chega ao consumidor

 

Os impactos  do reajuste dos combustíveis têm efeito cascata, atingindo os comerciantes de frutas e verduras e chegando ao consumidor final. O reflexo é maior em produtos típicos de determinadas regiões do país e que são transportados por longas distâncias até chegar ao consumidor final em Minas – por isso, tem  maior custo de frete. Isso ocorre com a  maçã (que vem do Rio Grande do Sul) e com o melão, produzido no Rio Grande do Norte, por exemplo. 

 

O  empresário Ricardo Nunes Costa, que trabalha com a venda de frutas e verduras no atacado e no varejo, em Montes Claros, afirma que depois do último reajuste dos combustíveis houve uma elevação de de 10% a 15% dos preços de vários produtos nos sacolões. As maiores altas foram da cenoura, da beterraba, da batata inglesa e do mamão. 

 

O comerciante salienta que o reflexo do aumento dos combustíveis no preço das  frutas e verduras é maior nas regiões como o Norte de Minas, que não conseguem produzir o suficiente para atender a demanda e que dependem das mercadorias “importadas” de outras partes do estado e do país.  

 

A empresa dele faz o transporte em caminhões próprios  e reclama do aumento dos custos em decorrência da disparada nos preços dos derivados de petróleo. “Há meses, o frete da maçã de Vacaria (RS) até Montes Claros era R$ 5,80 e agora passou para R$ 10 a caixa. O frete da batata inglesa do Triângulo Mineiro até o Norte de Minas custava R$ 8 e passou para R$ 10.”

 

Ricardo Nunes afirma que, muitas vezes, os comerciantes do setor de frutas e  verduras não conseguem repassar o aumento do custo do frete para o preço final das mercadorias. “Estamos em um mercado competitivo. Quando aumenta o preço dos  combustíveis, os produtores, tanto os grandes quanto os pequenos, têm um custo de produção elevado. Nós (comerciantes) também perdemos competitividade e margem de lucro. Já o consumidor tem reduzido o poder de compra. Então, todos saem perdendo”, conclui o empresário de Montes Claros. 

 

Ricardo Nunes Costa lembra que os  alimentos in natura são perecíveis. Por essa razão, não podem  ser estocados e precisam ser colhidos quanto atingem o ponto de maturação e de colheita, devendo ser transportados imediatamente até os pontos de venda. “Essa condição acarreta maiores deslocamentos e mais despesas com frete dos alimentos in natura, que são diferentes, por exemplo, de determinados produtos industrializados, que podem ficar meses estocados ou esperar meses para serem transportados”, explica o comerciante. 


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