São Paulo – O plano da Venture Capital Investimentos (VCI) tinha tudo para passar por chuvas e trovoadas. Ao decidir licenciar a marca Hard Rock Hotel para o Brasil, seus sócios trombaram com uma das mais graves crises econômicas da história. O planejamento começou há cinco anos, quando a economia já dava sinais de debilidade. Mas os investidores decidiram seguir em frente. Foi uma decisão inteligente. Não só atingiram a previsão como conseguiram antecipar o desenvolvimento da rede hoteleira no país.
DINHEIRO DE FORA
O empurrão para o desenvolvimento da bandeira Hard Rock no Brasil veio de um acordo, assinado em janeiro, com o fundo KCM (Kradens Capital Management), de Cingapura. Os investidores vão aportar, ao todo, R$ 330 milhões nos hotéis, em três parcelas.
O primeiro aporte já foi feito e o segundo será feito neste mês, enquanto a última cota está prevista para novembro. Os investidores têm a expectativa de receber como remuneração algo equivalente à inflação anual brasileira, o que é mais do que o retorno em Cingapura, explica Sicchierolli. Com o dinheiro do fundo asiático, a VCI antecipou de 15 para 6 anos seu plano de negócios.
A operação foi estruturada de forma que o fundo receba como garantia cerca de 30% do estoque de unidades dos hotéis, como se fosse uma compra antecipada. Com a venda e a operação, a VCI compra a participação da KCM.
Para convencer o fundo KCM, foi preciso apresentar alguns resultados do início da operação. “Imaginava R$ 50 milhões de vendas no primeiro ano e chegamos a R$ 127 milhões em cinco meses de operação. Agora, já são R$ 150 milhões em vendas, nos dois projetos que estão sendo comercializados. Isso fez nosso ‘valuation’ aumentar muito e provou que existe demanda no Brasil para esse modelo de hotelaria”, diz o sócio do VCI.
MUITA NEGOCIAÇÃO
Esse desempenho, segundo Sicchierolli, ajudou a convencer o fundo de Cingapura a investir na expansão brasileira. Apesar dos números, foi preciso negociar ao longo de um ano até bater o martelo. Boa parte do resultado veio do fato de a Hard Rock ser uma marca internacional, além do tipo de negócio oferecido aos compradores. “A partir do momento em que fizemos o primeiro lançamento, precisávamos criar diferenciais para nos livrar da crise do país”, reforça o executivo.
O modelo citado por ele é o de ‘time share’. Funciona assim: a venda de cada apartamento do hotel é fracionada em 26 partes e o proprietário de cada fração tem direito a usar a unidade por duas semanas, ao longo de 12 meses. O valor médio é de R$ 80 mil, pagos em 60 meses. Se o dono quiser, pode fazer um intercâmbio do seu apartamento com outro da rede Hard Rock, que, além de operar todos os hotéis – cerca de 4 mil –, faz a intermediação entre as reservas.
“O mercado de venda fracionada é muito consolidado na Ásia e no Caribe. No Brasil, ele começou a ser difundido depois. Por outro lado, o conceito do compartilhamento está cada vez mais popularizado em outras áreas, como vemos com os carros. Quando planejamos a operação, vimos que o Brasil teria de passar por essa transição com um modelo mais sustentável de negócio: do contrário, não daria dinheiro”, explica o sócio da Venture Capital Investimentos.
RIGIDEZ NOS PROJETOS
Além de muitas negociações com o KCM, os sócios da Venture Capital Investimentos tiveram de gastar saliva nas conversas com os executivos da Hard Rock. As especificações das unidades hoteleiras são muito rígidas, e quando se tenta trocar um fornecedor internacional é preciso estar preparado para qualquer tipo de estresse.
Foi o que ocorreu quando Sicchierolli levou na bagagem copos brasileiros, com a ideia de fazer uma compra no mercado nacional. Para abrir o restaurante do Hard Rock Café em Fortaleza, seria preciso comprar 1 mil copos, e os brasileiros custavam seis vezes menos do que os indicados pela casa-matriz.
No encontro, um dos executivos soltou o copo nacional na pia, que estourou, enquanto o americano sai ileso dos testes, inclusive com brindes mais esfuziantes. “Imagina quebrar dentro da cozinha. O americano é muito pragmático e isso funciona para tudo. Nossas portas corta-fogo custariam R$ 400 no mercado local, mas vamos pagar muito mais por um produto que garante maior segurança aos hóspedes”, exemplifica Sicchierolli. Ao todo, 60% dos itens usados nos hotéis da Hard Rock no Brasil são importados.
As exigências dos gestores da marca começam assim que começa a pesquisa para encontrar um terreno – que só pode ganhar a bandeira do Hard Rock depois de aprovado pelos americanos. A matriz precisa aprovar o projeto depois que são obtidas as licenças no Brasil. Só então é feito o registro da incorporação, já com o fracionamento das unidades e as regras de condomínio definidas.
ESTREIA EM FORTALEZA
A primeira unidade com a bandeira Hard Rock que deverá abrir as portas é a de Fortaleza, com inauguração prevista para dezembro de 2020. A da Ilha do Sol, no Paraná, está com 90% da parte civil pronta e o plano é começar a operar o hotel no início de 2021.
Em São Paulo, as obras estão sendo mais rápidas, porque é o único projeto de retrofit (com a conversão de um prédio de escritórios, na Avenida Paulista) e tudo deve estar pronto até o fim de 2020. O projeto de Caldas Novas (GO) ainda não teve as obras iniciadas, e os de Natal, Recife e Foz do Iguaçu têm projeção de conclusão entre 2025 e 2026.
Excluindo o valor gasto para a compra dos terrenos, que Sicchierolli não revela, foram investidos até agora R$ 170 milhões em Fortaleza, R$ 150 milhões na Ilha do Sol, R$ 55 milhões em São Paulo e mais R$ 650 milhões nas outras quatro unidades. Com a marca Hard Rock Hotel, a VCI projeta ter por volta de 2.400 quartos em operação até 2025.
A configuração da Hard Rock no Brasil
» Total de projetos no Brasil: 10
» Projetos já anunciados: 7
» Localização: Fortaleza, Foz do Iguaçu (PR), Recife, Natal, São Paulo, Caldas Novas (GO) e Ilha do Sol (PR)
» Previsão de oferta de quartos até 2025: 2.400
» Valor médio da fração (de um total de 26): R$ 80 mil, com parcelamento em até 60 meses
» Total de hotéis da marca no mundo: cerca de 4 mil
» Valor aportado pelo fundo KCM, de Cingapura: R$ 330 milhões
Fonte: Venture Capital Investimentos (VCI)