Uma nova metodologia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta um cenário ainda mais devastador para o desemprego no país. Divulgado ontem, o levantamento mostrou que existem hoje no Brasil 22,7 milhões de pessoas desempregadas, subocupadas ou inativas mas com potencial para trabalhar. Segundo o órgão, os números mostram que, no segundo semestre de 2016, estava faltando trabalho para todo esse contingente de brasileiros.
Segundo o IBGE, somados os contingentes de pessoas desocupadas (11,6 milhões), pessoas subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas (4,8 milhões) e na força de trabalho potencial (6,2 milhões) há um total de 22,7 milhões de pessoas com capacidade de trabalhar mais, o que representava 13,6% dos 166,3 milhões de brasileiros em idade produtiva (com 14 anos ou mais de idade). “As pessoas querem trabalhar”, definiu Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Como resultado, a taxa composta da subutilização da força de trabalho voltou ao patamar do primeiro trimestre de 2012, quando também estava em 20,9%. O resultado vinha mostrando tendência de queda até o terceiro trimestre de 2014.
No segundo trimestre de 2016, a jornada média semanal de horas trabalhadas ficou em 39,1 horas, período menor do que a jornada 40,1 horas registrada no segundo trimestre de 2012, ano de início da pesquisa. O levantamento mostra que apenas 52,5% da população ocupada trabalhavam entre 40 e 44 horas semanais.
“Faço bico de pedreiro e de bombeiro elétrico. Emprego mesmo não consigo há três meses", reclama o poceiro (furador de poços) Carlito Ferreira, de 29 anos. Ele diz que, no ano passado, ganhava com poços artesianos cerca de R$ 3 mil por 15 dias de trabalho. “Hoje não ganho o salário mínimo, e preciso sustentar minha mulher Rafaela, e meu filho Lucas, de 7 anos”, lamenta.
Conforme esclarece o analista do IBGE Minas Gustavo Fontes, a taxa composta de subutilização da força de trabalho, divulgada ontem, fornecerá mais possibilidade de interpretar o quadro de desocupação no país. Segundo ele, a taxa clássica, que mede as pessoas que efetivamente foram em busca de oportunidade mas não conseguiram, ainda é o indicador que vai balizar as políticas para redução do desemprego. Mas os novos dados vão permitir ir mais além e de forma mais completa a dinâmica do desemprego, e demonstrar, por exemplo, a situação do Carlito, que consegue bicos, mas nada que lhe garanta um emprego.
“O mercado de trabalho tem número considerável de pessoas e elas, de certa forma, não estão sendo totalmente absorvidas por ele. Esses dados mostram também que elas não estão sendo contempladas pelas oportunidades. Os indicadores permitem ir além do conceito simples de desocupado”, afirma.
Mudança
A metodologia que permite desdobrar os números de desempregados vinha sendo feita desta forma desde 2012, mas apenas os dados da chamada “taxa clássica” eram divulgados. Nessa nova metodologia, além de mensurar quem estava desempregado e buscou uma colocação dentro do período pesquisado e não encontrou, foram considerados também quem trabalha menos horas do que gostaria e tem disponibilidade e vontade de ampliar a jornada e os que estão em período produtivo – 14 anos ou mais –, mas não procuraram emprego.
É o caso, por exemplo, da psicóloga Sthephanie Aparecida, de 24 anos. Ela se formou pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-MInas) no ano passado e, desde então, não consegue emprego na área. “Tenho trabalhado uma vez por semana em uma clínica, mas não é um emprego. Estou em busca de algo com carteira assinada e rentável, mas não consigo”, lamenta, dizendo que, para o seu setor, os empregadores exigem experiência e pagam pouco.
De acordo com o analista do IBGE, o número de pessoas subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas foi observado considerando as pessoas que trabalhavam menos de 40 horas semanais e pretendiam ampliar sua carga horária, como é caso da psicóloga. Para considerar esse contingente, além de ter interesse de trabalhar mais é necessário ter disponibilidade também. “Ás vezes a pessoa trabalha seis horas mas ela está satisfeita, investe seu tempo em outras atividades. Esse perfil não é considerado”. Ainda segundo Gustavo Fontes, o trabalhador não quer oportunidade em outro empregador, mas ampliar sua jornada na atual empresa, essa situação também é incorporada para fazer o cálculo.
Para o cálculo da força de trabalho potencial foi levando em consideração as pessoas com idade a partir de 14 anos e que não estavam trabalhando e nem procurando emprego no período pesquisado, mas tinham disponibilidade. Também estão incluídos nos 6,2 milhões aqueles que procuraram a vaga, mas que não tinha disponibilidade para assumir o posto no momento em que foi selecionado. “Por diversos motivos a pessoa pode estar nessa situação. Às vezes ele vinha numa sequência de busca pelo emprego, mas naquele período ele não buscou a colocação. Ou mesmo mudou de estratégia e resolveu fazer um curso e investir em alguma carreira pública”, explicou.
Um exército de informais
Rio de Janeiro – Pelo menos 80,7% dos trabalhadores por conta própria no país estavam na informalidade no segundo trimestre de 2016, o equivalente a mais de 18 milhões de pessoas, ainda de acordo com os dados da Pnad Contínua. Os outros 19,3% informaram que tinham registro no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ, da Secretaria da Receita Federal. No entanto, é possível que haja mais pessoas trabalhando na informalidade em meio a esse contingente, explicou coordenador de Trabalho e Rendimento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Cimar Azeredo.
“Mas pode ainda acontecer que parte desses trabalhadores por conta própria que têm CNPJ estejam trabalhando também como informais, na medida que a informalidade é expressa pela característica da atividade, não pela posse do CNPJ. Os que não possuem CNPJ são informais, mas quem tem CNPJ não trabalha necessariamente na formalidade”, disse Azeredo.
No segundo trimestre deste ano, 7,5 milhões de trabalhadores por conta própria ou empregadores informaram possuir registro no CNPJ. Do contingente de 22,9 milhões de trabalhadores por conta própria, apenas aproximadamente 4,4 milhões (19,3%) trabalhavam sob o CNPJ. Ou seja, ao menos 18,510 milhões estavam na informalidade.
Entre os 3,7 milhões de empregadores existentes no país, 84,2% tinham CNPJ, 3,123 milhões. O resultado significa que 584 mil estavam na informalidade. “Entre os empregadores, pelo menos 20% deles são informais”, acrescentou Azeredo.
O IBGE disponibilizou desde ontem uma série de novos indicadores obtidos com a Pnad Contínua, que captam informações relacionadas à força de trabalho, com resultados, para Brasil, desde o início da série histórica, no primeiro trimestre de 2012. A partir do quarto trimestre de 2015, a pesquisa passou a investigar se os trabalhadores por conta própria e os empregadores tinham registro no CNPJ. Os indicadores serão divulgados trimestralmente, com recortes para Brasil, grandes regiões e Unidades da Federação. A mudança segue recomendações internacionais da Organização Internacional do Trabalho (OIT).