sucesso em Grey's Anatomy

O roteirista brasileiro Beto Skubs

Arquivo pessoal


A médica Meredith Grey (Ellen Pompeo) e seus colegas do Grey Sloan Memorial Hospital tiveram muitas histórias para contar ao longo das últimas 19 temporadas. Para se manter com um público fiel desde o início, em 2005, entre seus altos e baixos com tragédias, paixões e temas atuais, ela conta com a mente brilhante de uma equipe enorme de roteiristas que criam toda a mágica por trás do elenco.

Entre eles, o brasileiro Beto Skubs, que conta ao Estado de Minas  o “segredo” do seu sucesso e o da série: “A minha dica é: faça como fiz, estude muito, leia muito, trabalhe muito, mas não tente pular etapas, porque não adianta. Ninguém nasce sabendo escrever,  tem que aprender igual a qualquer outra profissão”.
 
O paulista chegou à equipe da série em junho de 2021 e, além de participar da criação de cada episódio, foi titular responsável pela história de uma família brasileira na série que foi ao ar no capítulo 14 da 18ª temporada, por exemplo. Sobre a sua rotina, ele explica: “É legal porque você tem a responsabilidade de cuidar dele do começo até o fim. Em um dos episódios que fiz no ano passado, eu apareci na câmera em uma cena, fiz um episódio que teve uma família brasileira e o pessoal fala português. Então, foi bom poder usar a minha presença para fazer uma coisa para o Brasil”, comemora.
Agora, a série foi renovada para a 20ª temporada sem a presença de Maggie Pierce (Kelly McCreary) – que Skubs também teve responsabilidade no roteiro de despedida – e contará com participações esporádicas da protagonista Meredith Grey (Ellen Pompeo). Mesmo com todas estas mudanças, ele reforça que os produtores ainda não tiveram intenção de encerrar a história e a trama se mantém como uma das maiores produções da emissora de TV norte-americana ABC.

“O dia que a série acabar, quando for dada para a gente a ordem, aí que a gente vai pensar nisso (em um final). Mas, por enquanto, a gente não tem essa intenção. A série faz muito sucesso, ‘Grey’s Anatomy’ é a série nº 1 da ABC até hoje. Ela só vai acabar quando as pessoas não quiserem mais assistir, na minha opinião”, ressalta.
 
Ele revela os motivos deste sucesso: “Os personagens são bons, criados com carisma e qualidade. A série vai se renovando, acompanhando os tempos, revitalizando o elenco e personagens de acordo com o que está acontecendo em volta. E medicina é uma coisa de vida ou morte, nunca vai se desatualizar, é mais um fator que agrega a essa qualidade.”
 
Apesar disso, a 20ª temporada pode ter uma redução no número de episódios devido à greve dos roteiristas em Hollywood, que começou em 2 de maio. 
 
O Sindicado de Roteiristas da América (WGA) informou que a paralisação se deve após tentativas malsucedidas de acordo entre os estúdios e os trabalhadores para um aumento nos salários.

“Atrapalhou, agora vai atrasar tudo. Não sei como vai resolver isso, se vai ter menos episódios, o que vai acontecer. Com a greve ninguém está podendo trabalhar, era para a gente ter voltado ao trabalho e não aconteceu. Não acho que vai ter uma resolução em breve também. Mas isso está na mão dos estúdios e dos produtores, o dia que eles quiserem que a greve acabe está na mão deles, é só pagar é para os roteiristas o que é justo”, reforça Beto. A seguir, a entrevista concedida por Beto Skubs ao Estado de Minas.
 

"Grey's Anatomy é a série nº 1 da ABC até hoje. Ela só vai acabar quando as pessoas não quiserem mais assistir, na minha opinião"

Beto Skubs, roteirista

 
 
Qual foi sua trajetória até entrar para a equipe de roteiristas de Grey’s Anatomy?

