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A vida sem curtidas

Os argumentos de quem nunca teve ou se afastou das redes sociais são inúmeros. Desde perda de tempo e aversão à exposição até a insubstituível necessidade de contato presencial com as pessoas


postado em 17/03/2019 05:10

(foto: Geralt/Pixabay)
(foto: Geralt/Pixabay)


Quando alguém que conhece e participou do processo de criação de uma empresa a contesta, é recomendável, ao menos, prestar atenção. O investidor Roger McNamee, ex-mentor de Mark Zuckerberg no início do Facebook, hoje é um dos maiores críticos. Ele, que esteve na última semana no South by Southwest (SXSW), festival considerado um dos maiores eventos de inovação do mundo, em Austin, Texas (EUA), em entrevista ao jornalista Nicholas Thompson, editor-chefe da Wired, declarou que “eles (Facebook) achavam que podiam pegar essas informações (dados dos usuários e fotos aéreas de suas residências) e que não haveria problema. Mas não pensaram no tipo de desafio que teriam. No Facebook, acham que é aceitável pedir desculpas por algo que já ocorreu (escândalo de vazamento de dados). Mas agora isso não funciona mais. A questão é captar todos os movimentos do usuário e seus dados pessoais, prever comportamentos e depois usar a inteligência artificial para levar as pessoas a determinados resultados. Há um problema endêmico”, destacou McNamme, autor do livro Zucked – Waking up to the Facebook catastrophe” (Acordando para a catástrofe do Facebook).


“Sem foto, por favor, sigo coerente com a minha não exposição.” A declaração é do empresário Carlos Alberto Gouveia, de 59 anos, formado em comunicação social, habilitado em jornalismo, relações-públicas e publicidade, com pós-graduação em marketing. Ele não tem redes sociais e usa o WhatsApp apenas para o negócio, assim como teve de criar uma página no Facebook estritamente profissional. “Não freio o fluxo da vida, a evolução, mas posso escolher. E as redes socais não me fazem falta, e sigo antenado com o que ocorre em meu tempo. Agora, essa exposição para o mundo, vejo como muita vaidade. Acho até ridículo e sinto vergonha por quem se exibe. Mas é uma opção. Ainda que eu não a ache inteligente no mundo maléfico de hoje.”


Para Carlos Alberto, menos é mais: “Faço parte de quem escolhe pela presença e convivência. Nada substitui a fala. Aliás, tenho pavor de falar com máquina! É preciso olhar nos olhos, perceber as flexões e reflexões das pessoas. É o que tem mais sentido”. Ele enfatiza que não é contra quem usa com consciência. “No entanto, a maioria é como uma boiada, e isso é um perigo. Tudo que é postado tem domínio de alguém, que a maioria não tem ideia de quem seja. Acho uma opção delicada. Muitos não têm usado a sensibilidade e a inteligência nessa relação. No fim, cabe o bom senso de cada um.”


Carlos Alberto avisa que precisa de amigos presentes e não de amigos de “curtidas”. Ele conta que tem a felicidade de ter grau de amizades com as mais diferentes idades e pensamentos semelhantes. “Tenho amigos de 45 anos de convivência e estamos juntos até hoje. Não sou uma ilha. Agora, por pureza de vida escolhi dizer não. Escolha é riqueza.” O empresário e comunicador diz que não é radical, mas jamais fará essa troca. “A relação com uma pessoa nunca se repete, ela é única e não abro mão disso. Minha rede social é o boteco. E, como autêntico mineiro, nada melhor do que a prosa. E nem por isso sou atrasado, ultrapassado. Simplesmente, seleciono, procuro saber das notícias relevantes e faço escolhas. A vida é de mão dupla, não única. No entanto, acredito que parte das pessoas foram condicionadas. A sociedade não é malévola, é apenas conduzida.”

IDADE Muitos podem até pensar que a idade determina ser ou não capturado pelas redes sociais. No entanto, o estudante de economia Jaime César, de 23, contradiz essa imagem e, há dois anos, se desconectou totalmente. Ele chegou a ter Facebook por um tempo, mas se excluiu porque percebeu que estava tomando muito do seu tempo. “E o que não tenho sobrando ou não quero desperdiçar é o meu tempo.” Ele também conta que sempre foi mais reservado e, por isso, esse universo não faz sentido para sua vida.


Jaime reconhece que, ao sair do Facebook, foi questionado. A pergunta sempre vinha acompanhada de uma exclamação: “por quê!?”. A resposta estava na ponta da língua: “Porque não gosto”. Depois da sua iniciativa, ele revela que mais dois amigos também deletaram seus perfis. “Hoje em dia, o que me interessa é ter foco. Minha namorada tem redes sociais e não me incomoda. Eu não preciso, não me faz falta, são informações banais e de massa que estão por lá, nada de novidades, acaba que um vai replicando o outro.”
O futuro economista conta que também não é ligado em TV. “Não assisto. Sou da leitura e 100% Netflix. Aliás, 90% do publicado nas redes sociais é dado desnecessário, tudo superficial, e a maioria segue como uma manada. Há discussões sem conhecimento e profundidade que não me agregam nada. E estar longe não significa que sou alienado, pelo contrário. A questão é saber o que se quer. Busco informações de fontes seguras e, muitas vezes, como tenho o hábito de ler em inglês, até tenho acesso em primeiro lugar a determinadas notícias. Mas, no fim, tudo é escolha. E respeito todas.”

Três perguntas para...

