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Estado de Minas VITALidade

Transumanismo: qual o nosso limite?

Será que haverá o dia em que teremos dificuldade para diferenciar o que é humano daquilo que foi construído pela engenharia genética?


26/06/2023 06:00 - atualizado 24/06/2023 09:51
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Imagem meramente ilustrativa de mulher com partes 'robô' no corpo
Imagem meramente ilustrativa de mulher com partes 'robô' no corpo (foto: Pixabay)


Como temos dito por aqui, a população mundial está em franco processo de envelhecimento. Em países como o Japão, Suíça, Espanha, Austrália e Itália, a expectativa de vida já passa dos 80 anos. No Brasil, até o ano de 2060 teremos mais de 19 milhões de pessoas com mais de 80 anos. Tal situação ocorre muito em razão da melhora das condições de saúde da população em geral, mas, em um futuro muito próximo, isto também será em razão de aparatos tecnológicos que serão colocados à disposição daqueles que poderão pagar por eles.

Dentre as possiblidades de melhoramento da vida humana por meio do uso de tecnologias, há uma controversa linha de pesquisa do ramo da engenharia genética denominada transumanismo. Trata-se de um movimento que se autodenomina como sendo filosófico e cultural que tem por finalidade buscar aprimorar a condição humana por meio do uso da tecnologia, especialmente a biotecnologia, a inteligência artificial, a nanotecnologia e a neurociência. 

Seus adeptos trabalham com temas instigantes e que já são correntes em filmes e, alguns, até mesmo na vida prática dos mais afortunados, tais como implantes cibernéticos para restaurar a audição; implantes de retina para recuperar a visão; criação de interfaces entre o cérebro e o computador, permitindo o controle de dispositivos externos, tudo por meio do pensamento; realidade virtual e realidade aumentada, de onde vem a ideia de metaverso; inteligência artificial, dentre outros.  

No que diz respeito especificamente ao processo de envelhecimento, podemos citar como exemplo de técnicas transumanísticas, as terapias genéticas para retardar ou reverter o processo de envelhecimento, que envolvem a manipulação de genes e das vias genéticas relacionadas ao processo de envelhecimento. Há também a Medicina Regenerativa, que busca desenvolver técnicas para regeneração de tecidos e até mesmo de sistemas inteiros do corpo humano, o que ocorre por meio da manipulação de células-tronco com o objetivo de substituir as células danificadas ou envelhecidas o que, potencialmente, poderia reverter os efeitos do envelhecimento nos órgãos e tecidos.

Embora os avanços da Medicina Regenerativa e das Terapias Genéticas, por exemplo, sejam motivo de celebração, devemos estar atentos aos caminhos que estamos trilhando. Se por um lado é maravilhoso pensar em manipulação de células-tronco para fazer com que um cadeirante deixe tal condição, nos causa espanto pensar em manipulação genética para melhoramento de performance, por exemplo, já que tal possibilidade só estaria disponível para aqueles que pudessem pagar por elas, o que aumentaria ainda mais o fosso entre ricos e pobres, acarretando ainda mais desigualdade entre as pessoas.

As consequências de algumas manipulações propostas pelo transumanismo podem levar a um florescimento humano como nunca visto antes na história da humanidade, e tal fato é inquestionável; mas também podem acarretar efeitos colaterais imprevisíveis ou consequências não intencionais, mas potencialmente capazes de afetar a nossa própria compreensão do que pode ser entendido como ser humano, bem como gerar disparidades econômicas ainda mais excludentes e discriminatórias, ou criar uma dependência tecnológica excessiva, que nos coloque em risco de sobrevivência em caso de falha.

Será que haverá o dia em que teremos dificuldade para diferenciar o que é humano daquilo que foi construído pela engenharia genética? Para evitarmos esse problema que, diga-se de passagem, é gravíssimo, devemos refletir que os riscos ligados ao transumanismo não devem ser negligenciados, sendo necessário um debate ético aprofundado e uma reflexão sobre os valores e princípios que orientam a buscar pelo aprimoramento humano e de que espécie de aprimoramento estamos falando.

Francis Fukuyama, em seu livro Nosso Futuro Pós-Humano: consequências da Revolução da Biotecnologia, nos ensina que o transumanismo levanta questões profundas sobre o verdadeiro significado da vida humana e o nosso futuro como espécie e, por essa razão, precisamos estar muito atentos às implicações sociais dessas tecnologias, de modo que elas sejam usadas para o bem de toda a humanidade – e não apenas de alguns.

Somos coro aos que pensam que devemos abraçar os avanços científicos e tecnológicos para o aprimoramento da vida humana, mas com cautela e responsabilidade, considerando os impactos sociais, a privacidade, a segurança e os valores sociais fundantes. Ao explorar o potencial do transumanismo devemos nos perguntar: até onde estamos dispostos – como sociedade – a ir em busca de melhorias sem comprometer nossa essência humana? Não se trata de apenas não envelhecer ou não morrer, admitir o transumanismo sem análise crítica e ética, é mudar completamente nossa compreensão sobre o que deve ser entendido como sendo um ser humano e isto é complexo.

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