Eu cresci em Piracicaba, interior de São Paulo. Comecei a estudar audiovisual e me formei em rádio e televisão. Fiquei muitos anos tentando entrar na indústria no Brasil, sem sucesso, numa época que não tinha o que fazer.

Em 2011, eu publiquei uma história em quadrinho com o pessoal lá de Piracicaba e no mesmo ano eu ganhei uma bolsa para vir estudar roteiro de produção aqui nos Estados Unidos. Vim para a Ucla (Universidade da Califórnia) em 2012. Aí que minha carreira deu uma boa guinada mesmo. Vendi um piloto de ficção científica para a Sony enquanto estava na faculdade.

Me formei e fiquei fazendo trabalhos daqui para o Brasil. Fiz um monte de freelas de seriados, Ben 10, fiz um monte de trabalhos pequenos. Até que em 2018, a Globo me chamou para criar uma série para eles, que acabou não sendo produzida, e eu fiquei dois anos lá. Quando acabou, voltei para os Estados Unidos e recebi essa oferta de Grey’s Anatomy, em junho de 2021.

Como é feita a criação dos roteiros das séries, com foco em Grey’s?

Na TV, a sala de roteiro é quase toda feita colaborativamente, é como se fosse um esporte coletivo. A gente tem o showrunner, a pessoa que é o líder da série (isso em todas as séries, não é só em Grey’s Anatomy).

A gente começa o ano mapeando a temporada: os personagens começam aqui e têm que terminar ali, mais ou menos o que a gente quer que aconteça de formas gerais. E aí a gente vai quebrando isso em pedaços menores até chegar nos episódios.

Cada episódio tem um roteirista titular, que é a pessoa que cuida dele do começo até o fim, mas todo mundo colabora em todos os episódios. Então 80% do tempo é na sala de roteiro. Aí, quando a gente escreve um episódio, nós também acompanhamos ele na pré-produção, produção no set de filmagem, pós-produção. Então, uma parte é no set filmando e o resto é escrevendo.

Eu fui titular em três episódios desde que entrei. É legal porque você tem a responsabilidade de cuidar dele do começo até o fim. Em um dos episódios que fiz no ano passado, apareci na câmera em uma cena. Fiz um episódio que teve uma família brasileira e o pessoal fala português.

Então, foi bom poder usar a minha presença para fazer uma coisa para o Brasil. O último que escrevi foi a primeira parte de um episódio duplo, foi o último episódio de uma das personagens principais. Tenho muito orgulho de poder participar da despedida da Maggie Pierce (Kelly McCreary).

Muitas séries não duram muito tempo hoje em dia, enquanto Grey’s Anatomy foi renovada para a 20ª temporada. Qual o segredo da série?

Acho que são várias coisas. Uma delas é que os personagens são bons, criados com carisma e qualidade. Mas a série vai se renovando, acompanhando os tempos, revitalizando o elenco e personagens de acordo com que está acontecendo em volta, isso é muito importante.

Por ser uma série médica, né? Medicina é uma coisa de vida ou morte, nunca vai se desatualizar. É mais um fator que agrega a essa qualidade. Eu acho que é uma mistura das personagens serem interessantes, de ter uma atualização constante nos temas, no tom de como a gente aborda as coisas e de ser uma série que lida com assuntos de vida ou morte.

Muitos dos personagens saíram ao longo das temporadas, como você mesmo disse que lidou com uma delas recentemente. Como que é encarar a perda de um personagem e fazer a série continuar?

Faz parte do trabalho a gente começar a terminar histórias, às vezes, essas histórias acabam com um personagem saindo ou morrendo. É normal, como qualquer outra, exceto pelo reflexo emocional nas pessoas, principalmente quando um personagem sai, tem gente que adora e outras odeiam. Então, é legal acompanhar esse tipo de retorno, esse feedback que a gente tem dos fãs.

E como foi a despedida da Ellen Pompeo?