JÚLIA  rAMALHO PINTO
ministro das relações exteriores de honduras

O que você pensa sobre o chamado “suicídio” virtual?
Ele se concretiza como tendência por alguns fatores. O primeiro, porque grande parte de usuários que viveram a adolescência nas redes sociais (elas se firmaram por volta de 2010), quando tinham de 13 a 17 anos, hoje já está no mercado de trabalho. Nesse sentido, a adolescência como período de impulsividade e transgressão foi vivida nas redes e levou ao que chamamos de tatuagem digital. As bobagens que vivemos e esquecemos nas redes se tornam imortais e públicas, como brigas, zoações, posicionamentos polêmicos etc. Por isso, para essas pessoas é importante, sim, tentar limpar seu histórico, uma vez que cada vez mais empresas vão recrutar on-line. Ter um perfil preconceituoso, por exemplo, pode sim, fazê-lo perder uma vaga que tem por valor a diversidade. Quanto ao risco de se sair das redes sociais e sentir solidão, precisamos lembrar que o número de pessoas que se sentem sós na nossa Era Digital aumentou. Sherry Turckle, pesquisadora do MIT, fala da ilusão de engendrarmos amizades nas redes sociais. As redes não geram contato no sentido de conexão afetiva. O sentimento de vazio impera. Sair das redes e valorizar um bom encontro cara a cara ou com uma conversa pelo telefone pode gerar mais conexão e apoio emocional. Para isso, não é preciso apagar seu perfil. Basta regular o tempo de uso e expectativas quanto ao uso, uma solução menos radical. Uma experiência que tive no fim do ano passado ao trancar meu perfil no Facebook foi perder as datas dos aniversários de amigos. Essa rede funciona muito bem para nos lembrar das pessoas, mas não para aprofundar relacionamentos. Um outro ponto importante a ser pensado é quanto à informação. Durante muito tempo, as redes foram ótimas fontes de informação. Hoje, isso não é bem assim; as fake news, as mentiras, boatos e rumores tomaram conta do fluxo de informação nas redes sociais. Estamos vendo várias pessoas retornarem o tempo dedicado a ler os veículos de credibilidade como jornais e revistas. Sair das redes não significa ficar de fora das informações, pode significar se informar melhor e dar menos ouvidos aos boatos. E quando dizemos que estamos numa sociedade digital significa que estamos fazendo muitas coisas on-line e virtualmente, não só nas redes sociais jogando conversa fora.

Por que o desejo de sair das redes está tão aflorado agora? Falta de privacidade?
Acho que existem vários motivos. Um é aquele comentado anteriormente quanto aos adolescentes entrando no mercado de trabalho. Outro é a exaustão. As redes sociais tiveram o momento da novidade, aproximadamente de 2009 até 2012. Ali, as comunicações eram espontâneas e havia um senso real de compartilhamento. Depois, as redes foram sendo apropriadas por forças de marketing de conteúdo e político, além de se formar um contingente de profissionais para manipular as informações e criar narrativas. Hoje, sabemos que algoritmos moldam nossa visão de mundo. Então, as pessoas foram perdendo a espontaneidade e a credibilidade nas redes sociais. Mas não acredito que seja o caso de invasão de privacidade. A grande maioria das pessoas não tem a menor ideia do que as empresas de tecnologia podem fazer com nossos dados; não mesmo. Agora, as redes sociais proporcionam uma evasão de privacidade, as pessoas espontaneamente se mostram. É um jogo. E cada vez mais se mostram como querem ser vistas, usam sua máscara social. E o jogo social, na realidade, se torna chato para muita gente, é cansativo. Por isso buscamos nossos momentos de reclusão. Acho que a coisa passa mais por aí: sabemos que tudo está sendo manipulado e estamos cansados de ser objeto de manipulação. Agora que o encantamento de estar on-line está passando, é hora de pensarmos onde queremos estar on-line e por quê.

3 – O que seria essa nova conexão que as pessoas estão buscando?
Acho que podemos pensar como um retorno ao que é importante. E talvez tenha a ver com um movimento maior, com exaustão de um sistema que nos empurra a sempre consumir mais, a ter mais, a fazer mais. Para quê? Veja o movimento das pessoas com o consumo consciente, a moda minimalista para não se perder tempo escolhendo e consumindo roupas, a busca por alimentação saudável e orgânica. As redes ajudaram a ampliar e a acelerar nossas trocas de informação. Mas saber tudo, acompanhar tudo, gera uma ansiedade sem tamanho e uma enorme perda de qualidade de vida. Estar conectado em tudo o tempo todo não tornou a vida das pessoas melhor, gerou uma enorme distração e perda de foco. Numa era em que tudo é fake, feito para “pegar bem”, há uma busca por coisas mais humanas, autênticas e confiáveis. Queremos viver experiências, explorar nossos sentidos e emoções, e isso não ocorre em relações superficiais, moldadas para atender às expectativas dos outros. As pessoas estão procurando conexões que possam ser vulneráveis, que possam confiar uma nas outras, em vez de uma infinidade de conexões de uma vida fake das redes sociais. Diria que quem não tem celular e rede social é um antissocial no sentido do termo “sociedade digital”. Claro que isso é possível, mas é preciso autenticidade para sustentar um lugar assim na sociedade. E, com certeza, devem saber fazer com seu carisma e empatia. Saber estabelecer relações que extrapolam o padrão superficial de contato. Profissionalmente, é possível se há um trabalho estabelecido, um público que já lhe reconhece. Contudo, é preciso estar atento, senão vai perder boas oportunidades profissionais. Insisto em que o importante é sempre pensar o como e por que estar on-line.


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