Barítono Diego d'Almeida, vestido como romano, canta no palco

O barítono Diego d'Almeida, que interpretou o protagonista de 'Dido e Eneas', agora empresta sua voz a Adônis

Andreia Bueno/divulgação


Mal sabia Vênus que a flecha de Cupido que a atingiu acidentalmente seria a razão de sua ruína. Sob o efeito da seta mágica disparada pelo ser alado, ela se apaixona por Adônis, jovem mortal aficionado pela caça, abre mão de sua condição de deusa, engata um romance com o rapaz e o perde.

Ao longo dos anos, o mito romano inspirou artistas dos mais variados segmentos e foi muito explorado nos séculos 16 e 17. O pintor Botticelli, que morreu em 1510, se sagrou com “Nascimento de Vênus”. Shakespeare (1564-1616) escreveu o longo poema “Vênus e Adônis”.
 
John Blow (1649-1708) narrou a mesma história em ópera com texto do Bardo de Avon, que será apresentada pela Virtuosi Produções neste domingo (16/7), no Cine Theatro Brasil Vallourec. O elenco reúne 30 pessoas, entre orquestra, solistas, coro, corpo de balé e crianças da figuração.

Barroco francês

Encenada pela primeira vez em 1683, “Vênus e Adônis” se tornou um clássico britânico. “Compositores ingleses daquela época sofreram certa influência do barroco francês. A gente vê isso, por exemplo, no uso do inégalité, as notinhas rápidas, e também nos movimentos de dança para entremear a ópera”, explica o barítono Diego D’Almeida. Intérprete de Adônis, ele assina a direção artística do espetáculo.

A influência francesa vem, por exemplo,  de Jean-Baptiste Lully (1632-1687), compositor da corte de Luís XIV (1638-1715). Como o rei era bailarino, Lully inseria em suas óperas e peças movimentos de dança para agradá-lo.

A dança está muito presente na obra de Blow. A entrada do Cupido, por exemplo, se dá com movimentos coreográficos, assim como a entrada das Graças e os interlúdios.

Na montagem da Academia Virtuosi, a história é apresentada sob a perspectiva dos deuses, que assistem a tudo o que acontece no plano terreno.

“A concepção se deu como se fosse no panteão dos deuses greco-romanos”, adianta a soprano Daiana Melo, que interpreta Vênus.

“Vai ter a disposição do coro como se fosse um altar dos deuses, no qual Vênus também estará no início. Quando se torna mortal, ela deixa o altar, mas os deuses permanecem lá, no segundo plano e de forma mais estática, compondo como se fosse um quadro”, emenda.
 

'É um drama expresso não só na cena, mas também na música'

Daiana Melo, soprano

 

A movimentação no palco ficará por conta dos solistas – além de Diego e Daiana, há Cupido, interpretado pelo contralto Sérgio Anders. “Nesse momento, os deuses ficam como espectadores da história toda”, diz a cantora.

Não é a primeira vez que Daiana interpreta a deusa romana. A primeira ocorreu antes da pandemia, também em montagem da Virtuosi. O retorno à personagem fez com que ela imprimisse novas características à sua Vênus.

“Trago agora um pouco mais do conhecimento do estilo barroco, uma questão de maturidade mesmo, tanto interpretativa quanto vocal. Esse conjunto faz com que tenhamos uma Vênus mais madura, mais consciente do estilo barroco”, ressalta a soprano.

É a primeira vez que ela contracena com Diego D'Almeida. Na montagem de “Dido e Eneas”, de Henry Purcell (1659-1695), ele era solista e Daiana não chegou a participar. Já em “Bastien und Bastienne”, de Mozart (1756-1791), a situação se inverteu, com Daiana assumindo o papel de solista.
 

Sátira ao rei

“Vênus e Adônis” não se limita a narrar o mito da deusa. Em camadas mais profundas, a ópera é uma sátira do reinado de Carlos II (1630-1685) na Inglaterra. Comentava-se que o monarca tinha apetite sexual voraz e pouca preocupação com a política, encaixando-se no papel da Vênus apaixonada que leva o companheiro à morte. A deusa de Blow é sensual e imperiosa.

“A música barroca é muito baseada na relação texto e melodia”, explica Daiana. “Toda a escrita desse período é pensada com o que a gente conhece como teoria dos afetos. Blow tem a preocupação de passar a intenção daquela cena. É como se por meio da música, desse conjunto sonoro, a gente expressasse sentimentos. É um drama expresso não só na cena, mas também na música”, conclui.

“VÊNUS E ADÔNIS”

• Ópera de John Blow
• Com Diego D’Almeida, Daiana Melo, Sérgio Anders e Orquestra da Academia de Ópera Virtuosi
• Neste domingo (16/7), às 19h, no Cine Theatro Brasil Vallourec (Praça Sete, Centro)
• Ingressos: R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia-entrada)
• Informações: www.virtuosi.mus.br