A Ellen é muito legal, a gente se dá muito bem, adoro ela. Imagino que para ela tenha sido muito difícil. Por um lado porque ela está ali há tanto tempo e por outro deve ter sido muito gratificante também.

Ela queria fazer outras coisas. Mas lembrando que ela não saiu de vez, ela voltou depois no episódio final da temporada, talvez ela volte mais. Não sei qual é a programação agora, mas ela deve participar mais vezes, não foi um adeus definitivo para ela, é um até logo.

Sem a personagem principal presente constantemente na série, por que não encerrar? Existe um planejamento de quando deve encerrar ou já tem um final idealizado?

Por enquanto, não. O dia que a série for acabar, quando for dada para a gente a ordem, aí que a gente vai pensar nisso. Mas, por enquanto, a gente não tem essa intenção. A série faz muito sucesso. ‘Grey’s Anatomy’ é a série nº da ABC até hoje. Ela só vai acabar quando as pessoas não quiserem mais assistir, na minha opinião.

E agora com a greve roteiristas, como vai ficar a continuação da série?

Já atrapalhou, agora vai atrasar tudo. Não sei como vai resolver isso, se vai ter menos episódios, o que vai acontecer. Com a greve ninguém está podendo trabalhar, era para a gente ter voltado ao trabalho e não vai rolar. Não acho que vai ter uma resolução em breve também.

Mas isso está na mão dos estúdios e dos produtores, o dia que eles quiserem que a greve acabe está na mão deles, é só pagar é para os roteiristas o que é justo.


Quais são as principais reivindicações? Como estão as negociações?

As bases do contrato feito pelo nosso sindicato foram de uma época onde não existia streaming. Agora mudou tudo o jeito que se faz televisão, as séries. Isso pessoalmente não me afeta porque eu trabalho numa série antiga que faz muitos episódios e tem muita audiência, para mim tá tudo uma maravilha.

A questão é que não é para todo mundo que está assim. A greve não é para mim, é para quem está trabalhando em condições que não são iguais às minhas. Antigamente, era normal série de TV ter entre 22 e 25 episódios, hoje tem séries com quatro, seis ou oito.

O roteirista ganha por episódio, então.  imagina o cara que está ganhando 20, 25 vezes o salário dele agora com quatro, ele não consegue pagar as contas assim. O segundo ponto são os “residuals”, os royalties de reúso, os streamings não liberam quantas pessoas estão assistindo, quantos lugares.

Então, não tem como fazer a conta de como é que se paga esses royalties que fazem parte da remuneração do roteirista. Está na mão dos estúdios. Os streamings faturaram no passado US$ 29 bilhões, seus oito CEOs mais importantes ganharam só de bônus no ano passado mais de US$ 800 milhões e o que está pedindo é US$ 420 milhões para 12 mil roteiristas. Então, está na mão deles, a hora que eles quiserem acabar com isso é só negociar de boa fé.

Em 2017, até teve também uma greve dos roteiristas. O que você acha que diferencia diante dessa agora? 

A condição da indústria. Naquela época, estávamos negociando direitos de DVD, direitos de quando estavam começando as coisas digitais, não queriam pagar nada que tivesse a ver com distribuição digital.
Hoje, a distribuição digital é a maioria do mercado. Então, outros desafios têm a ver com atualização da indústria e o pagamento, assim como todas as outras coisas, tem que ser atualizado. Não tem muito segredo.

Você tem uma dica para quem está começando agora e quer investir nessa carreira?

Ser roteirista de TV é uma profissão como carreira médica, advogado, no sentido de que você precisa estudar muito, aprender a profissão. Precisa fazer seus contatos e estudar. Começar por baixo é normal igual a qualquer outra profissão. Então, a minha dica é: faça como fiz, estude muito, leia muito, trabalhe muito, mas não tente pular etapas, porque não adianta. Ninguém nasce sabendo escrever, tem que aprender igual a qualquer outra profissão.