
Ricupero concedia uma entrevista ao jornalista da Globo, Carlos Monforte. Durante o intervalo, num bate-papo informal, o ministro lhe disse: “Eu não tenho escrúpulos. Eu acho que é isso mesmo: o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde". Porém, ambos não sabiam que o sinal de transmissão estava aberto, e todos que possuíam uma antena parabólica em casa assistiram, estupefatos, à confissão. Naquela época, fatos assim eram suficientes para derrubar um ministro brilhante como Ricupero. Hoje, não sabemos mais o que é necessário para que altos membros do governo peçam demissão, já que nem demitidos eles são. Esse foi o “escândalo da parabólica”.
Pois bem. O governador de São Paulo, João Doria, ontem (12) teve seu dia de Ricupero. O tucano, como sabemos - e estamos cansados de saber! - não passa um minuto fora das redes sociais e da mídia convencional. Se toma café, ele filma ou fotografa, e publica. Se tapa um buraco, idem. Se inaugura um hospital, a mesma coisa, só que com superprodução ao redor. No caso da vacina sino-brasileira, a CoronoVac, da empresa chinesa Sinovac, produzida no Brasil pelo Instituto Butantan, o desejo de estrelato de Doria subiu às alturas, principalmente após o psicopata negacionista - e presidente incompetente - Jair Bolsonaro resolver maldizer a nossa única (até o momento) chance contra o novo coronavírus.
Doria não perdeu uma só oportunidade de se mostrar como o líder dessa belíssima conquista. Anunciou o acordo, anunciou as pesquisas, anunciou a importação, posou para fotos ao lado do primeiro lote a desembarcar no Brasil, posou para fotos ao lado do segundo lote a desembarcar no Brasil, concedeu entrevistas de manhã, concedeu entrevistas à tarde, concedeu entrevistas à noite, falou (dormindo) que é um gênio, falou (para o espelho) que é fenomenal e correu para anunciar, ele próprio, o sucesso das pesquisas. Beleza. Só que ontem fez como o Arlindo Orlando, aquele caminhoneiro da pequena e pacata Miracema do Norte: fugiu, desapareceu, escafedeu-se!
Ao que parece, a eficácia do imunizante não é lá essas coisas, ainda que seja suficientemente adequado para ser aprovado pela Anvisa. Contudo, o mais importante é que, se a vacina não previne muito mais que a metade dos casos de Covid-19, é extremamente potente contra o agravamento da doença. Há motivos de sobra, portanto, para comemorar. Mas como a notícia não era exatamente aquela que todos esperavam, e Doria sabe que as hordas obscurantistas do bolsonarismo aloprado irão explorar esse fato - ainda que o próprio mitômano do Planalto tenha adquirido 100 milhões de doses da CoronaVac - preferiu se omitir e fazer cara de paisagem. Preferiu dar uma de Rubens Ricupero. Será que isso faz parte do DNA tucano?